O Assombroso Multiverso!!!

Dr. Estranho de Sam Raimi traz o terror ao UCM.

As Muitas Faces da Lua

Spector, Grant, Cavaleiro da Lua, as múltiplas personalidades do avatar de Konshu.

Adeus, Mestre.

George Perez e sua fantástica trajetória.

Eu sou as sombras.

The Batman, de Matt Reeves, recria o universo sombrio do Homem-Morcego.

Ser legal não está com nada...Ou está?

Lobo, Tubarão, Aranha, Cobra, Piranha...Que medo!!! Mas eles querem mudar isso.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

E continuamos sem conhecer a Colômbia - Crítica - Filmes : “Encanto” (2021)


 

Em busca de diversidade Disney não escapa do estereótipo latino-americano

 por Carlos Vinicius Marins




#Oscar 2022

E já chegou ao streaming “Encanto”, o mais novo longa de animação da Disney. Diferente do que ocorreu com os últimos longas lançados pelo estúdio - “Soul”, “Raya e o Último Dragão” e “Luca” -, “Encanto” foi lançado nos cinemas antes de chegar ao Disney+. Na realidade ele ainda continua nos cinemas, onde faz uma trajetória e tanto: já arrecadou mais de US$ 200 milhões nas bilheterias ao redor do mundo e atingiu um almejado índice de aprovação de mais de 90% do popular site agregador de críticas Rotten Tomatoes.

O longa nos apresenta a Família Madrigal, fundadora e protetora de Encanto, um vilarejo colombiano encrustado na Floresta Amazônica. Em flashbacks o filme conta que a matriarca Alma Madrigal e seu marido com seus três filhos, acompanhando um grupo de migrantes, fugiam de pessoas armadas que os hostilizavam a cidade em que moravam. No caminho, Alma desperta uma poderosa magia, que fica associada a sua família e seria usada pelos Madrigais para proteger e orientar aqueles migrantes e seus descendentes.

 

Alma Madrigal: matriarca superprotetora preocupada em manter a magia dos Madrigais na família

 

Devido a magia que encontraram em seu caminho, Alma e seus três filhos são agraciados com dons. E essa característica é transmitida para todos os seus descendentes, despertando poderes únicos em cada um deles após atingirem uma certa idade e passarem por um ritual característico. Bem, em todos menos um: a jovem Mirabel, a única Madrigal que não é especial. Ele procura compensar sua ausência de poderes, procurando ser prestativa, companheira e amorosa com os membros de sua Família e com os habitantes do vilarejo, mas seus atos nunca parecem ser suficientes para ganhar a mesma estima que sua avó dá aos outros netos. E, para piorar, Mirabel parece ser a única a perceber que a magia da família está acabando. Sozinha, ela procura descobrir o que está está acontecendo e o que pode fazer para restaurar a magia dos Madrigais. E tudo indica que um segredo de sua família, um tema sobre o qual os membros mais velhos dos Madrigais nunca comentam, pode ser a chave do mistério.

 

Mirabel, a Madrigal sem poderes: “É, né?”

Dirigido por Bryan Howard e Jared Bush, responsáveis por “Zootopia: Esta Cidade é o Bicho” (2016), “Encanto” é o sexagésimo longa de animação da Disney e mais uma das recentes produções do estúdio a tentar compensar a falta de diversidade étnica e cultural das consagradas produções de seu passado. E realmente este último filme dá alguns passos adiante, apresentando no centro dos acontecimentos uma grande família - com 12 membros - como um símbolo de miscigenação étnica. Ela tem a presença de negros, índios e brancos sem que isso seja questionado ou apresentado como se fosse algo fora do comum. Em sua maioria os membros da família não se encaixam nos padrões típicos de beleza e os poucos tipicamente belos não são os personagens de destaque.

 

Mirabela ao lado da mais bela dos Madrigais: “Isabela? Uma ajudinha? Oi...?”


Elementos culturais da Colômbia podem ser vistos no filme. Seja sua culinária típica - com alguma atenção para a arepa, uma espécie de pão feito com massa de milho -, a presença de animais tradicionais da Floresta Amazônica (na realidade comum a todos os países que tenham a Amazônia no seu ecossistema) e elementos ligados ao vestuário e a arquitetura. Este último o maior destaque cultural do país no longa, pois a grande casa dos Madrigais é um personagem importante e mutável da história.
 

Hà um segredo do passado dos Madrigais que precisa ser desvendado…

A Disney, porém, perde uma grande chance de ir além. Isso fica claro ao compararmos o filme com outra produção do mesmo conglomerado, mas desenvolvido por outro estúdio que dispensa apresentações: a Pixar. A produção em questão é “Viva! - A Vida é uma Festa” (2007, de Lee Unkrich e Adrian Molina), que tem como foco outro país latino-americano: o México. Neste também houve uma grande preocupação em apresentar e valorizar os elementos sociais e culturais daquele país, mas seu roteiro, além de mexer mais profundamente com nossas emoções, tem dois elementos importantes do México que são norteadores de toda a história e que conseguem envolver o público que o assiste de forma contagiante, duradoura e, mais que tudo, respeitosa com a cultura da qual se originam: o cancioneiro típico do país e sua tradição do Dia dos Mortos.


