O Assombroso Multiverso!!!

Dr. Estranho de Sam Raimi traz o terror ao UCM.

As Muitas Faces da Lua

Spector, Grant, Cavaleiro da Lua, as múltiplas personalidades do avatar de Konshu.

Adeus, Mestre.

George Perez e sua fantástica trajetória.

Eu sou as sombras.

The Batman, de Matt Reeves, recria o universo sombrio do Homem-Morcego.

Ser legal não está com nada...Ou está?

Lobo, Tubarão, Aranha, Cobra, Piranha...Que medo!!! Mas eles querem mudar isso.

sábado, 18 de abril de 2020

De chorar... - Crítica - Filmes: A Maldição da Chorona (2019)

 

"Mais do Mesmo" só...


por Ronald Lima 
 (Originalmente postado em 18 / 04 / 2019)


O universo compartilhado de James Wan pedia mais cuidado

O cartaz promete... só.


“La Llorona. A mulher chorona. Uma aparição horripilante, existindo entre o Céu e o Inferno, presa em um terrível destino selado por seus próprios atos, pois quando viva, ela afogou seus filhos com uma terrível raiva e jogou-se no rio atrás deles enquanto chorava de dor. Agora as lágrimas dela se tornaram eternas e letais, e aqueles que a ouvem chamando na noite, estão condenados à morte. A menção de seu nome alcançou o terror por gerações... La Llorona se arrasta nas sombras e desesperada ataca as crianças, para substituir as dela. Com o passar dos séculos, seu desejo tornou-se mais voraz ... e seus métodos mais aterrorizantes. Cuidado com o seu lamento arrepiante... pois ela vai atraí-lo para a escuridão. Porque não há paz para sua angústia. Não há piedade para sua a alma e não há como escapar da maldição de La Llorona...”
 
A "família-alvo": O menino Chris (Roman Christou), a menina Sam (Jaynee-Lynne Kinchen) e a mãe Anna (Linda Cardellini).

 
O folclore e a superstição são elementos mais do que conhecidos dentro do cinema de horror. Filmes como  Adoradores do Diabo de John Schlesinger (1987) e A Maldição dos Mortos-Vivos de Wes Craven (1986), ou a obra-prima sul-coreana  O Lamento de Hong-jin Na (2016), são alguns dentre tantos que abordaram esse nicho, sendo agora, a vez do México apresentar para o grande público um de seus mitos sobrenaturais, ainda que este A Maldição da Chorona (The Curse of Lan Llorona, EUA, 2019), seja uma produção americana. Embora tenha um título idêntico ao filme de 1963 de Rafael Baledón La Maldición de la Llorona as obras têm argumentos, estilos e valores distintos (bota distintos nisso)... 
 
 
Patrícia (Patrícia Velasquez): "- Vocês vão comer o pão que Imothep amassou!!!"
 
 
Em seu filme de estreia, o diretor Michael Chaves prova ser um aplicado discípulo de James Wan, incluindo sequências eficazes que fazem bom uso da escuridão e espaços internos, havendo até uma breve referência ao clássico Evil Dead (1983) de Sam Raimi, onde a câmera passeia simulando o ponto de vista de um espírito prestes a invadir um local pela porta da frente. Mas, esta nova produção derivada do universo da franquia Invocação do Mal ( 2013) de James Wan, sofre com um decepcionante roteiro anêmico, repleto de sustos 100% PREVISÍVEIS, fruto da indecisão dos roteiristas Mikki Daughtry e Tobias Iaconis, sobre qual seria realmente seu público-alvo, se aquele que só consome o “mais do mesmo” ou, aquele que busca um algo mais em termos de história e narrativa, pois o roteiro só convence realmente aos iniciantes no gênero, abordando o horror como se somente iniciantes fossem assistir ao filme o que estupidamente não é o caso já que faz parte de um conceito de criaturas do “Universo” Invocação do Mal e assim a turma que curte irá se decepcionar, o texto procura não correr riscos e abusando da zona de conforto, a Warner deve realmente acreditar de que o terror estilo “jump scare” é uma mina de ouro (e assim o mantém) criou um público alvo que é fiel e engajado (o que garante ótimos índices de bilheteria) mas não gera pressão para apresentar algo de qualidade. 
 
