sábado, 30 de abril de 2022

Lembranças de um velho nerd místico - Resenha: Doutor Estranho nos quadrinhos e na TV

 


O estranho mago e eu

por Alexandre César 
(Revisto e atualizado à partir do texto postado originalmente em 16/10/2016)

Aquele que sempre foi um dos meus heróis favoritos
 
 

 

O look original do personagem era inspirado no ator Vincent Price (abaixo)



 Eu devia ter uns 8 ou 9 anos quando, lendo uma revista do Hulk da editora Ebal - cujo formato era padrão americano e em preto e branco - vi uma história em que o gigante verde furioso era enviado com uma sacerdotisa de um culto maligno para um reino de outra dimensão onde, para variar, enfrentava um titã forte e poderoso como ele. Após a batalha, ambos acabavam agarrados a uma estrutura alienígena onde um carinha de visual legal estava preso. A sacerdotisa, para se redimir de seus atos malévolos, trocava de lugar com o cara de visual maneiro, que usou seus poderes para levar ele e o Hulk de volta a Terra. O tal carinha tinha uma capa imponente, a la Drácula, e uma máscara que o fazia parecer careca. Tinha luvas e um traje meio super-herói, meio capa-e-espada. Achei legal e diferente o nome dele: Doutor Estranho. Também gostei que ele fosse um mago, um feiticeiro que não tivesse o visual camisolão-barba-chapéu-cônico-ou-turbante típico de qualquer mágico de gibi ou seriado da época. 

No final dos anos 60 por um breve período o personagem adotou o visual mais "heróico"


 Anos se passaram enquanto prosseguia com minha dieta regular entre gibis da Disney, Maurício de Souza, Luluzinha, Bolinha, Pimentinha, Riquinho & Cia. Ocasionalmente lia um Batman e aproveitava para pintar as histórias com lápis de cor (afinal, Adam West reinava na TV). De vez em quando lia algo da Marvel. Na maioria das vezes Homem-Aranha, Homem de Ferro, Thor, Quarteto Fantástico. Curtia demais, mas me perguntava: “-Cadê aquele mago de nome esquisito?” Foi preciso a HQs da Marvel passarem da Ebal para a Bloch, com seu terrível “formatinho” (que virara a regra do tamanho dos gibis) e sua palheta de cores bizonha, para eu finalmente esbarrar de novo com o bom doutor. Foi na revista dos Defensores, grupo no qual inclusive participava o existencialista mor da editora, o Surfista Prateado, outro dos meus favoritos. Nesta altura da minha vida já havia presenciado alguns eventos de natureza insólita.
 
O personagem (um dos pilares fundadores da Marvel) enfrentou diversos desafios e oponentes em sua carreira

 
 Eu era leitor ávido da revista Planeta, que trazia artigos instigantes sobre esoterismo e ufologia. Também frequentava os rituais da Ordem Rosacruz-AMORC, da qual meus pais eram membros e cujos princípios eu enxergava como paralelos aos preceitos dos Jedis de “Guerra nas Estrelas” (naquela época se traduzia título da franquia por aqui). Portanto, era muito legal para mim que existisse um mago que fosse um super-herói, de visual dramático, mas sem aquele aspecto teatral do Mandrake, que nunca curti muito. 


Foi nas páginas da Bloch Editores que vim a reencontrar o mago
  
Então num domingo, em 1979, lendo o caderno de TV do jornal “O Globo”, vi na página de destaques da programação da semana escrito “Doutor Estranho” e me surpreendi. Já estava rolando na Globo o seriado do Incrível Hulk, com o Bill Bixby e Lou Ferrigno (com suas incríveis calças...), e o Homem-Aranha, com Nicholas Hammond (ex-membro da família Von Trapp de “A Noviça Rebelde”), começara sua breve carreira também. E havia o impacto causado por “Superman -O Filme”, que estreara semanas antes nos cinemas. Havia uma vibe que tornava os heróis conhecidos do grande público. Aguardei ansioso o filme, mas sem exigir demais. Até porque, como sabia que era um piloto de série e provavelmente com orçamento pequeno, preferi deixar de lado toda e qualquer ideia feita sobre o doutor antes de assistir. 
 