Madrigal é sempre prestativa com todos a sua volta

São estes elementos norteadores que fazem falta em
“Encanto”. A cultura e algumas características sociais estão presentes, mas são apenas parte do cenário. Não há um elemento típico da cultura do país que seja realmente imprescindível a história que querem contar. Para quem vê de fora e não conhece  especificamente a cultura colombiana, o filme poderia se passar em qualquer outro país castelhano das Américas que não faria diferença. Muitos dos elementos apresentados soam como estereótipos, principalmente porque a nenhum deles é dado o devido destaque narrativo.

 

Encanto: o vilarejo emula os cenários dos obras do realismo-fantástico latino-americano

Um expectador com um olhar mais atento pode até fazer um correlação entre o vilarejo de Encanto com Macondo, a cidade criada pelo escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez como cenário de seu livro mais conhecido: “Cem Anos de Solidão”. Principalmente por evocar o realismo-fantástico da obra que definiu esse gênero literário, marcante em toda a América Latina. Mas isso é pouco para envolver os expectadores, principalmente as crianças, que são o público-alvo primordial da produção e que, em sua maioria, certamente não deve ter ainda ouvido falar do escritor vencedor do Nobel de Literatura.

 

Antônio, o mais novo membro dos Madrigais, passa pelo ritual que pode lhe conferir o dom mágico da família 

 

O roteiro de Jared Bush e Charise Castro Smith, poderia, por exemplo, fazer uma relação mais clara entre a vela mística que Alma Madrigal encontra durante a fuga em seu passado e que representa o dom divino dado aos membros de sua família, com o Dia das Velas, comemorado na Colômbia no feriado de 7 de Dezembro. Nesta data, considerado no país o início das atividades natalinas, boa parte do povo colombiano coloca velas em suas janelas, nas calçadas, parques e praças para comemorar o dia da Imaculada Conceição para os católicos, formando um belo cenário em todo o país. Em algumas cidades as pessoas fazem também arranjos complexos com lanternas para marcar o dia. Quem conhece a cultura da Colômbia fará a associação entre a vela mística e a data - até porque a vela do filme tem o visual típico da comemoração -, mas seria mais envolvente para quem assiste se a relação fosse mais clara. Visualmente o filme seria ainda mais interessante e um haveria um vínculo entre os expectadores e uma importante tradição da Colômbia, que é pouco conhecida fora do país.


A bela festa do Dia das Velas na Colômbia 


“Encanto” está muito longe de ser um filme ruim. Mas a Disney perdeu a chance de ter um longa de animação impactante para marcar a efeméride de atingir a espantosa marca de 60 produções do gênero, desde de “Branca de Neve e os Sete Anões” lançando em 1937. Seu roteiro frui fácil e a animação em si é de ótima qualidade. A identificação com as crianças é certeira, principalmente em sua mensagens de aceitação das diferenças e das deficiências, da importância da família, dos filhos serem amados pelo que são, mesmo que não correspondam as expectativas dos pais, e ao mostrar que os filhos podem e devem seguir seus próprios caminhos. Suas músicas - do premiado Lin-Manuel Miranda (Hamilton, Um Bairro de Nova York) e Germaine Franco (“Viva! - A Vida é uma Festa”) -  pontuam bem a história mas não são tão marcantes. O destaque da trilha (“Two Oruguitas”, cantada pelo ídolo pop colombiano Sebastián Yatra) inclusive emula em alguns trechos de um clássico do estúdio: “Under The Sea”, composta por Alan Menken e Howard Ashman para “A Pequena Sereia” (1989, de John Musker e Ron Clements).

Sem dúvida muitos vão gostar do filme. É um bom entretenimento escapista com toques de diversidade cultural e social. Mas esta é uma ótima ideia que gerou apenas um longa mediano do estúdio.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Déjà-vu divertido - Crítica - Filmes: Matrix Ressurections (2021)

 

Substância, simulacro, nostalgia

 

por Alexandre César


Nova aventura de Neo & Cia. é bom, mas acrescenta pouco à mitologia



Em 1999 conhecemos um carinha chamado Thomas Anderson que tinha uma vida dupla como programador de uma empresa e um hacker conhecido como Neo nas horas vagas. Um indivíduo que sentia algo estranho quanto à sociedade e ao mundo à sua volta. Após sofrer um interrogatório surreal por agentes do governo é abordado por um grupo liderado pelo enigmático Morpheus e a bela Trinity . Morpheus o desafia a descobrir a verdade sobre o mundo escolhendo tomar uma pílula vermelha ou, escolher tomar uma azul e acordar no dia seguinte como se nada tivesse acontecido, e levar a sua vida como sempre levou. Ele escolhe tomar a vermelha e a partir daí ele descobre que o mundo é uma simulação de realidade virtual, onde todos os seres humanos estão conectados, vivendo suas vidas dentro de casulos e gerando com seus corpos, a energia necessária para manter as máquinas (verdadeiras senhoras do mundo) alimentadas, e sendo ele, um líder messiânico profetizado para vir libertar a humanidade da escravidão.
 
 
Thomas Anderson (Keanu Reeves) olha para o espelho e não reconhece de fato seu reflexo...

 
Matrix (The Matrix, 1999) simplesmente revolucionou o gênero ficção-científica. Conside-rados por muitos uma obra de arte para a época, o longa que conta com nomes como Keanu Reeves (Neo), Laurence Fishburne (Morpheus) e Carrie-Anne Moss (Trinity) custou US$ 65 milhões e arrecadou US$ 456 milhões. Esse sucesso muito se deve à história inovadora, além de tecnologias inovadoras como o “bullet-time” *1, usadas como nunca antes se tinha imaginado e, colocou definitivamente o nome Wachowski no mapa do meio cinematográfico, e da cultura pop. 
 