 
Logo a "Chorona" (Marisol Ramirez) dá as caras, e os "sustos"...
 
 
O filme nos apresenta a Anna (a bela Linda Cardellini, a Selma de Scoby-Doo) viúva de um policial (muito católico) assassinado no cumprimento do dever e mãe de duas crianças, Chris (Roman Christou) e Sam (Jaynee-Lynne Kinchen). Anna é uma investigadora do serviço tutelar da cidade, e seu trabalho a leva até a casa de Patricia (Patricia Velasquez, da cinesérie A Múmia com Brendan Fraser), cujos filhos não aparecem na escola já há alguns dias. Após vasculhar a casa, Anna os encontra trancados num armário com um selo protetor pintado na porta, e como já deu para perceber, Patricia está tentando proteger seus filhos da Chorona (Marisol Ramirez) do título, uma presença sobrenatural vestida de branco que há três séculos rouba crianças na esperança de substituir suas próprias, as quais ela afogou num ataque de ciúmes. Pouco tempo depois de sua visita à casa de Patricia, Anna descobre que seus próprios filhos agora estão correndo perigo. A pergunta que não quer falar, é quem raios partam conjurou tal entidade ao longo dos anos, e porquê ela, que afogou os filhos, vestida de noiva? Parente da Médea da mitologia grega? Um plot para uma sequência?...
 
 
Massagem capilar...

 
 
A imagética em torno do fantasma é a tradicional, explorada nos últimos 30 anos no gênero, sem grandes novidades, desperdiçando a discussão cultural sobre a Chorona, a história do século XVII do folclore mexicano com o péssimo aproveitamento do curandeiro exorcista que parece ser especialista em maldições (Raymond Cruz de Breaking Bad e Better Call Saul), ele é basicamente um alívio cômico, confesso até que me fez rir, e serve apenas para que a protagonista tenha chance de sobreviver, pois não pensa por si só (Cardellini não segura o filme sozinha e as crianças são caricatas...). Bem diferentes do casal Ed e Lorraine Warren. A trilha sonora de Joseph Bishara procura ter papel fundamental para construir a atmosfera de tensão, mas isso se perde após a apresentação prematura da personagem central do filme, quando se deixa de lado a construção de personagens dos diálogos, se apoiando nos típicos sustos baseados na composição sonora. 
 
 
O curandeiro (Raymond Cruz) usa de suas habilidades místicas e de sua posição de alívio cômico...
 
 
A fotografia de Michael Burgess, o design de produção de Melanie Jones e os figurinos de Megan Spatz se esforçam para convencer que a história é realmente ambientada na Los Angeles de 1973, mas o ritmo e a narrativa e o ambiente não faz parecer que o filme se passa realmente nesta época, com exceção da falta de celulares e da presença das antigas tevês de tubo, além dos carros bebedores de gasolina... A história se passa nessa nessa época tão somente para linkar a outros personagens da franquia. Há alguns bons momentos, como quando a Chorona surge atrás da pequenina Sam e começa a lavar seus cabelos, ou antes disso quando ela ataca os filhos da Patricia (ou a cena com a mesma Sam e um guarda-chuva, a que eu mais gostei). Entretanto, o plot transcorre de forma convencional e insossa. A água é usada, tal qual em muitos filmes japoneses do gênero, como um veículo ou ambiente onde a entidade se manifesta e permite ir de um lugar a outro, similar ao recente A Sereia Lago dos Mortos (2018), Chorona também cria algumas lufadas de ar e entidades + espelhos é bem clássico. As performances estão na média (apesar do roteiro) mas nada arrepiante como a figura da freira de Invocação do Mal 2 (2016), por exemplo. A entrada dessa história no universo de The Conjuring é um tanto... forçada, ao introduzir o Padre Perez (Tony Amendola) já conhecido por nós em Annabelle (2014) colocando o filme como mero spin-off... Ah! Verdade o marido de Anna é católico, tá “explicado” por que ela recorre a Igreja mesmo sendo descrente. 
 
 
"-Sou um curandeiro, não o Doutor Estranho!!!"

