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George Perez e sua fantástica trajetória.

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The Batman, de Matt Reeves, recria o universo sombrio do Homem-Morcego.

Ser legal não está com nada...Ou está?

Lobo, Tubarão, Aranha, Cobra, Piranha...Que medo!!! Mas eles querem mudar isso.

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

A necessidade da alternância - Crítica - Filmes: Dois Papas (2019)

 

Dois Improváveis amigos

 

por Ronald Lima 

(Originalmente postado em 30/ 12/ 2019)


 A necessidade do diálogo e da alternância do poder


Netflix e Fernando Meireles "bateram um bolão!!!"

 
Nos confrontamos atualmente um processo histórico já definido como "crise civilizatória", marcado por um recuo da democracia e retrocesso social em vários lugares, portanto todo esforço de aproximação entre povos, países, religiões e correntes políticas deve ser aplaudido e estimulado, esse é o ponto forte do roteiro de Anthony McCarten, de A Teoria de Tudo (2014), O Destino de Uma Nação (2017) e Bohemian Rhapsody. Mas poderia ir um pouco mais fundo em diversas controvérsias pela qual a Igreja passa ultimamente, explicaria melhor as razões e motivos que causaram tamanha diferença de opiniões entre os dois personagens. Uma antipatia mútua dá lugar a um respeito relutante e termina fortalecendo a amizade. A narrativa sobre o relacionamento entre Joseph Aloisius Ratzinger, o Papa Bento XVI, interpretado por Anthony Hopkins, o terrível Hannibal Lecter de Silêncio dos Inocentes ('991) de Jonathan Demme , e seu sucessor, Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco I a cargo de Jonathan Pryce, o Alto Pardal da 5ª Temporada de Game of Thrones e só para salienta-lo em outro papel como argentino ele foi o Coronel Juan Perón de Evita (1996) de Alan Parker. Em Dois Papas (2019) da Netflix, personalidades diametralmente opostas que, independentemente dos sentimentos que você possa levar para o filme, não são pintados como bons ou maus. Os muitos questionamentos sobre o papel da Igreja hoje em dia e questões espinhosas são apenas pano de fundo, não é a intenção da direção, que esta a cargo de Fernando Meirelles de Cidade de Deus (2002). A enfase é o lado humano e os conflitos pessoais de dois senhores que passaram um pouco de tudo na vida, na vida eclesiástica inclusive e diria principalmente. Sobre essas controvérsias mencionarei mais a frente. Serão importantes.

Bento XVI (Anthony Hopkins no alto) e Jorge Mario Bergoglio (Jonathan Pryce, abaixo):
De um lado o "canibal", do outro, on"Alto Pardal"

 
 O que torna esses conflitos interessantes é que eles dependem do divino. Se você é uma pessoa que acredita em Deus, luta com a desumanidade do homem para com o homem e com o silêncio ao tentar falar com seu criador, uma situação difícil o suficiente para a maioria da humanidade, imagine então lidar com isso e com 1,2 bilhão de pessoas que depende de você. A Igreja Católica existe como uma entidade política e espiritual, e é importante para a vida de desse enorme nº de pessoas, onde isso deixa Bento e Bergoglio? O que significa liderar a Igreja Católica nos dias atuais? 

 
"Rei morto - Rei posto. Vida longa ao Rei". A sucessão de João PauloII começa a ser decidida

 
Bento é resistente a mudanças, enquanto Francisco as considera necessárias. Quando o filme começa, o ano é 2005, durante o conclave papal que elegerá Ratzinger, Ao encontrarem-se pela 1ª vez no Toilete, Joseph Ratzinger, pergunta a Bergoglio que hino ele está assobiando. "Dancing Queen" do ABBA é a resposta de Bergoglio, e dessa maneira divertida vemos a diferença grande entre os dois. O filme embala o início das votações ao som de “Dancing Queen”. Conforme os votos seguem, Francisco, então como cardeal Jorge Mario Bergoglio, da Argentina, fica em segundo lugar, para a surpresa de alguns ali e principalmente de Ratzinger. Bergoglio faz amigos onde quer que vá, parando em bares para assistir a jogos de futebol e renunciando ao uniforme do cardeal por roupas menos formais e pregando aos pobres. Ratzinger em um dos poucos momentos em que consegue falar de si mesmo admite que poderia ter se dedicado mais a vida do que aos estudos e a solidão.
 