...bem como o mundo à sua volta, que às vezes vislumbra como um construto...

.. e apesar de ser um programador, são as pessoas à sua volta que vivem mergulhados nos smartphones


O sucesso levou à uma animação*2, e a duas sequências de tom mais grandiloquente, que dividiu opiniões, mas concluiu a saga de Neo, o escolhido.
Desde então o mundo mudou, e ao longo dos anos, e tal qual suas criações, seus criadores também mudaram, abraçando a transição de gênero, se transmutando de Andy e Larry para Lilly e Lana Wachowsky, mostrando que havia muito mais camadas na trama que à primeira vista parecia apenas uma repaginação de uma trama de super-heróis, que trocavam as capas por sobretudos e as máscaras por óculos ray-ban, refletindo alegoricamente sobre temas que o mainstream ainda demoraria tempo a assimilar e digerir...
 
 
Paralelo  a isso os Agentes, como Johnson (Daniel Bernhardt) caçam todo e qualquer "intruso" nesta "realidade"
 
Passados mais de duas décadas desde o original, e após vários outros projetos que nunca tiveram o mesmo impacto no horizonte, Lilly se retirou para a vida privada e Lana decidiu revisitar esse universo narrativo, antes que a Warner Bros resolva fazê-lo (há até uma piada no filme sobre isso) sem ela, ou qualquer da cabeças pensantes do original, mantendo assim um vínculo criativo com aqueles tempos pioneiros...
 
 
Bugs (Jessica Henwick) que auxiliada por Sequoia (Toby Onwumere)procura falhas na Matrix...

Acabando por libertar o programa Morpheus (Yahya Abdul-Mateen II) que se torna valioso aliado


 
Dirigido por Lana Wachowski (O Destino de Júpiter), Matrix Ressurections (2021) é uma celebração e uma atualização do original, mais bem humorada desse rico universo ficcional, que se não é disruptivo como o original, mas que ainda consegue ser um filme legal de assistir, desde que você aceite o fato de que o tempo passou, e que este filme pouco pode acrescentar a esta mitologia, que já é bastante rica.
 
O Analista (Neil Patrick Harris) de Thomas Anderson usa óculos de armação azul, cor das pílulas que receita a seu paciente
 
 
O roteiro de Lana Wachowski, David Mitchell (A Viagem) e Aleksander Hemon (Love Island) inspirado em suas experiências pessoais, é uma variada alegoria sobre o não-binarismo, com geniais e divertidas questões meta-linguísticas sobre o conceito de Matrix, que agora já é de amplo conhecimento do público, e que agora não depende de conexão discada para se conectar, tendo à sua disposição as telas dos smartphones, e as bolhas das redes sociais para se manterem plugados na web em cada minuto da vida, seja por conta de vídeos de gatinhos ou dancinhas do Tic Toc.
 
O tímido Thomas Anderson ama à distância Tifany (Carrie-Anne Moss) que foi a inspiração para a personagem "Trinity" de seu premiado game "The Matrix"...

...que o seu sócio Smith (Jonathan Groff) tenciona relançar uma versão atualizada. Hugo Weavingso não reprisou o papel no filme devido a conflitos de agenda

 
Conhecemos a jovem Bugs (Jessica Henwick de Ameaça Profunda) que auxiliada pelo técnico Sequoia (Toby Onwumere de Sense8) monitora códigos-fontes antigos que tem rodado na simulação e, após libertarem um programa (agora programas também ‘ingerem’ a ‘pílula vermelha’) que se descobre chamar Morpheus (Yahya Abdul-Mateen II de Watchmen) decidem ir atrás do lendário Neo, ou melhor, Thomas Anderson (Keanu Reeves de John Wick3: Parabellum) o mais premiado desenvolvedor de games, um homem de meia idade tímido. Anderson há anos se consulta com um Analista (Neil Patrick Harris de Desventuras em Série) por conta de um colapso nervoso que teve, tomando diariamente pílulas azuis, e que ama à distância Tifany (Carrie-Anne Moss de Amnésia) uma mulher casada e com filhos, em que ele se baseou para criar Trinity, personagem de seu mais bem sucedido e premiado game The Matrix, e que agora o seu sócio Smith (Jonathan Groff de Hamilton) convoca para desenvolver uma nova versão do game, após duas décadas de sucesso, por pressão da empresa matriz, a Warner Bros.
 
 
Pato que não é da FIESP: Anderson / Neo na realidade é prisioneiro desta "realidade"

 
Com esta pegada de meta-linguagem, Wachowski brinca com sua criação, não se levando tão à sério, e nos mostrando que após os eventos de Matrix Revolutions, a trégua na guerra entre homens e máquinas se manteve, surgindo uma leva que inclusive se tornou aliada dos humanos, enquanto houve uma guerra interna entre as máquinas, e que, as coisas se encaminham para um novo conflito, e num clima de filme de assalto, Bugs, Morpheus, Sequoia e outros planejam resgatar Neo, e depois Trinity de suas ilusões virtuais, enfrentando os agentes (mortais como sempre) e outras atualizações da própria simulação.
 
 
Logo Buggs consegue contactar Thomas Anderson e lhe remove o véu da ilusão...