 
 
A Chorona mais parece uma versão live-action da Noiva-Cadáver, ou seja, o medo da sua presença passa longe dessa história, construindo praticamente todos os sustos à base de jump scares, fazendo o modelo perfeito de terror genérico e estúpido, com diálogos explicativos ao excesso e personagens bidimensionais e sem encanto, que cometem burradas e levam um susto a cada 5 minutos (e quando não há ação, a preparação para o susto é longa demais e aí está a quebra do desejado susto) ficando entediante e óbvia depois de alguns minutos, diluindo o impacto de sua presença ao longo do filme, e enfraquecendo seus momentos finais, chegando ao tosco, perdendo de verdade uma boa solução para um final melhor à personagem em uma cena momentos antes (se fosse “ali” ao menos o final ficaria legal). Não esperem cenas pós créditos... mas há um leve gancho para uma provável sequência, talvez origem e motivação da entidade, a questão será que depois desse terão que montar algo muito superior com ótima divulgação para convencer o público.
 
 
"- Crianças, Vamos brincar de pega-pega pela nonagésima vez???"

 
 
Assim como o recente A Freira (2018), é decepcionante ver que o promissor “Wanverse” (universo compartilhado de filmes de terror criado por James Wan) vai de mal a pior. Parece que a falta de criatividade e inspiração se estabeleceu dentro da franquia, replicando fórmulas já batidas, sem inovar ou dar qualquer elemento significativo que mantenha os filmes relevantes. Sendo assim, A Maldição da Chorona tinha tudo para ser um bom pequeno e promissor filme de horror sobre um interessante mito sobrenatural, mas nem a produção de Wan é capaz de salvar uma produção tão fraca e preguiçosa, especialmente no que diz respeito à direção e narrativa, que cai na maldição de ser genérico e esquecível, desperdiçando qualquer chance de inovar o gênero, e se não vem para colocar o último prego no caixão, vem pelo menos, para evidenciar que a qualidade não é mais um diferencial, sendo neste caso, o retorno da bilheteria o que determinará se alguma mudança será necessária na franquia de terror da Warner.
 
 
As verdinhas sempre dão a última palavra. Um horror... 
 
 
Padre Perez (Tony Amendola)no "Nick Fury" do "Wanverse":
 "- Se a sua filha quiser, tenho uma boneca que ela vai adorar!"

 

quinta-feira, 16 de abril de 2020

E surge o "Grande Queijo Vermelho"! - Crítica - Filmes: Shazam! (2019)

 

Diga o meu nome!

por Alexandre César

(originalmente postado em 05/ 04/ 2019)


Embora não use o nome este é o Capitão Marvel-Raiz !!!

Um menino dentro do corpo de um homem! Um conceito revolucionário!!!

 
Originalmente concebido por C.C.Beck e Bill Parker, e estreado na revista Whiz Comics, de fevereiro de 1940 da editora Fawcett Publications, o Capitão Marvel com a rapidez de um raio se tornou um sucesso, dando sérias dores da cabeça para a National Periodical Comics (a atual DC Comics), sua concorrente, cujo maior sucesso era o Super-Homem, pois enquanto o herói alienígena (que trazia o espírito das revistas da Ficção Científica para as Hqs, apontando para o futuro) tinha no seu auge uma tiragem média de 3 milhões de exemplares, o “Mortal mais poderoso da Terra” (que se apoiava no charme do passado, numa releitura da tradição da magia e do mitológico) chegava aos 5 milhões com uma facilidade preocupante (em seu auge a revista Captain Marvel Adventures vendeu em 1944 um total de 14 milhões de cópias e um milhão e trezentas mil cópias em média por edição no período em que foi publicada duas vezes por semana) o que levou a um longo e tumultuado processo da DC contra a Fawcett , alegando plágio do conceito do Superman, embora o Capitão tenha trazido inovações que várias editoras copiaram (inclusive a DC...) como tramas em capítulos, um uniforme elegante que fugia da fórmula da “cueca sobre a a malha”, crossovers com heróis da sua editora, grupos de supervilões e, ter apresentado a primeira versão feminina de super-herói que não era sidekick (Mary Marvel) quase uma década antes da Supergirl!!!