"Eu queria ter na vida simplesmente Um lugar de mato verde Pra plantar e pra colher"


 
Basicamente todo filme é ocupado por esses dois homens idosos lutando educadamente com a teologia, e isso é algo inesperadamente divertido por contarmos com dois grandes atores muito bem caracterizados fisicamente e precisamente imersos em suas personas, os pequenos gestos de cada causam sensação, Hopkins, dominou uma risada sem alegria mas que se torna hilária ao ser confrontada a um permanente gesto de impaciência no olhar de Pryce “- meu Deus, o que que eu estou fazendo aqui?”. Essa dinâmica avança à medida que os dois homens trabalham, ou pelo menos tentam trabalhar e entender suas posições opostas e o efeito que seus caminhos escolhidos tiveram sobre sua fé.
 
 

"You can dance, You can jive. Having the time of your life. 
See that girl. Watch that scene. Digging the Dancing Queen"

 
 
E agora chegamos nas posições opostas.
"- Você tem sido um dos meus críticos mais severos e há muita competição por esse título."
“- Nunca diretamente!", protesta o cardeal.
"- Você dá abertamente sacramentos para aqueles que não estão em comunhão - para os divorciados, por exemplo."
"- Acredito que dar comunhão não é uma recompensa para os virtuosos!", rebate Bergoglio, 
"- é alimento para os famintos."
"- Ah!", como se o cardeal estivesse preso em uma armadilha. 
"- Então, o que importa é o que você acredita e não o que a igreja ensina há centenas de anos."
“- Vim chamar pecadores”, ele observa,“- a igreja ensina isso há milhares de anos”.
 
 

"- Tem resposta para tudo não é Bergolio?"
  
 
Em determinado momento o filme passa a relatar em intercalados flashbacks, a vida do jovem Jorge Bergoglio (A Netflix tem fixação por flashbacks), porém pouca informação temos sobre Joseph Ratzinger, falha grande, pois a idéia, como foi comentado, não seria mostrar o lado humano de cada um? Principalmente seus erros? O relato da vida do jovem Bergoglio, interpretado pelo ator argentino Juan Minujín, fica entre a renúncia ao amor de sua vida e trabalho secular e aos primeiros anos de sua vida clerical, Bergoglio durante a ditadura militar Argentina procurou ajudar aos seus mas infelizmente de modo vacilante, tentando simplesmente afasta-los de tudo que poderia ser dado como suspeito, a dificuldade que Bergoglio jovem não percebia é que TUDO poderia ser suspeito naquela época. Há cenas fortes de tortura e execuções, para que saibamos que esse ocorrido na Argentina o foi em toda América do Sul a favor de um alinhamento pró norte americano, alinhamento que não nos trouxe nenhum benefício, não nos tornamos potência militar e tampouco econômica, a não ser aprofundar mais e mais nossas desigualdades sociais e políticas, a intenção norte americana era manter submissão. Bergoglio se culpa e reconhece sua falha. Bento XVI revela em tom de cumplicidade que costuma fazer "concessões" ao longo da vida. Bergoglio o corrige e se posiciona: "- Não! Eu mudei!", essa frase é consistente com o comportamento que iria assumir depois, comportamento esse que o levou ao Papado. Mas... E o que sabemos sobre Ratzinger no filme? Apenas uma leve insinuação em ter pertencido a Juventude Hitlerista, em uma cena ele não toca exatamente “Lili Marlene” ao piano mas ao relatar ser uma música dos anos 30 passa a deixa, mas é uma informação só para iniciados, fica muito de leve ( “Lili Marlene” foi uma canção usada pelas tropas alemãs durante a 2ª Guerra, e sob efeito “macunaíma” de assimilação cultural, se tornou famosa entre as tropas aliadas também)...


Eduardo Massera, Almirante da Marinha, é o que está presente no roteiro
 e intimida Bergoglio. Jorge Rafael Videla, General do Exército e Orlando
 Agosti, Brigadeiro da Aeronáutica fizeram parte da Junta militar que 
tomou o poder na Argentina.