O telefilme de 1978 com Peter Hooten e Jessica Walter

 O filme, escrito e dirigido por Philip DeGuere como a maior parte das adaptações de heróis dos gibis até então (e até alguns anos atrás...) era genérica, tomando grandes liberdades com a origem e histórico do personagem. Era estrelado pelo desconhecido Peter Hooten, tendo John Mills como Lindmer - uma versão “merlinizada” do ancião. Jessica Walter (Arrested Development) atuava como a vilã Morgan (Le Fey?), uma feiticeira a serviço de um “Mestre” - na verdade um boneco em stop motion com uma trucagem de céu demoníaco por trás. O clima era soturno e com bons efeitos óticos para os padrões de telefilmes da época. 
 
 
Stephen Strange e  Wong (Clyde Kusatsu) no Sanctum Sanctorum

Morgan (Jessica Walter) a feiticeira partidária das forças das trevas da Quarta Dimensão

 
Curti muito, pois me deu vontade de conhecer ainda mais sobre o personagem. Posso dizer que a sua missão de transmitir um personagem cativante foi bem sucedida. Tanto que, cerca de um ano depois, quando o filme foi reapresentado numa Sessão Coruja, estava eu lá firme e forte para prestigiá-lo de novo. Mais tarde, passados mais de 25 anos depois, o bom doutor estava de volta, agora numa versão maior pela Marvel Studios e com a missão de tirar o personagem do anonimato quanto ao grande público e ocupar seu lugar no panteão dos heróis Marvel, sendo a grande chance deste que é um dos primeiros personagens daquele universo ficcional, que até então havia sido subaproveitado nos últimos anos. A sorte estava lançada...


A viagem astral de Stephen pelo plano astral é emulada numa cena do filme de 2016 que foi aos cinemas


O filme e suas consequências
 
 
O filme de 2016 com Benedict Cumberbatch como Stephen Strange numa ótima composição

 
Ao final, à despeito de seus atrelamentos à "Fórmula Marvel"  Doutor Estranho (2016) de Scott Derrickson,  foi  bem tanto com a crítica quanto nas bilheterias, firmando o ótimo Benedict Cumberbatch (Ataque dos Cães) como a encarnação definitiva do bom doutor, tirando o personagem do anonimato quanto ao grande público e garantindo o seu lugar no panteão dos heróis Marvel como a solução para vários problemas nas tramas dos filmes subsequentes do estúdio.  O filme além da produção impecável com seu elegante design de produção e seus ótimos efeitos visuais (indicados ao Oscar) estabeleceu o lado místico do Universo Cinematográfico Marvel, bem como os personagens ao redor de Stephen Strange, como Wong (Benedict Wong de Vingadores: Guerra Infinita), Mordo (Chiwetel Ejiofor de 12 Anos de Escravidão), aqui numa ótima construção de personagem e futuro antagonista; Tilda Swinton (Vingadores: Ultimato) na controversa mas acertada caracterização da Anciã (o personagem originalmente era um velho oriental) que evitou estereótipos passíveis de críticas nestes tempos de cancelamento, além da bela e fofa Rachel McAdams (Sherlock Holmes) como Christine Palmer, interesse romântico do herói. Do lado dos antagonistas temos Kaecilius (Madds Mikelsen de Druk - Mais Uma Rodada) como um bom oponente, e o terrível Dormammu (dublado pelo próprio Cumberbatch), qua ainda deverá futuramente gerar novas dores de cabeça para o mago.
 
 
A "Ancã" (Tilda Swinton) e Mordo (Chiwetel Ejiofor). Asmudanças de gênero e de etnia foram bem orquestradas num bom resultado

 
Passados alguns anos desde então Strange mostrou em participações nos outros filmes do estúdio o seu valor e agora, após se estabelecer o conceito do multiverso,  estamos prestes  a acompanhar a segunda grande aventura do herói, Doutor Estranho: Multiverso da Loucura (2022) agora dirigido pelo mestre Sam Raimi (a cine série The Evil Dead e a sua aclamada trilogia do Homem-Aranha com Tobey Maguire e Kirsten Dunst) diretamente relacionada aos desdobramentos  de Homem-Aaranha: Sem Volta para Casa , que permitirá soft reboots de elementos já explorados por outros estúdios, e que deverá alicerçar de vez a sua posição como o  Mago Supremo deste rico universo ficcional.
 

Kaecilius (Madds Mikelsen) vilão originalmente secundário, que sofreu uma boa reformulação


Agora deveremos ver a consagração do personagem como uma das pedras angulares desta nova fase da Marvel.  Que o Olho de Agamoto ilumine o seu caminho...
 
"-Isso, vai girando a mão no sentido horário e se foca no CEP do destinatário, senão tu acaba caindo em Hogwarts..."

 
 

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