 
O Homem de Aço X O Mortal Mais Poderoso da Terra
 
 
Ele ainda de quebra foi o primeiro super-herói adaptado para o Cinema, em 1941 (cerca de um ano após a sua estréia nos gibis...) no seriado em doze episódios As Aventuras do Capitão Marvel, com o ator Tom Tyler como o herói, além de ter sido um das referências pop da comédia Sorveteiro em Apuros (1950) de Lloyd Bacon, com Jack Carson, Lola Albright, Jean Wallace e George Reeves (que posteriormente seria o Homem de Aço no seriado As Aventuras do Super-Homem de 1952 a 1958).


A "Familia Marvel" da Fawcett Publications.




Após uma longa batalha nos tribunais e a queda das vendas do pós-segunda guerra (que eclipsou a maioria dos super-heróis) o personagem (que tinha fãs célebres como Elvis Presley) foi em 1953 cedido pela Fawcett Comics (em crise financeira) para a National Periodical Comics findando o processo, colocando em seguida, o herói no limbo, para assim garantir o reinado do kryptoniano; mas pagariam por isso...
 
 
O Capitão Marvel (Mar-veel) da Marvel
 
 
 
Tempos depois um sujeitinho chamado Stan Lee, que trabalhava em uma “editorazinha” chamada Marvel Comics surgida nos anos de 1960 resolveu registrar a marca “Capitão Marvel”, antes que a agora DC a renovasse, mesmo não tendo um personagem ainda para usar o nome (o Capitão Marvel da Marvel só surgiria em 1967...) o que obrigou a DC a rebatizar a revista para Shazam! e depois para The Power of Shazam, só usando o nome do personagem Capitão Marvel no miolo da revista... Ironia divida? Castigo? Quem sabe? Mas essa história ainda teria desdobramentos pois ainda nos anos 50, surgiu na Inglaterra outro super-herói em homenagem ao Capitão Marvel que inicialmente se chamava Marvelman, cujas publicações duraram até 1963, e ao ser resgatado do ostracismo nos anos 80 pelo escritor Alan Moore foi rebatizado como Miracleman (por causa do Capitão Marvel da Marvel ) e desde então o vermelhão defensor da bondade, da paz e da justiça e seu alter-ego (o menino Billy Batson) amargaram altos e baixos como um dos personagens mais carismáticos e subutilizados da DC, habitando os corações de quem o conhece, e acalentava a ideia de pronunciar o nome do mago “SHAZAM!”, e receber um raio que transforma um garoto em um adulto, dando-lhe seis habilidades, sendo cada uma representada por uma letra do nome do mago:


S – Sabedoria de SALOMÃO;
H – Força de HÉRCULES;
A – Resistência de ATLAS;
Z – Poder de ZEUS;
A – Coragem de AQUILES;
M – Velocidade de MERCÚRIO.


 
O traumatizado Billy Batson ( Asher Angel) e o otimista Fredie Freeman (Jack Dylan Grazer)


Dirigido por David F. Sandberg (Annabelle 2 - A Criação do Mal de 2017) Shazam! (2019) resgata numa aventura divertida e lúdica o espírito do personagem, embora em nenhum momento use o nome de Capitão Marvel (por causa das questões enunciadas acima...) sabendo usar sua ingenuidade e esperança (elementos cada vez mais em falta atualmente...) num dos grandes filmes do Universo Cinematográfico DC, continuando o movimento de dar um tratamento mais solar aos personagens deste universo, até então carregado de tons sombrios. Até porque, era o que o personagem pedia!


Shazam (Zachary Levy) menino no corpo de homem,como a maioria de nós...


 
A trama é ambientada na Filadélfia, diferente do original (que vivia na cidade de Fawcett City, onde Billy trabalharia na rádio Whiz, como repórter Junior) e logo no seu início presenciamos a origem do antagonista Doutor Thaddeus Sivana (o ótimo Mark Strong, cool e estiloso como um vilão bondiano) que ainda criança na década de 1970 foi um dos candidatos rejeitados do Mago Shazam (Djimon Hounsou com visual mezzo mago Merlin mezzo aborígene papua) que o levou à uma busca obssessiva da Pedra da Eternidade e de seu poder. Pulando depois para o jovem Billy Batson (Asher Angel da série de TV Andi Mack) que abandonado, foge de um lar adotivo a outro numa igualmente obsessiva busca pela mãe, de quem se perdeu aos 4 anos, indo parar no lar adotivo de Victor Vasquez (Cooper Andrews da série de TV The Walking Dead) e Rosa Vasquez (Marta Milans, da série de TV Killer Women) ambos de origem orfã, que têm uma amorosa família multiracial de filhos: A amorosa Darla Dudley (Faithe Herman da série de TV This is Us); a centrada Mary Bromfield (Grace Fulton de Annabelle 2 - A Criação do Mal); o hacker-mirim Eugene Choi (Ian Chen da série de TV Fresh Off the Boat); o maciço e calado Pedro Peña (Jovan Armand da série de TV Hawaii Five-O); e o deficiente alto-astral Freddy Freeman (o ótimo Jack Dylan Grazer de It – A Coisa de 2017 que rouba a cena) entusiasta de super-heróis, que vem a se tornar seu melhor amigo.