 
 
Voltando a Bento XVI, sim, ele pertenceu a Juventude Hitlerista, porém o regime nazista obrigou muitos a ingressarem nas instituições do partido, e aos mais religiosos principalmente, para tentar expurgar suas “fraquezas” judaico/cristãs. Essa ausência se deveria ao fato de Bento XVI ter sido muito impopular? Mesmo o filme mostrando que teve algum apoio? É bonita e emocionante a cena próxima ao final em que ele sai ao povo em plena Capela Sistina sem segurança sem nada, estimulado pela conversa que teve com Bergoglio. A saber: - A Capela Sistina foi um capricho a parte da produção pois foi reconstituída em estúdio com direito a efeitos 3D e fundo verde e reprodução de algumas pinturas. Bento XVI se tornou inclusive meme recorrente por se parecer demais com o cruel Imperador Palpatine de Star Wars. Acreditaram que muitos ainda estariam a par de suas muitas falhas e omissões durante o Papado? Não creio... Tampouco tenho resposta para tão poucas referências sobre sua vida pregressa, talvez para incentivar o ponto principal do roteiro, a busca por redenção. Para muitos críticos essa falta é grave e imperdoável no filme. De fato é grave, mas como estamos sob o tema da conciliação.... Continuemos.
 
 

"Vor der Kaserne... Lili Marleen, Wie einst, Lili Marleen". Ele não a toca exatamente, mas...

 
 
. O início desse texto relata a dificuldade que temos hoje em conviver com diferentes opiniões sejam de que ordem for, como o filme tem como pano de fundo a Religião Cristã e essa o segmento Católico Romano, é necessário saber que parte dessa responsabilidade, origem e causa de divisões, é justamente a Igreja Católica, outras denominações cristãs também, é claro. Muito reveladora a reclamação de medo e repulsa que Bento XVI faz ao tentar culpar o “relativismo” por todas as mazelas que a Igreja passou lidar, culpar o “relativismo” . Na cabeça de conservadores “relativismo” é sinônimo de “fazer o que quiser” pois tudo sendo relativo, depende de cada ponto de vista, não há mais uma certeza. É assunto corriqueiro esse termo em igrejas protestantes também, e principalmente nas tradicionais, atinge um pouco mais leve as pentecostais e as neo-pentecostais nem um pouco, essa é movida apenas por preconceito e medo. A religião atualmente briga com a realidade e isso causa mais ódio que soluções. 
 
 

Juan Minujín interpreta o jovem Jorge Bergoglio.

 
 
Ratzinger fez parte de um grupo muito fechado e reacionário dentro da Igreja Católica. Muito antes de subir como Papa perseguiu lideranças consideradas “marxistas”. Numa época em que o Vaticano se alinhava com a política externa de Ronald Reagan, a diplomacia de João Paulo II na América Latina consistia em enfraquecer lideranças como a de dom Helder Câmara (1909-1999) e dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016), empenhados em denunciar o regime militar no Brasil e em outros países do Continente e defender causas sociais. João Paulo II acreditava estar cumprindo a famosa 3ª profecia de Maria, profecia dada as 3 pequenas crianças pastorzinhas em Fátima, cidade de Portugal. Ratzinger fez parte da Cúria Romana durante décadas. Ele obrigou Frei Leonardo Boff a fazer “voto de silêncio”. Não aceitam que a esquerda reavaliou-se para incluir religião em seu processo. Também perseguiu aos outros dois acima mencionados. E isso para citar algo próximo a nós.
 
 

Os verdadeiros Bergoglio e Ratzinger

 
 
Esse é um relato rápido da vida de Ratzinger, afinal em Dois Papas revelou-se a fundo a vida do simpático Bergoglio, e nem um pouco a vida de Joseph Ratzinger, essas informações acima lhe ajudarão a situar-se melhor no enredo do filme, acredite... E nem foram aqui mencionados os escândalos sobre pedofilia que vieram a tona durante seu Papado e toda confusão sobre as finanças do Vaticano, essa última está mais ou menos presente no filme. É o pano de fundo dos noticiários. 
 
 

Não tem perdão. Católico bom é católico inculto.

 
 
Há um momento em que ambos revelam seus medos.... E aí ficamos a par das pretensões de Bento XVI, sim, ele errou, mas pretende se redimir, é incrível, mas parte dele a iniciativa de conciliação, reconhece que a Igreja necessita de mudanças, mesmo que essas sejam contrárias a seu modo de ver e viver. O futuro Papa Francisco I de fato está em uma posição “- Meu Deus, o que que eu estou fazendo aqui?”. Hopkins e Pryce demonstram muito tato ao encaixar um desconectado a entrar e a viver em mundo mais humano, reconhecer as músicas "Yellow Submarine" e "Eleanor Rigby" e dançar Tango. Qual o preço do perdão? A resposta é fácil, difícil é conceder e aceitar. O perdão quando de fato manifesto não faz aquele que se sente culpado recuar e sim além de reconhecer a falha também se dispor a caminhar na direção contrária ao caminho errado que seguia.
 