...despertando-o de seu casulo, podendo então, encarar a realidade

 
Rostos conhecidos da franquia como uma Niobe (Jada Pinkett Smith de Gotham) bem mais velha (o tempo fora fora da Matrix foi maior do que duas décadas), o Merovíngio (Lambert Wilson de De Gaulle) e uma versão adulta de Sati (Prianka Chopra Jonas de Quantico) retornam para nos situar quanto às mudanças do Status Quo, e novos personagens dentro da Matrix como Jude (Andrew Caldwell de iZombie) ou a executiva Gwyn de Vere (Christina Ricci de Um Amor Após a Vida numa participação-relâmpago) mostram as artimanhas de cerco e monitoramento em torno do casal Neo-Trinity (cujo amor é o grande diferencial na trama) além do grupo de humanos de fora que emfrentam o sistema como Sheperd (Max Riemelt de A Onda),Funktløn (Joshua Grothe de A Viagem), Lexy (Érendina Ibarra de El Candidato) entre outros, são a leva de humanos tatuados e de visual descolado a que já estamos habituados, que os figurinos de Tom Davies (Cruella) e Lindsay Pugh (Krypton) definem competentemente.
 
 
uma Niobe (Jada Pinkett Smith) envelhecida lhe revela que muuito tempo se passou e o mundo mudou

 
A edição de Joseph Jett Sally (Sense8) alterna um ritmo contemplativo nos momentos em que vemos Neo em seus momentos subjetivos de questionar a realidade, a outros mais dinâmicos, como quando a equipe planeja e executa o resgate de um personagem e um tom mais picotado nas cenas de luta (cuja coreografia varia do muito bom ao mediano) embaladas pela música de Johnny Klimek (Babylon Berlin) e Tom Tykwer (Corra, Lola, Corra) que trabalha com variações dos temas da série de Don Davis, com inserções de hits como “Spybreak!” na versão de Propellerheads, “White Rabbit” na versão de Jefferson Airplane, “Inkodlo Kamashimane” por Black Coffee e “Wake Up” por Brass Against.
 
 
Agora novas tecnologias permitem que os programas possam interagir com os humanos fora da Matrix, no mundo físico...

...embora a maioria da humanidade permaneça isolada da realidade, em seus casulos

 
A bela fotografia de Daniele Massaccesi (Natale a Beverly Hills) e JohnToll (O Destino de Júpiter) sublinha a alegoria do binarismo/escolha optando por tons de azul e vermelho, em oposição a luzes de tom âmbar, amarelo. Oposição que se reflete no desenho de produção de Hugh Bateup (O Destino de Júpiter) e Peter Walpole (In Deep) e cujos detalhes inseridos pelas equipes de direção de arte chefiadas por Stephan O. Gessler (O Grande Hotel Budapeste), Maya Shimoguchi (Planeta dos Macacos: A Guerra) e Anja Müller (Robin Hood: A Origem) somados aos easter eggs da decoração de sets de Lisa Brennan (I Am Mother) e Barbara Munch (Milk: A Voz da Igualdade) situam vários detalhes sobre os personagens, como o gato Déjà-vu *3.
 
 
A ireção e arte, fotografia e os efeitos visuais mostram que essa nova versão da Matrix é mais eficiente, por ser no geral, mais acolhedora e confortável

 
A criação de mundo, por obra dos efeitos visuais das companhias BUF, Big Flick Rentals, Double Negative (DNEG), Framestore, Hexpro, Instinctual VFX, MG Action, One Of Us, RISE Visual Effects Studios, Turncoat Pictures, Web3Point Studios, Junto com os animatrônicos e próteses de Twilight Creations, supervisionados por Dan Glass (Velozes & Furiosos: Hobbs & Shaw), Nick Irving Allen (O Chamado da Floresta) e Florian Ast (Homem-Aranha: De Volta ao Lar) é competente, refletindo os avanços tecnológicos nestas duas décadas, mas não apresentam nada que seja um divisor de águas como o “bullet-time”, que inclusive é ironizado nos diálogos de um oponente.
 
A maneira como planejam e executam o resgate de Trinity, remete aos "heist movies" (filmes de roubo)

Aqui Trinity acabe tendo um papel crucial, refletindo uma equiparação dos gêneros
 
 
Ao final, Matrix Ressurections diverte, mas sem grandes pretensões de querer ser inovador, pois as questões de cunho filosófico já foram absorvidas pelo público nessas duas décadas (que deverá irritar alguns...), sendo pouco provável que inicie uma nova trilogia, e tendo a coragem de inserir uma sutil capacidade de rir de si mesmo (mas não caindo numa “Fórmula Marvel”...) como na cena pós-créditos em que os desenvolvedores divagam sobre o futuro do entretenimento digital. Só vendo... 
 
Às vezes é necessário um "Salto de Fé"
 





Notas:
 


 
*1: A dupla Wachowski criou o “bullet-time”, que é constituído em exibir a cena em câmera lenta ao mesmo tempo que mostra por diferentes ângulos os elementos se movendo em velocidade reduzida (Exemplo: a cena de Neo se desviando dos tiros).
 
 

A antologia complementa o filme, dando substãncia

*2: A antologia de desenhos Animatrix (2003) foi lançado no mercado de vídeo como uma antologia de 9 contos de curta-metragem sobre o mundo de Matrix, tendo sido lançado antes das continuações do filme nos cinemas. Os contos são uma fusão de computação gráfica com o tradicional anime japonês, e trata das histórias que antecedem Matrix, dos dias finais das últimas cidades da humanidade, da guerra contra as máquinas e da queda da espécie humana.

