Amizade, lealdade, e o ter de dizer adeus...
por Alexandre César
(Originalmente postado em 20/ 06/ 2019)
Pixar surpreende com sequência que abre novos rumos
"Toy Story 3 (2010 de Lee Unkrich) terminou
a história de Woody e Buzz com Andy tão perfeitamente que por muito
tempo, nunca falamos em fazer outro filme de Toy Story. Mas quando Andrew (Stanton), Pete (Docter), Lee (Unkrich) e
eu surgiram com essa nova ideia, eu não conseguia parar de pensar
nisso. Era tão motivante para mim, eu sabia que precisávamos fazer esse
filme - e eu queria dirigi-lo eu mesmo." - John Lasseter em 2014.
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Woddy e Garfinho: Os brinquedos da Bonnie...
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Algumas coisas mudaram desde essa declaração, e como em todo projeto
vivo, dinâmico e tocado por pessoas talentosas, quando uma vez iniciado a
sua evolução natural irá ditando as mudanças, seja pela entrada e saída
das pessoas que irão levá-lo a cabo, seja pela própria mensagem final
do projeto. Esta alquimia chamada “Arte” ao final se revela tão rara quanto um raio cair mais de uma vez no mesmo lugar.
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Buzz Lghtyear, apesar de ter menos tempo em cena, ouve a sua "voz interior"
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Dirigido por Josh Cooley (George and A.J. de 2009, O Primeiro Encontro da Riley de 2015), Toy Story 4 (2019) mostra que em se tratando da Pixar Animation Studios um
raio pode cair um número exponencial de vezes no mesmo lugar e, sempre
nos surpreender em cada uma delas. Por sua capacidade de ousar e correr
riscos podemos dizer sem medo que o mais fraco filme do estúdio ainda
sim coloca no bolso um grande número de blockbusters feitos na base do seguro (mas previsível) “mais-do-mesmo”. A sorte favorece o audaz...
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Betty e Woody: Amor interrompido.
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Com o roteiro de Andrew Stanton ( John Carter: Entre Dois Mundos, Wall-E Procurando Nemo ) e Stephany Folson (Star Wars: Resistance),
a partir da história de Josh Cooley, Andrew Stanton, Stephany
Folson, John Lasseter, Valerie LaPointe, Rashida Jones, Will McCormack e
Martin Hynes retomamos o universo narrativo de Woody, Buzz Lightyear,
Jessie, Rex,e Cia. Numa nova etapa de suas vidas, agora como os
brinquedos da Bonnie, que está crscendo e antrando no jardim de infância
e entrando na fase de socialização com outras crianças. O que temíamos
acabar em apenas um a continuação caça-níqueis sem razão de ser
revala-se um bem construído exercício sobre apego, lealdade ao grupo, e a
si mesmo, crescimento e... a necessidade de dizer adeus, abraçando a
certeza de um final nada mais é do que apenas um novo começo para uma
nova história. felizmente a Pixar é a Pixar.
Numa viagem de férias, quando Bonnie adiciona um relutante (e sem-noção) e hilário novo brinquedo feito de sucata reciclada: O Garfinho ao
seu quarto, sendo apadrinhado por Woody que sempre viu o seu lugar no
mundo e a sua prioridade como cuidar de sua criança, seja ela Andy ou
Bonnie, e tudo o que se relaciona a elas, tem nesta aventura na estrada
ao lado de velhos e novos amigos a noção do quão grande o mundo pode ser
de fato para um brinquedo, reencontrando a sua antiga paixão, a boneca
de porcelana Betty, ( que estava ausente no filme anterior e aqui, tal
ausência é explicada) que agora não pertence a nenhuma criança, sendo um
“brinquedo perdido”, mas
agora, ela mudou, estando empoderada, não pertence a ninguém e veste
uma calça jeans no lugar do antigo vestido cor-de-rosa, numa alegoria da
mulher divorciada e bem-resolvida que sabe que a sua vida não é
definida por ser vinculada a de outra pessoa, ganhando assim um
protagonismo maior que o de Buzz (uma reação ao movimento #MeToo e podemos dizer, uma “resposta” da Pixar contra as acusações de assédio ao fundador do estúdio, John Lasseter).
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Aloprados: Patinho e Coelhinho, a "dupla qualquer-coisa"...
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Ao longo da película surgem novos personagens como a dupla Coelhinho e
Patinho, dois aloprados de pelúcia, Duke Caboon, um motoqueiro
acrobata, a pequena Isa Risadinha, e como antagonista temos A boneca
vintage Gabby Gabby e os Bensons, seus sinistros bonecos de ventrílocos capangas, que remetem aos filmes de terror na linha de Annabelle.
Mas o roteiro foge aos maniqueísmos fáceis, e se ela a princípio é uma
vilã, logo entendemos os fatos que a levaram a agir daquela forma, e
acenando para a possibilidade de um novo começo a partir da coragem de
se romper com antigos padrões que não levavam a lugar nenhum. É
necessário abrir mão do passado, para se abraçar o futuro.
A montagem de Axel Geddes (Wall-E, Procurando Nemo, Monstros S.A., Procurando Dory) é precisa nos cortes de forma orgânica, deixando a trama fluir, embalada pela música de Randy Newman (Cinesérie Toy Story, Wi Fi Ralph: Quebrando a Internet, A Princesa e o Sapo) continua cativante, sublinhando os momentos mais intimistas e nas sequências de ação.
O Desenho de Produção de Bob Pauley (O Estranho Mundo de Jack, Toy Story, Vida de Inseto, Divertidamente) e a Direção de Arte de Laura Phillips (Os Incríveis, Wall-E, Valente, Carros 3) enchem os nossos olhos com um mundo pleno de detalhes e cores em vários níveis, mostrando o quanto Toy Story não só continua como força total, mas também atua com força própria, criando ambientes visualmente ricos e envolventes.
No final saímos com um sorriso nos lábios e enxugando algumas lágrimas
no canto dos olhos certos de termos tido um novo e revitalizante
encontro com esses personagens tão queridos que conquistaram
merecidamente um lugar em nossos corações, encontro esse que poderá ser o
último ou não, pois embora amigos se despeçam e muitas vezes percam
contato, ainda sim as lembranças e suas histórias continuarão ecoando ao
longo de nossas vidas pois Woody, Buzz, Bethy, Jessie e Garfinho entre
outros tantos personagens nos provam que a vida permanece como sendo a
maior de todas as aventuras "ao infinito e além".
Obs: A dublagem em português continua impecável, sendo inclusive reconhecida pela Disney como a melhor de todas.