 
 
"All the lonely people Where do they all belong?" - "Todas as pessoas solitárias De onde todas elas são?" - Letra de Eleanor Rigby


 
 
Emblemático o final da Copa do Mundo de 2014 ter sido entre Alemanha e Argentina e realizada no Brasil, Maracanã. Poucos tempo depois um golpe cairia sobre nós, alimentado por esses medos plantados lá trás, desde os anos 60, onde temia-se hippies e comunistas. Hoje Francisco I sofre acusações tolas vindas dos E.U.A. Não exatamente preocupados com moral e bons costumes, isso é isca para enganar e arregimentar, os ataque é por temerem o discurso dele contra essa exploração do homem pelo homem em nome de um sistema financeiro excludente e escravizador. Esse filme vem em boa hora. Apesar de algumas faltas em relação a biografia pregressa de Ratzinger. A cena com os dois torcendo e bebendo cerveja é ótima. Que passemos a viver assim com os nossos diferentes. Há a inserção do encontro real entre Bergoglio e Ratzinger durante cena da partida de futebol.
 

"Aah, look at all the lonely people" - "Aah, olhe todas
 essas pessoas solitárias" - Letra de Eleanor Rigby

 

OBS: O Bispo de San Sebastián (Espanha), Dom José Ignacio Munilla, criticou duramente e descreveu como "muito injusta" a representação feita pelo filme da Netflix  tanto de Bento XVI como do Papa Francisco.

 

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

A Arte de Saber ser Fofo - A Dama e o Vagabundo (2019)

 



A graça de um "Au-au" ou, de mais de um

por Alexandre César


Chega o melhor remake de uma animação da Disney

 

 E surge, sem alarde, a melhor adaptação de uma animação da Disney para o live-action...

 

    Em 1955 Walt Disney nos presenteou com a fábula romântica de Lady, uma cocker spaniel de família que encontra em Vagabundo, um cão de rua de raça não muito definida, a sua outra metade da laranja e na melhor tradição de Lassie e Rin-Tin-Tin deu o protagonismo tão merecido que o melhor amigo do homem merece, apesar da tão pouca lealdade que este costuma receber em retribuição. Na época o desenho dirigido por Clyde Geronimi, Wilfred Jackson e Hamilton Luske de forma sutil refletiu choque de classes sociais, jogou lenha na fogueira da rivalidade cães e gatos, nos infames Si e Ão pois na época existia o "perigo amarelo" (ou "vermelho") e em oposição ao simpático Mickey, tornou um rato o flagelo da humanidade (que deve ter tirado o sono de muitas gestantes e mães de primeira viagem na época)e ainda no final nos brindou com o surgimento do simpático Banzé, que brilharia nas histórias em quadrinhos. 


Vagabundo (voz de Justin Theroux) é interpretado por Monte, que tal qual o personagem e vários dos cães do filme, era um cão de rua que foi resgatado...


Lady (voz de Tessa Thompson) é interpretado por Rose, uma simpática Cocker Spaniel, com todo o jeito de "cachorra de madame"...


Passados 64 anos o estúdio do rato se tornou um império colossal megalômano, estendendo tentáculos corporativos em várias direções procurando a hegemonia no setor do entretenimento, parecendo não ser mais capaz de apostar em histórias simples e cativantes em sua simplicidade, que por isso mesmo se tornaram imortais... ou não?

 

A cidade, nunca nomeada, que mescla características das cidades da Nova Inglaterra e de Nova Orleans na primeira década do séc. XX é um trunfo da direção de arte... 

Sendo lançado diretamente no Disney+ , o sistema de streaming da Disney, por causa da pandemia do coronavírus, e dirgido por Charlie Bean (Lego Ninjago: O Filme) A Dama e o Vagabundo (2019) segue a estratégia do estúdio de fazer versões live action de seus clássicos, mas ao contrário de A Bela e a Fera, O Rei Leão, e Alladim , aqui optou-se por um tom menos grandioso e grandiloquente e, por seu tom despretensioso acabou acertando em cheio no alvo por assumir ser uma história infantil, mas suficientemente cativante para ganhar os adultos que se sentarem ao lado dos pequenos para matarem a saudade dos simpáticos cachorros, cativando automaticamente maior boa parte da audiência, criando rapidamente uma conexão com o espectador.