O gato "Déjà-vu", umas das várias brincadeiras visuais ao longo do filme com sua própria mitologia

*3: O déjà-vu é a sensação de que uma cena ou experiência que se está vivendo nesse momento já aconteceu. Estima-se que 97% das pessoas já tenham experimentado algo do tipo. Habitualmente, ele não indica gravidade, mas pode sinalizar a possibilidade de se ter epilepsia ou ansiedade generalizada em alguns casos.

Doces ou amargas, a vida e feita de escolhas, sendo que na maioria das vezes, nem precisamos fazer a escolha, por já saber no íntimo o que procuramos...

 

 


 

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Equívoco histórico - Crítica - Filmes: King´s Man: A Origem (2021)

 

Não abuse demais com a História.

 por Ronald Lima


A Origem da Sociedade The King's Man


Tendo surgido em 2014, Kingsman: Serviço Secreto  de Matthew Vaughn (X-Men: Primeira Classe) transpunha o escracho e a ironia dos quadrinhos de Mark Millar e Dave Gibbons, que zoava com os estereótipos dos filmes de espionagem tipo James Bond (notadamente a fase de Roger Moore) nos apresentando uma agênciaa de espionagem britânica não-governamental: A Kingsman, cujos membros usavam codinomes inspirados nos Cavaleiros da Távola Redonda. Tanto no original quanto em sua sequência Kingsman: O Círculo Dourado (2017) Vaughn acompanhou os passos de Eggsy, um jovem da classe operária que ingressa na organização e se transforma gradativamente num refinado cavalheiro defensor do 'Mundo Livre', com direito à toda sorte de humor negro, sequências de luta bem splatter.

Orlando,Duque de Oxford (Ralph Fiennes) vê seu filho Conrad (Harris Dickinson) galgando os primeiros passos na vida adulta


Agora, em King´s Man: A Origem (2021) o terceiro filme da franquia, Vaughn procura nos dar uma origem épica ao grupo, explicando como a organização se formou, dando-lhe um 'contexto histórico' (pero no mucho)...

O roteiro de Karl Gajdusek (Oblivion) e Matthew Vaughn (baseado em seu argumento) se inicia na Guerra dos Bôers em 1902, onde o Império Britânico passou um aperto contra colonos Holandeses na África do Sul (Esses colonos não contaram com a ajuda de seu país natal). É nesse contexto que passamos a conhecer o pacifista Orlando Oxford, Duque de Oxford (Ralph Fiennes de 007: Sem Tempo Para Morrer mostrando ser um bom herói de ação de terceira idade). Orlando é representante da Cruz Vermelha, junto com sua esposa Emily. (Alexandra Maria Lara de Tempestade: Planeta em Fúria). O casal tem um único filho, Conrad, os 3 são protegidos pelo fiel guarda-costas Shola (Djimon Hounsou de Amistad). Orlando e Emily vão inspecionar o acampamento de seu amigo Lorde Kitchener (Charles Dance de Godzilla II: Rei dos Monstros) famoso pela frase “O Seu País Precisa de Você!” (e idealizador do conceito de campos de concentração) junto com seu auxiliar Maximillian Morton (Matthew Goode de Watchmen: O Filme). Um ataque inesperado deixa Orlando manco, viúvo, e traumatizado quanto aos cuidados com seu rebento, sendo esse o fator definidor do filme.
 

Durante a "Guerra dos Boeres", Oxford visita o seu amigo Lorde Kitchener (Charles Dance) que junto com seu ajudante de ordens  Maximillian Morton (Matthew Goode), testemunham uma tragédia pessoal que ditará os rumos da vida do Duque

 
Assim, o roteiro salta até momentos antes da Grande Guerra de 1914 a 1918, quando Conrad (Harris Dickinson de Malévola: Dona do Mal) é agora um rapaz com enorme desejo de ganhar o mundo e se tornar soldado, saindo da asa do pai super protetor, Orlando conta com outros dois importantes protagonistas na proteção ao filho, Shola, ainda fiel ao seu mestre, e a governanta Polly Watkins (Gemma Arterton de João e Maria: Caçadores de Bruxas).Orlando finalmente chega a conclusão de que o filho agora é um homem, e precisa  de um terno... 
E tudo começa


 
O filme faz uso de uma interpretação muito própria de todo esse pano de fundo histórico ora encaixando personagens em situações reais de eventos ora criando eventos paralelos e personagens para construir essa sociedade que justamente passa a ter sua sede localizada em uma alfaiataria chique em Savile Row de Londres, Westminster, adotando de nome "Kingsman".


"O hábito faz o monge": A sede, numa alfaiataria chique em Savile Row, Londres


Os quadrinhos e os filmes anteriores enxergam a História pelo viés "centro do mundo britânico" Não há de fato nenhum problema em se utilizar de eventos históricos para criar um roteiro e até mesmo altera-los mas sinceramente, ver a defesa da Inglaterra como baluarte da liberdade e tudo em volta como a mais vil das maldades e da tirania é exagerar, ah sim... Quando o oponente não é mal pra dedéu é de uma tolice só, essa tolice vale para aliados inclusive. Tudo bem que há muita crítica as ações de guerra e pomposos discursos de cunho pacifista, mas a reação dos envolvidos demonstra o oposto, portanto... Não convincenteÉ um filme que parece querer nos empurrar a ideia de que tanto os excelentes ternos de linho britânicos quanto o imperialismo e a aristocracia daquele país estão entre as melhores coisas que o planeta concebeu. Na verdade essa leitura vale como resumo para todos os valores ocidentais: O cumprimento das obrigações impostas ao indivíduo pela sua posição frente ao mundo. Tudo que é oposto é colocado em um pensamento raso que deseja apenas destruir o que há de "civilizado" (chega a parecer olavista...).