A "Pedra da Eternidade". Feliz recriação dos gibis, com várias influências

 
Como em muitos filmes vemos o herói e vilão serem versões espelhadas (aqui, pela motivação) pois Billy procura o amor de uma mãe que lhe teria sido “roubado”, tornando-se rebelde e até malandro, enquanto Sivana, por ter sido rejeitado por seu pai e irmão desde o início, se voltou para a busca por poder. Um mesmo ponto inicial, dois rumos distintos.


Billy Batson e o mago Shazam (Djimoun Hounsou).
 
 
Após fugir novamente, o jovem de 14 anos acaba sendo convocado pelo mago, que vê nele a sua última alernativa, (já que Sivana libertou os Sete Pecados Capitais e começa a “barbarizar”...) e ao receber o poder do mago, se transforma no super-herói adulto Shazam (Zachary Levi da série de TV Chuck numa performance única). Um menino em sua essência – dentro de um corpo sarado, como o de um deus – auxiliado por Freddy, que se esbalda nesta versão adulta dele mesmo fazendo o que qualquer adolescente faria com superpoderes: Divertir-se com eles! Descobrir qual é o gosto da cerveja, se ele é capaz de voar, se tem visão de raio-X ou se consegue soltar raios pelas mãos ou poder falar com os peixes... Shazam e seu sidekick de muletas vai testando suas habilidades com a despreocupação típica de uma criança. O roteiro de Henry Gayden (com história de Gayden e Darren Lemke) baseado na versão escrita em 2012 por Geoff Johns (que é um dos produtores executivos, juntamente com Dwayne Johnson), abraça plenamente, sem nenhuma vergonha aquilo que a adaptação de um quadrinho sobre um adolescente que vira super-herói poderia ser.


Thaddeus Sivana (Mark Strong): Vilão cool e intimidador.
 
 
Freddy Freeman, em algumas vezes chega a apagar Billy Batson, o adolescente marcado negativamente pela vida, carrancudo e ressentido que aos poucos aprende o quão bom é ser amado e ter a quem amar passando por uma intensa jornada transformadora, tendo Freddy como o guia moral e técnico dele, estando inteiramente engajado em fazer com que o novo herói da área descubra seus poderes e, principalmente, entenda os valores envolvidos na frase “eu sou um super-herói”, abrindo caminho para Zachary Levi, que como Shazam abraça completamente o seu personagem não deixando de ser uma versão super-heróica do protagonista de Quero Ser Grande (1988) de Penny Marshall, tendo uma rápida e hilária citação num dos embates com Sivana...


Não faltam citações ao universo DC...

 
A fotografia de Maxime Alexandre caminha entre o realismo impessoal dos ambientes urbanos e em um maior grafismo nos cenários da Pedra da Eternidade, que lhe dá maiores possibilidades visuais, sendo a concepção da designer de produção Jennifer Spence uma boa surpesa para quem conhece o Universo da antiga Terra-S, com elementos dos Novos 52 coisa que se reflete nos figurinos de Leah Butler, que é muito feliz na surpresa final do combate “Bem X Mal” bem editado por Michel Aller.


Shazam e Sivana: Espelhados em suas motivações iniciais.
 
Shazam! é um filme que não se apega à necessidade de mostrar os grandes Deuses-DC em lutas épicas, construido-se sob uma gangorra de dramas familiares e comportamento adolescente que é de imensa importância para o arco do vilão, em torno do qual que a maravilhosa bobagem heróica do filme irá se desenvolver, discutindo a importância dos valores básicos que formam um herói e da força que uma família unida pode ter. Os clichês “bonitinhos” de moralidade familiar têm diferentes nuances aqui, até porque a negativa posição de Billy em relação à instituição não permitiria um enfoque a lá Frank Capra, mas chega perto às vezes...