 

Como no desenho original, Darling (Kiersey Clemons) Jim (Thomas Mann) o casal dono de Lady tem pouca profundidade, sendo o foco nos cães...

Ancorado no carisma da dupla canina Rose (Lady) e Monte (Vagabundo, sendo ele mesmo um dos vários cachorros resgatados usados na produção) o filme retoma o espírito da animação original estruturando mais a história (cerca de 30 minutos a mais na duração total do filme), oferecendo boas melhorias em relação à obra original, como uma pequena mostra sobre o passado do Vagabundo, justificando na narrativa a sua maneira de ver a vida...

 


O roteiro de Andrew Bujalski (Resultados) e Kari Granlund (Troubleshooters) tem o mérito de ser assumidamente uma história infantil, funcionando com graça no apelo único na fofura de sua trama e personagens. Lady (voz de Tessa Thompson de Westworld) cadela de raça vida segura confortável, e tranquila conhece Vagabundo (voz de Justin Theroux de Coringa) cão de rua cuja vida de dificuldades, o obriga à todo dia precisar se valer de sua malandragem para conseguir comida (espelhando aqui as diferenças entre classes sociais), mas a vida de Lady entra em crise com a chegada de um bebê na sua família, o casal Darling (Kiersey Clemons de O Mistério da Ilha) e Jim (Thomas Mann de Kong: A Ilha da Caveira) fugindo de casa quando está sob os cuidados da antipática Tia Sarah (Yvette Nicole Brown de Cara Gente Branca), se perdendo nas ruas. Lá, encontra o Vagabundo, e juntos, a dupla se aproxima, e ela (ao lado do crush vira-lata,) descobre a magia da vida livre, mantendo a história original, que transmite bem a magia da história do casal, num singelo romance que ainda funciona.

 

Tia Sarah (Yvette Nicole Brown) a antipática "amante de gatos"...

A direção de Bean tem inclusões certeiras de pequenos elementos que deixam a trama mais fluída e que mantém um bom ritmo, auxiliado pela edição de Melissa Bretherton (A Espiã Que Sabia de Menos) que deixa a narrativa enxuta sem floreios desnecessários mas aproveita bem os momentos singelos como na icônica cena do espaguete com almôndegas (que, obviamente, está presente) quando Tony (F. Murray Abraham, Oscar por Amadeus), o único humano realmente cativante, junto com Joe (Arturo Castro de Silicon Valley) cantam a clássica “Bella Notte”, numa sequência exalando romance, magia e nostalgia,valorizada pela trilha musical de Joseph Trapanese (O Rei do Show) que toca o coração do público, que vai querer cantar junto.

 

Lady foge da Tia Sarah e se perde nas ruas numa perigosa aventura...

Além dos protagonistas, destacam-se os quatro ótimos coadjuvantes: Trusty (voz de Sam Elliott de O Herói), Jock (voz de Ashley Jensen de Trust Me), Bull (voz de Benedict Wong de Vingadores: Guerra Infinita) e Peg (voz de Janelle Monaé de Estrelas Além do Tempo). Monaé ainda, ajudou a compor a ótima adição de “What a Shame”, a nova música dos gatos siameses (que agora não tem uma caracterização estereotipada de chineses), sendo a cantora ainda responsável por reviver “He’s a Tramp”, que se provou perfeita para sua voz, numa das melhores cenas do longa, evocando um tom de blues. 


Vagabundo socorre Lady, com a ajuda de um "amigo" (na animação era um castor, e não uma estátua)...

 Os valores de produção embora tenham um orçamento menor do que as adaptações feitas para o cinema, são mais do que competentes, com o desenho de produção de John Myhre (Oscar por Memórias de uma Gueixa) e a direção de arte de Elliott Glick (Rampage: Destruição Total) criando uma realidade imaginária de uma cidade pacata (nunca nomeada) que remete à Nova Orleans, e os figurinos de Colleen Atwood (Oscar por Alice no País das Maravilhas) e Timothy A. Wonsik (Tomb Raider: A Origem) compõem e caracterizam seus personagens com um pé na realidade de época e outro na recriação de tipos, contribuindo para que certas mudanças funcionem, pois o elenco mais diverso e inclusivo toma certas liberdades poéticas (uma mulher negra casada com um homem branco no início do século XX) que soariam falsas num contexto mais realista, levando em conta o racismo da época, mas neste filme de atmosfera imaginária e utópica não compromete a apreciação do filme, visualmente belo e delicado. 