Orlando orienta Conrad que ser adulto tanto é saber ser cortês e elegante, quanto saber se defender de forma agressiva 

 
Porém como um filme de aventura King´s Man: A Origem funciona e assim vou dividir essa crítica em duas, a análise do filme e depois uma outra com vários spoilers porque sem relatar o que está em cada cena ficará difícil mostrar as incoerências no roteiro e principalmente essa ideia de fundo de que o 'Mundo Livre' é defendido por uma Inglaterra Santa que procura a Paz mas não irá se furtar em usar de todos os recursos para manter essa Paz. Uma Paz que a favoreça é claro... à uma balança comercial e geo-política favorável aos seus interesses.

Vamos todos aqui usar algum objeto em comum porque assim fica mais fácil para alguém mais atento perceber que somos uma cabala do mal.


A escalada de eventos, vai particularmente colocando tudo em rumo de colisão, as relações de poder, e as alianças entre os primos Rei George da Inglaterra / o Kaiser Guilherme II da Alemanha/ e o Tsar Nicholau Romanoff da Rússia (Tom Hollander de Bohemian Rhapsody)fomentada por uma "Cabala do Mal" de inimigos da Inglaterra, chefiados por um líder misterioso, tendo como membros Grigori Rasputin (Rhys Ifans o Lagarto de Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa) um dos grandes adversários do filme, um verdadeiro "rockstar", temos também Erik Jan Hanussen (Daniel Brühl. O Zemo de Falcão e o Soldado Invernal) uma "iminência parda" da corte do Kaiser Guilherme II, a espiã Mata Hari (Valerie Pachner de Uma Vida Oculta) e Gravilo Princip (Joel Basman de Caçadores de Obras Primas), Gravilo Princip foi autor do atentado que deu início aos eventos que culminaram na Grande Guerra. 

Meu primo perfilou os soldadinhos dele daquele lado? Pois então eu quero os meus soldadinhos desse outro lado aqui.


Ao longo do filme outros personagens históricos somam-se ao grupo num "samba do crioulo doido" que reduz toda e qualquer linha de pensamento e atuação contrária aos interesses imperialistas britânicos nessa "Organização do Mal", o roteiro faz equiparação sem fundamento entre comunismo, nazismo e luta anti-colonial como se fossem uma coisa só (dá para entender porque temos aqui e afora tanto débil mental que insiste em dizer que "nazismo é de esquerda"). Só faltava na mesa algum personagem chinês, que sabe o Fu-Manchu?  Sim, é uma figura da literatura... Mas não seria de estranhar. É de imaginar como esse líder conseguiu unir tão diferentes pessoas e propósitos, Rasputin é o único a questionar, ele tem bom destaque no filme, grande personagem... Opa! Esqueci a motivação, O líder é mau!! Muito mau! Ele é vingativo e cruel, ele tem o discurso anti-colonial, e se aumentar sua voz de revolta contra a opressora Inglaterra dará margem para pensar demais então a solução é deixa-lo histriônico. Esse líder é chamado por todos de pastor (pastor de cabras ok?). Pronto, foi simples assim, temos nesse desejo de vingança a incrível capacidade de jogar esse "grupo das sombras" em cada corte da Europa para manipular as rivalidades infantis que existe entre os primos das casas reais e por o continente inteiro em uma Guerra, Curiosamente a França fica de fora por completo, não aparece um soldadinho francês que seja o filme inteiro, sobre a França temos as trincheiras apenas. O uso de drogas como poder manipulador também é colocado de modo maniqueísta. A Inglaterra entrou em guerra contra a China para manter o comércio de ópio vindo de suas plantações no Afeganistão, os ingleses ocuparam Hong Kong criando um polo desse comércio e banco exclusivo para controlar tudo isso, banco ainda em atuação agora com outras atribuições. Detalhe, a base secreta fica justamente em algum país da Ásia Central (sim base secreta), escolha você algum aí afinal nesses países só tem "terroristas" e "plantações de maconha" certo? Olha a volta que o roteiro nos força a raciocinar.

Uma xícara de chá? Um par de pistolas quem sabe? 

A equipe The King's Man é organizada de modo muito elegante e inteligente em visual oposto ao grupo maligno (sempre envolto nas trevas e conflituoso). Há uma importante protagonista nessa proto King's Man que é a personagem Polly (Gemma Arterton), ótima personagem por sinal, ela lidera uma incrível rede de serviçais em inúmeras cortes, gabinetes e repartições pelo mundo, com isso o grupo consegue um grande panorama dos bastidores. Uma boa sacada. O início da equipe de fato é em uma sala secreta do Castelo de Oxford com uma porta disfarçada cujo mecanismo para abrir lhe fará lembrar da mansão Waine do seriado Batman 66... Cadê os postes de bombeiro da Batcaverna? Faltou...

"Para o Batmóvel!!"


A franquia The King's Man tem uma ação muito hiper violenta e frenética mas nesse Origem tudo vai sendo contido nas intermináveis desculpas para Orlando evitar que o estimado Conrad siga para o combate. As maquinações malignas começam a se encaixar. A ação explode em quatro momentos:

O atentado contra o arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono do Império Austro-Húngaro, é legal, muito interessante ver automóveis da 1ª década do séc. XX em correrias e fugas desenfreadas em meio a explosões.