 
Sivana não está para brincadeira, fazendo o herói se assumir como tal
 
 
No meio de tanta seriedade, quase-realismo e jornadas épicas no atual universo dos super-heróis nos cinemas, Shazam! É um sopro de leveza por não se ressentir de ser um filme bobo até, assumidamente para a família ou para qualquer um mais emotivo que tenha um bom coração batendo no peito e procure duas horas de diversão escapista, com o mal e o bem enfrentando-se de forma nítida fazendo a transição do olhar adolescente para o adulto, na forma de um raio mágico, capaz de transformar um garoto que não queria ser herói (até porque geralmente, quem “quer ser um herói” acaba se revelando um psicopata...) em um personagem que, nos quadrinhos, um certo vilão apelidava de “Grande Queijo Vermelho” , pois todos temos um super-herói dentro de nós; só é preciso um pouco de magia para que ele ganhe vida, basta gritar uma palavra – SHAZAM!




"SHAZAM!!!"



sexta-feira, 10 de abril de 2020

A despedida do "Demônio" - Crítica - Séries: Demolidor – 3ª Temporada

 


Doppelgänger

por Alexandre César 
(Originalmente postado em 20/ 11/ 2019 )

Série urbana da Marvel se despede em grande estilo  

 

A Irmã Maggie (Joanne Whalley) e Matthew Murdock (Charlie Cox). Entre as imagens e o passado, o boxe

 

-“Jó era um covarde!” - diz Matthew Murdock (Charlie Cox) para a Irmã Maggie (Joanne Whalley) uma freira que cuidara dele quando pequeno, após a morte de seu pai, e agora, refazendo o mesmo papel agora com ele adulto. Este é o espírito do protagonista no início da terceira (e até o momento derradeira) temporada de Demolidor série da Marvel/ Netflix refletindo seu aspecto fraturado tanto físico quanto espiritual em virtude dos sacrifícios de toda uma vida caminhando sempre na linha tênue que separa o heroísmo do vilanismo, desnudado ante seus traumas e fragilidades, e tal qual um equilibrista, sempre andando na corda bamba que o distinguia como um vigilante, ao invés de um assassino, apesar dos ocasionais desequilíbrios. A história desta vez empresta elementos de  A Queda de Murdock, de Frank Miller e David Mazzucchelli, e também de Demônio da Guarda de Kevin Smith e Joe Quesada pois, se na primeira ele está quebrado fisicamente na outra é o seu psicológico/ espiritual é que está em frangalhos, embora a narrativa não se prenda exclusivamente à dos quadrinhos.  
 


Matt e Foggy Nelson (Elden Henson). Inicialmente se afastando dos amigos, para protegê-los.

 
 
O terceiro showrunner da série Erik Oleson embarca com o pé direito na série, voltando ao básico, eliminando ninjas mortos-vivos, passados amorosos de Matt, ou coadjuvantes com caveiras no peito para desviar as atenções.Todo o choque entre vigilantismo X heroísmo, ganha assim maior profundidade por um simples fato: Matt Murdock ser um homem bastante religioso. Seu lado irlandês-católico é o que o impede de matar qualquer outro ser humano (algo nada fora do comum em se tratando de super-heróis) mas que aqui ganha ainda mais fundamento em razão do pecado, brindando-nos com a clássica história de queda e ascensão de um herói que, só funciona realmente porque conta do cuidado na construção e desenvolvimento de uma história que realmente ocupa de maneira homogênea, sem se arrastar (na maioria das vezes) a história, nos 13 episódios-padrão, com uma imensa preocupação em firmar oponentes espetaculares, memoráveis como o Coringa (afinal, sempre se disse que o Demolidor era o Batman da Marvel). 
 

Wilson Fisk (Vincent D’Onofrio) o Rei do Crime: Jogando xadrez com o mundo, dentro do xadrez.