 

O homem da carrocinha (Adrian Martinez)é o "vilão" da vez...

Agora se os astros de quatro patas são cativantes, já os humanos, funcionam melhor quando menos mostrados (como o era na animação), pois a dupla Darling e Jim são unidimensionais, não precisando de mais tempo de tela, e o homem da carrocinha (Adrian Martinez de Sexy por Acidente) é o “vilão” com uma vendeta pessoal contra o Vagabundo, o antagonista tradicional sem profundidade maior do que o seu ódio por cachorros, cosa que não incomoda pois o filme sabe se manter com um frescor juvenil. Temos ainda personagens rasos mas divertidos como o médico parteiro (Ken Jeong da cinesérie Se Beber, Não Case!) e da dona de Jock (Kate Kneeland de Fome de Poder) que pinta quadros com a sua pet como estrela, parodiando clássicos da arte como a Mona Lisa e a Moça com brinco de Pérola.

 

Tony (F.Murray Abraham) e Joe (Arturo Castro) os humanos com maior profundidade...

 Apesar de muito bem treinados, houveram sequências em que os cães precisaram ser totalmente animados, pois seria muito perigoso para os bichos, entrando aí os efeitos visuais das empresas BOT VFX, Day For Nite, Framestore, Weta Digital, Moving Picture Company (MPC) que em sintonia com a fotografia de Enrique Chdiak (Bumblebee) além de dar vida e falas aos cães, ajudaram a compor a paisagem, como na bela tomada inicial, fazendo a transição entre a animação e o live-action, colocando o espectador numa romântica e etérea cidade mezzo Nova Inglaterra, mezzo Nova Orleans do início do século XX, dando o tom fantasioso e irreal apropriado para esta fábula de amor entre cães falantes.


A icônica cena que todos esperavam...
 

Ao final vemos que A Dama e o Vagabundo assume ser despretensioso, tendo surgido sem grandes alardes (o que no contexto da Disney surpreende) e que por se assumir como obra infantil, de raiz, carrega uma vitalidade refrescante e satisfatória. Tal qual o remake de O Rei Leão, não precisava existir, mas é superior à releitura da saga de Simba por aparar umas poucas arestas e manter-se singelo, gracioso e fofo... muito fofo.

 

Família feliz: Jim, Darling, o bêbê e Lady ( e Vagabundo, que não está na foto) forjam laços duradouros...

 

 

terça-feira, 10 de novembro de 2020

Página cósmica virada... - Crítica - Filmes: X-Men: Fênix Negra (2019)

  

 

É hora de dar adeus, e obrigado...

 

por Alexandre César  

(Postado originalmente em 08/ 06/ 2019)


E o universo mutante deixa a Fox e retorna à Marvel

 


A encarnação original da Fênix, nos traços de John Byrne...
 
 
Tendo iniciado a sua trajetória na tela grande no já longínquo ano de 2000 sob a batuta de Bryan Singer, os X-Men percorreram um longo e bem sucedido caminho de adaptações genéricas dos famosos mutantes da Marvel, com resultados variados mas sempre assegurando um bom retorno financeiro a 20th Century Fox, que havia arrematado a preço de banana os direitos de filmagem dos personagens mutantes da Casa das Ideias no final dos anos 1990. Com o surgimento da Marvel Studios e suas bem sucedidas fases, a comparação com as suas cineséries foi inevitável, e quando a primeira foi adquirida pela gigante Walt Disney Company, que depois a compraria também, estava decretado o fim desse ciclo, pois agora era inevitável a volta deste núcleo de personagens para o seu lugar de origem, faltando apenas fazer o fechamento do arco narrativo anterior.  
 
 


Prof. Charles Xavier (James McAvoy) no "Cérebro". O bom professor se revela não tão perfeito...