"Eu disse Batmóvel... !


Duas sequências de luta selvagem são ótimas. Orlando, Shola e Conrad enfrentam um Rasputin que esbanja personalidade e super poderes, o uso de uma câmera hiper cinética junto a todos os efeitos e ensaios de coreografias que a produção conseguiu pagar é um ponto alto do filme, infelizmente há uma situação que estraga essa confronto, é grotesco como  colocam um ato homossexual sendo bestial e vulgar mas é assim The King's Man? Para quem acompanhou os outros dois filmes essa falta de tempero está aqui presente e quebra a tentativa de um texto mais sóbrio. A tentativa de deter Rasputin é uma leitura própria do que de fato ocorreu quando a nobreza russa procurou livrar-se do monge, também houve uma aproximação de cunho e provocação sexual junto a um pedido de cura para o nobre Felix Ysupov. O filme simplesmente os substituiu pela equipe King's Man. O mesmo para o atentado do Arquiduque, por sinal região e conflito de pouco interesse para os britânicos na época. 

"Berebekan Katabanda, Berebekan Katabanda, Berebekan Katabanda, Kikera! 


O cinema ao montar cenários da guerra de trincheiras se aprimora a cada dia e desperta interesse em querer se aprofundar nesse conflito que fechou o séc. XIX e lançou o Mundo no séc. XX. Nesse 3º filme da franquia ocorre um conflito entre uma patrulha escocesa e outra alemã na chamada Terra de Ninguém (terreno inóspito não ocupado que ficou entre as duas linhas beligerantes). Essa luta tem uma grande carga de violência pois é realizada mão a mão, faca a faca, homem contra homem combinada ali no momento em total silêncio para que nenhuma frente perceba e interrompa o cruel duelo com metralhadoras e bombas, tudo tem que ser resolvido ali em carne viva, pode não gostar do filme pela leitura tendenciosa dos inimigos da Inglaterra mas essa luta eu colocaria em destaque em uma galeria de filmes de guerra, é muito forte, a crueza da guerra, muito simbólica. Aqui o diretor acertou no toque épico da origem do grupo.

Ótima sequência!!


A 4ª ação não entrarei em detalhes porque rodopia a narrativa e joga Orlando à entrar para valer no confronto aos inimigos invisíveis fomentadores da guerra. Só que a partir desse momento a ação fica bastante mashup de todas as cenas de lutas, correrias e disparos que certamente você vê e viu em inúmeras produções por aí, afinal alguém realmente acredita que Ralph Fiennes irá cair de um penhasco? Ou se seu avião decola ou não?

Avada Kedrava!!



Música de Dominic Lewis (O Homem do Castelo Alto) e Mathew Margeson (Kingsman: O Círculo Dourado) que inclui um novo arranjo de "War Pigs" de Black Sabbath.
Fotografia de Ben Davis (Eternos) trabalha bem a palheta de cores, tendo ótimos momentos expressionistas no episódio que cobre a guerra de trincheiras, com cenas expressionistas dignas de filmes de horror, bem ajustada com a edição de  Jason Ballantine (IT - Capítulo 2) e Robert Hall (Mundo em Chamas) que trabalha os ritmos narrativos de forma dinâmica, e frenética nas cenas de combate.
 
A reconstituição de época que o desenho de produção de Darren Gilford (Kingsman: O Círculo Dourado) mescla o realismo da reconstituição fotográfica de época com ambientes bem característicos de histórias em quadrinhos, como a base da cabala dos vilões, num despenhadeiro num lugar remoto no leste europeu, sublinhado pela direção de arte das equipes de Doug J. Meerdink (O Segredo de Berlin) e Nick Gottschalk (Sherlock Holmes: O Jogo de Sombras) e a decoração de sets de Dominic Capon (Venon: Tempo de Carnificina) que introduz gadgets de espionagem nos utensílios de uso cotidiano, no melhor estilo James West.
figurinos de Michele Clapton (The Crown) fazem uma boa mescla de trajes de época com elementos mais neutros  de aspecto atemporal.         e particularmente interessante a construção do look de Orlando Oxford, com chapéu côco, paletó, colete, bengala, que remete ao de John Steed, de Os Vingadores, seriado britânico dos anos 1960, justamente uma das fontes de inspiração de Kingsman.
 



 
Os efeitos visuais das empresas 4DMax, BUF, Framestore, NVIZ, RISE Visual Effects Studios, Rhythm & Hues Studios, Snow Business International, Visualskies e Weta Digital supervisionados por Angus Bickerton (Kingsman: O Círculo Dourado) tem um aspecto satisfatório no quesito de recriação de mundo e seu período histórico, além de introduzir adrenalina nas cenas de ação e destruição, que o gênero tanto pede.



AVISO - SPOILERS - SPOILERS - SPOILERS - SPOILERS - SPOILERS - AVISO
Muitos!!