 
 
Antes Demolidor pouco explorava do passado de seus personagens, mas agora entende que não há como fugir do peso que cada um deles carrega e, se por um lado o roteiro compreende qual caminho seguir, por outro ele prolonga e dá espaço (às vezes demais) a certas questões, como o passado de Karen Page (Deborah Ann Woll) e sua juventude mucho loka em Fagan Corners, Vermont (?) onde trabalhava na “Casa da Penny”, contrastando com a sua persona atual como jornalista investigativa, e Foggy Nelson (Elden Henson) que está seguindo carreira em uma grande empresa de advocacia, mas enfrentando problemas familiares.  

Vanessa Marianna (Ayelet Zurer): Por trás de todo enorme e mortal homem, existe uma grande e perigosa mulher...

 
 
Matt se encontra extremamente debilitado após o final apoteótico de Os Defensores (quando foi dado como morto) e sendo tratado no orfanato onde cresceu. Entre as estátuas de anjos e santos no porão da instituição, ele acredita que é melhor o Demolidor continuar a ser considerado morto (“-prefiro morrer como o demônio de Hell´s kitchen do que viver como Matt Murdock” diz a certa altura) sendo o seu subjetivo permeado pelo uso bem dosado de flashbacks e de “fantasmas” ao longo da temporada, mas de forma relevante (para um Murdock traumatizado). Todos os personagens com os seus graus de fratura... porém, a vida de todos eles é abalada mais ainda com a volta de um “Rei”... 
 
Wilson Fisk (Vincent D’Onofrio, triunfante em sua performance) continua na prisão, mas comendo o seu omelete com especiarias e contemplando a parede branca, lembrando da pintura que comprou de Vanessa (Ayelet Zurer, a perfeita encarnação da personagem, capaz se tudo para ficar ao lado do seu homem...) a sua amada não pode retornar aos EUA sob risco de ser presa. Após um atentado dentro do presídio, resolve fazer um acordo de colaboração com o FBI para entregar informações cruciais sobre os criminosos que conheceu durante o tempo que ficou atrás das grades, e, vai literalmente sendo o mestre manipulador de tudo e todos à medida que vai driblando todos ao seu redor, e transformando-os em seus próprios fantoches da sua versão macabra do Muppet Show. Um dos peões neste tabuleiro é Rahul “Ray” Nadeem (Jay Ali), um agente arruinado por dívidas decorrentes do tratamento da doença de sua cunhada, que se sente eufórico com a sua “vitória” sobre o Rei do Crime ao conseguir o acordo. Mas, Wilson Fisk é o REI DO CRIME e a temporada inteira se torna uma sucessão de desesperadas tentativas para desbaratar seu complexo jogo de xadrez em que ele está sempre “cinco jogadas a frente”, como o próprio Matt reconhece.
 

Karen Page (Deborah Ann Woll) e sua juventude nos cafundós de Vermont

 
 
As cenas de ação, em especial um plano sequência no quarto episódio, (com um toque de videogame) mostram uma evolução se comparadas às outras temporadas mostrando o quanto uma briga além de dolorosa é cansativa, deixando os seus participantes extenuados. Cox apanha, sangra como nunca, e luta de forma convincente. A direção faz um bom uso da câmera desfocada no fundo do quadro para “vermos” como o sentido de eco-localização de Matt está afetado pelo ouvido lesionado no início da temporada, demonstrando a sua dificuldade em localizar os elementos no ambiente. Embora ao longo dos episódios ele vá se recuperando percebemos que ele não esta assim realmente 100%.  
 
 

Foggy e o agente especial Rahul “Ray” Nadeem (Jay Ali). O seu arco mostra bem como Fisk enreda as pessoas em sua teia

 
 
A opção pela agilidade da câmera, locais escuros e muita sanguinolência, tornam as cenas chocantes sem gratuidade pois tudo acontece por um motivo e reflete a brutalidade dos personagens envolvidos e, embora a sua volta seja tortuosa, difícil, cheia de dúvidas morais internas, não se perde muito tempo em colocá-lo com a máscara preta original, o único traço de “uniforme” que ele usa, ótima escolha, aliás, para manter o grau de realismo necessário, que enfatiza as raízes dos Murdock com o box e o “pugilismo” de rua, mas a produção entende que sequências de ação a todo e qualquer momento não são vitais para fazer uma boa série de heróis.
 