Escrito e dirigido por Simon Kinberg (roteirista de X-Men: Apocalipse de 2016 e X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido de 2014) X-Men: Fênix Negra (2019) conclui o arco iniciado com X-Men: Primeira Classe (2011) de Matthew Vaughn (que ambientava cada aventura numa década distinta, acrescentando uma dimensão de filme de época às aventuras dos heróis mutantes) sofreu atrasos, refilmagens, e paradas devido à venda do estúdio para a Disney e se não é o final ideal, o filme é o que tem mais cara de episódio de série, e funciona como o encerramento possível para esta encarnação, fechando as portas para que possa surgir a nova formatação via Universo Cinematográfico Marvel, quando os heróis poderão aparecer no juntamente com Deadpool e Quarteto Fantástico.
 

"Audaciosamente indo, onde nenhum X-Men jamais esteve..."

 
Ambientado em 1992, Charles Xavier (James McAvoy, revelando uma nova faceta do personagem) está lidando com o fato dos mutantes serem considerados heróis nacionais. Com o orgulhoso com os sorrisos, apertos de mão e homenagens por parte dos humanos que agora lhes são gratos (uma grande novidade para ele), envia sua equipe para perigosas missões, inclinado a fazer de tudo para preservar a imagem pública de seus alunos (como ele diz, “ - Os X-Men estão sempre 'a um dia ruim' de voltarem a ser inimigos”)...
 


A missão no espaço. Do original dos quadrinhos, só se manteve o ônibus espacial, Jean Grey, a entidade alienígena, e o espaço...
 
 
Mas a primeira tarefa dos X-Men no espaço resgatando o ônibus espacial Endeavour esbarra numa “explosão solar”, na verdade uma entidade cósmica que se funde a Jean Grey (Sophie Turner de Game of Thrones mostrando sutilezas na criação da personagem) que enfrentará uma nova provação, numa espécie de releitura do mito de Ícaro, pois esta entidade lhe acende uma gana malévola e faminta por poder. Pois ao adquirir corporalidade e tomar contato com os sentidos, e a gama de sensações advindas deles, o resultado dessa overdose sensorial é caótica.  
 

Versões: A Fênix de 2006 (Famke Janssen), uma mulher feita, e a de 2019 (Sophie Turner),, uma jovem descobrindo as si mesma

Se o filme faz uma reflexão interessante sobre o papel de Xavier como líder dos X-Men, mostrando-se um mentor vaidoso, controlador e com fome de relações públicas, sem mencionar um grande enganador, coisas de que Mística (Jennifer Lawrence, se despedindo do papel) o acusa, colocando seus motivos em xeque, por outro lado não deixa de ser verdadeiro o que ele diz em sua própria defesa: Ele está desesperado para proteger o status dos X-Men, para não deixá-los ser estigmatizados, mais uma vez, pelo mundo em geral, o que o faz demorar a enxergar que há algo de errado com sua maneira de usar de sua posição e das habilidades de seus pupilos. 
 
 
Heróis fora de órbita: Mística (Jennifer Lawrence) e Fera  (Nicholas Hout) lideram Mercúrio (Evan Peters), Tempestade e Cia. em sua primeira missão no espaço
 
 
Na outra ponta da comunidade mutante, Erik Lehnsherr, o Magneto (Michael Fassbender, sempre dominando o personagem) agora tem a sua comunidade numa pequena ilha ribeirinha (a futura Genosha?) tendo finalmente compreendido que a violência e um sem número de mortes sem sentido não o levarão a lugar nenhum. Os atos de Jean Grey/ Fênix o levarão à velha postura de líder vingativo na primeira metade, batendo de frente com Xavier e Cia. (como sempre) até ver que devem trabalhar juntos para solucionar o problema e superar o inimigo comum (como sempre...).
 
 
Erik Lehnsherr, o Magneto (Michael Fassbender) em sua ilha ribeirinha (Genosha?)inicialmente auxilia Jean Grey
 
 
Curiosamente, a história da Fênix Negra já havia sido contada em X-Men: O Confronto Final (2006), de Brett Ratner, escrito pelo mesmo Kinberg. Mas tal qual no anterior, a saga cósmica emblemática de Chris Claremont e John Byrne foi completamente remodelada, deixando de lado o clima mais cósmico para voltar à Terra e englobar melhor os personagens... Numa espécie de reboot, sendo uma adaptação até que funciona bem, mantendo-se surpreendentemente fiel no miolo do conceito (só o miolo) contando a história da Fênix, deixando-a como a trama central e não como uma subtrama (como no filme de 2006). Assim, Jean/Fênix é a personagem central, e o filme inteiro é sobre ela, e seus tramas, cabendo encontrar por si mesma a resposta de qual caminho tomar e o que fazer com seus novos poderes. 
 