Mata Hari seduz o presidente norte americano com o objetivo de evitar que essa nação entre na guerra, deixa pra lá a premissa da Mata Hari se envolver em uma ação lá nos E.U.A. Isso não ocorreu (nem tinha como). Mas por que cargas d'água ela permitiria ser filmada por alguém(?) do lado de fora mostrando-a lá dentro do gabinete presidencial de Woodrow Wilson? Criar prova contra ela própria? Seria para mostrar ao líder alguém pode responder. Não precisava porque os norte americanos também no filme relutaram muito em se envolver em uma guerra, no filme o motivo era Mata Hari (SIC!!) despejando ópio no presidente. A filmagem focando uma janela. Puxa vida!! Ninguém viu um pesado e complexo equipamento de filmagem de 1917 em pleno gramado da Casa Branca? Sem contar que essas filmadoras ainda não possuíam tecnologia dar close ou zoom. Essa situação com a Mata Hari é crucial para sequência final. Como dito acima após as cenas das trincheiras a ação passa a ser mais intensa e detalhes como esse acima simplesmente passam e todos acham que é assim mesmo. "Nós vamos para a guerra!'' Woodrow Wilson diz com entusiasmo (por ir a guerra?).

"Expelliarmus!"


O personagem que arquiteta toda a ação que joga primos contra primos é um escocês que se auto denomina: o pastor (Matthew Goode). Um moinho de propriedade de sua família e fonte de renda foi confiscado pela Inglaterra sem nenhuma compensação e causou mortes e tristezas. É uma boa motivação que dirige o discurso anti-imperialista desse personagem contudo sem muita extensão, apenas o ódio é a característica, além da covardia, e isso é intencional para não complicar muito alguma explicação, nesse ponto acredito que os autores por serem ingleses preferiram colocar a Escócia ao invés da Irlanda. Há de fato uma tentativa de independência escocesa mas as lutas que os ingleses tiveram contra os irlandeses foi muitíssimo mais violenta. Então pela proximidade de território, pela crueza dos conflitos e com resolução ainda recente de tudo. Aqui pisaram no freio a meu ver. A construção de discurso fica patente caso tenham de fato preterido a Irlanda para não melindrar e escolher a Escócia.

O evento histórico da morte da família real russa é rapidamente mostrada para culpar o regime comunista pela execução dos monarcas e descendentes. Fica a pergunta: Por que a rede informal do King's Man que conseguiu evitar a manipulação de Rasputin contra a família real russa, não conseguiram nenhuma informação sobre a ida de Lênin e a implementação do regime comunista na Rússia Tzarista e evitar as mortes? Afinal os roteiristas mexeram com a História... Porque não? As mortes são displicentemente mencionadas por Oxford e o Rei da Inglaterra George V e a situação fica "pra depois"... Ralph Fiennes se desculpa pela Inglaterra todo o tempo. Que os russos façam seu King's Man e se acertem com a história é o que deve ter pensado os autores.

Rasputin faz um gesto Hipnótico



O desabafo de Conrad Oxford (Harris Dickson) junto a um colega de armas em meio ao terreno desolado da terra de ninguém e sua surpreendente, estúpida e injusta morte no filme poderia nos poupar das desculpas que a Santa Inglaterra parece querer se purgar diante do público. A guerra é estúpida.

O grupo por fim se reúne e temos ali a nomeação tendo por referência os cavaleiros da Távola Redonda. O propósito é estar mais coeso e preparado para um novo conflito porque Oxford ao fazer uma análise correta dos termos do Tratado de Rendição da Alemanha, o famoso Tratado de Versalhes, vê nas cláusulas humilhantes que isso jogaria a Alemanha em um novo conflito. Mais uma vez a França parece nem existir. Não seria o caso de Orlando Oxford buscar desbaratar as tentativas de surgir uma nova guerra na Europa ao invés de aguardar os eventos surgirem e aí tomar posição? Isso se de fato o espírito pacifista de sua esposa ainda arder dentro dele porque metade do filme ele reforça sua intenção de não lutar (lembro todo momento disso não é? Mas é tanto discurso que fica difícil não mencionar, desculpem-me). Cabe em suas lembranças inclusive uma crítica a violenta a ocupação inglesa na África quando ele em uniforme do Império Britânico participa de encarniçadas e brutais lutas contra nações africanas. Tente pelo menos Oxford... Não vai né?

A cena pós créditos é o ápice de um roteiro olavista que incomoda demais: O personagem Erik Jan Hanussen (Daniel Brühl) conversa com Lênin (August Diehl) sob o futuro das ações dessa famigerada "irmandade do mal". Erik induz uma união de objetivos e ações entre Lênin com ninguém mais ninguém menos que Adolf Hitler!! (David Kross), que pouco antes, em aparição rápida, o vemos no comando do submarino alemão que torpedeou o navio em que Lorde Kitchener estava embarcado, de fato Kitchener morreu quando seu navio naufragou mas ao chocar-se com uma mina alemã.  

A facilidade com que a equipe King's Man se deslocam pela Europa fica uma implicância minha a parte, afinal o continente inteiro está em Guerra... Deixa prá lá, Orlando Oxford é um nobre rico e pode disponibilizar vários recursos, não quero quebrar muito a dinâmica do filme. Mas é surpreendente conseguirem chegar a tempo inclusive em outros continentes.

Quentin Tarantino também se utiliza de devaneios históricos.

Montar um roteiro tendencioso é um perigo, não ter a profundidade dos eventos, não ter a França, tampouco a Bélgica (o verdadeiro motivo pelo qual a Inglaterra entrou na guerra). Tudo bem que não precisa dar aula, tranquilo, certo... Mas se não quer dar aula de História não a prejudique de modo tão intencional a ponto de parecer leviano. Por favor.



                                   "Dulce et decorum est pro patria mori"
                                     "É doce e nobre morrer pela pátria.