Benjamin “Dex” Poindexter (Wilson Bethel) o futuro "Mercenário": Bomba-relógio emocional

 
Tal qual Christopher Nolan fez em Batman O Cavaleiro das Trevas (2008), aqui vemos um drama, que, por acaso, tem super-heróis e não o contrário. Tanto é assim que capítulos praticamente sem qualquer ação funcionam plenamente, numa plena aposta no suspense e na construção de personagens, para segurar a audiência, mostrando que o perigo, sempre está lá, mesmo que não precise ser enfrentado a toda hora num curto espaço de tempo. 
 
 

O "novo" e letal Demolidor...

 
Outro mérito é a forma vagarosa, com que a temporada vai construindo um vilão antológico, conhecido nos quadrinhos como Mercenário (no inglês, Bullseye), um habilidoso assassino com uma pontaria e capacidade quase sobrenatural de usar qualquer objeto como arma letal. Na série, ele é Benjamin “Dex” Poindexter (Wilson Bethel), um agente do FBI que ganha o respeito de Fisk que, vai lentamente manobrá-lo e trazê-lo para o seu lado. Os roteiros acertam em cheio ao manter sua história passada, apresentada com paciência e precisão.
 
 

Padre Paul Lanton (Peter McRobbie) figura paterna substituta

 
 
De todos os inimigos secundários já apresentados, ele é o com os melhores momentos dentro da série mantendo na sua origem, uma lógica tão perturbadora quanto a de Wilson Fisk mostrada na 1ª temporada, feita num belo episódio que é quase que integralmente um flashback em preto-e-branco. “Dex” é de certo modo uma versão espelhada, quase um Doppelgänger”*1 de Matt Murdock, pois ambos são órfãos com habilidades excepcionais e muita raiva no peito mas, o infeliz agente não teve figuras parentais substitutas fortes como o Padre Paul Lanton (Peter McRobbie) ou a Irmã Maggie, que lhe fortalecessem o senso de empatia.


As duas faces de uma moeda: Demolidores em luta


Amor, eterno amor: Wilson Fisk e Vanessa finalmente se reúnem e celebram a sua união


Neste embate épico, vemos curiosamente o amor, em suas várias formas, como sendo uma grande força motriz de seus personagens, mesmo que escondido sob camadas de ódio, desejo de vingança, necessidade de satisfazer expectativas ou de procurar pertencimento. Ironicamente, Wilson Fisk é o que tem mais consciência disso quando diz que “-O amor é a mais perfeita prisão. Por ele eu aceito a maiores humilhações e me mantenho dentro de suas grades!”  e não se pode negar que o amor dele por Vanessa é até bonito, só que... ele é um monstro! 
 

Nos quadrinhos, o Mercenário já se disfarçou de Demolidor...

  
 
O que ele fará para concretizar esse amor deixará um rastro de sangue tão denso quanto o de qualquer exército fascista, e ele não esmorecerá no seu plano de virar a opinião pública para vê-lo como um “Cidadão de Bem” (tanto que em uma cena em que fala às câmeras parece Il DuceBenito Mussolini) e consolidar o seu poder, restando a Matt, cumprir a sua via-crucis, de enfrentá-lo, e também enfrentando sem dó os seus questionamentos, complexos e traumas de infância, fazendo aflorar o seu lado mais humano, cuja integridade e caráter sempre lhe renderam o título de herói, o que colocou-o na berlinda mais de uma vez, brotando daí a sua profunda ligação com o Cristianismo.
 
 

O Herói Penitente,que carrega o peso do mundo nas costas

 
 Matthew Murdock é o herói penitente, o Jó-super-herói que aceita todas as provações, como a de ser confundido com o Diabo, o que contradiz a tradução literal de seu nome original em inglês, Daredevil (algo como aquele que "desafia o Diabo") para do seu jeito, “fazer o trabalho do Senhor” na Terra. Mais bíblico impossível!  
 


O real Big Brother

 
Notas
 
* Doppelgänger, segundo as lendas germânicas de onde provém, é um monstro ou ser fantástico que tem o dom de representar uma cópia idêntica de uma pessoa que ele escolhe ou que passa a acompanhar, o que hipoteticamente pode significar que cada pessoa tem o seu próprio. Também são conhecidos como duplo-eu ou sósia. (Wikipedia