Jean Grey e a alienígena Vuk (Jessica Chastain), uma vilã genérica...
 
 
Agora, com relação à HQ, que lembremos é uma história cósmica, e infelizmente ela acontece prioritariamente na Terra embora tenha um lado relativamente forte de ficção científica, incluindo uma rápida viagem ao espaço e a primeira aparição de alienígenas na cinesérie, os N´Baris, uma espécie transmorfa (nas HQs, inimiga dos Skrulls...) que é usada porque precisavam usar um vilão que unisse X-men e Magneto contra alguém, mas a vilã Vuk, a líder alienígena, apesar do esforço da ótima Jesssica Chastain (que tira leite de pedra mostrando grande afinco) no fundo é uma vilã esquemática cujo visual emula a Rainha Branca do Clube do Inferno já mostrada em X-Men: Primeira Classe. E na equipe de Magneto vemos mutantes genéricos, que na realidade tem visual de alguns personagens, e aparência de outros, soando estranho já que poderiam aproveitar a pluralidade que vemos na escola de Xavier. Uma pena. 
 
 
Momento fan service: A mutante cantora de discoteca Alison Blaire, a Cristal (Halston Sage)
 
 
Para não dizer que não tem nenhum herói clássico novo, há uma pequena cena onde podemos ver Alison Blaire, a Cristal (Halston Sage de The Orville), a mutante mais estonteante da Marvel, aparece em uma cena usando o traje clássico, com direito a maquiagem e calça pantalona, cantando e usando seus poderes de transformar sons em luz (só faltaram os patins) exibindo seus poderes, mas é uma participação do tipo “piscou, perdeu”... 
 

O combate no lar de Jean lembra o do filme de 2006.


Do resto da equipe, podemos destacar Hank McCoy, o Fera (Nicholas Hoult de Tolkien) que também dá duro para tornar crível o seu personagem, tal qual Ororo Munroe/ a Tempestade (Alexandra Shipp, tendo bons momentos), Kurt Wagner/ o Noturno (Kodi Smit-McPhee, abaixo de seu potencial), Mercúrio (Evan Peters, subutilizado) e Scott Summers/ Cíclope (Tye Sheridan, de Jogador Nº1) que se aqui tem uma química baixa com Turner enquanto casal, temos uma curiosa inversão de papéis, pois ele assume o papel de “donzelo em perigo” enquanto a Fênix é a dominante da relação, mas sejamos sinceros: Até Dwayne Johnson (The Rock) fazendo casal com uma mulher com aquele nível de poder acabaria na posição de indefeso em comparação... Aliás em certa altura se questiona porque não mudam o nome da equipe para X-Women, uma vez que em boa parte das situações, são as mulheres que salvam o dia...
 
 
Fera, Xavier e Ciclope (Tye Sheridan), o "macho-em-perigo"...
 
 
Dos valores de produção, temos o design de produção (Claude Paré), o figurino (Daniel Orlandi), a maquiagem e os efeitos visuais são competentes, mas sem chamarem muito a atenção para si, chegando até a um tom de sobriedade, podemos destacar a bela fotografia de Mauro Fiore (Avatar) e a música de Hans Zimmer (Trilogia Batman de Christopher Nolan) que funciona mas não tem nenhum tema memorável. 
 

Magneto (ao centro) Tempestade (Alexandra Shipp), Fera (Nicholas Hout), Noturno (Kodi-Smit McPhee) e dois mtantes "genéricos"
 
 
Ao final, vemos que se X-Men: Fênix Negra decepciona na proposta de nos entregar algo grandioso, pelo menos fecha de forma satisfatória o arco dos filhos do átomo sob o teto da Fox, sendo uma boa aventura genérica que não faz feio, desde que você não espere que seja como um dos filmes dos Vingadores. Agora só nos resta esperar a próxima encarnação e torçamos que agora inseridos no Universo Cinematográfico Marvel, os mutantes ressurjam das próprias cinzas de forma mais vistosa do que na versão anterior... tal qual uma Fênix!!!
 

Mercúrio: "Vou conseguir ter mais uma cena maneira! Vou conseguir! Vou... Raios!!!"

 

Até lá, "Morrer, dormir... e quem sabe sonhar..."