O Assombroso Multiverso!!!

Dr. Estranho de Sam Raimi traz o terror ao UCM.

As Muitas Faces da Lua

Spector, Grant, Cavaleiro da Lua, as múltiplas personalidades do avatar de Konshu.

Adeus, Mestre.

George Perez e sua fantástica trajetória.

Eu sou as sombras.

The Batman, de Matt Reeves, recria o universo sombrio do Homem-Morcego.

Ser legal não está com nada...Ou está?

Lobo, Tubarão, Aranha, Cobra, Piranha...Que medo!!! Mas eles querem mudar isso.

quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Réquiem para um protagonista - Crítica - Filmes: Pantera Negra: Wakanda para Sempre (2022)

 


O desafio de seguir em frente

por Alexandre César

Ryan Coogler lida com o luto e a superação
 

 
 


Wakanda está fraturada. Seu maior ícone, o Rei T´Challa, pereceu, vítima de uma doença, que somente a erva coração, fonte do poder do Pantera Negra, e que foi extinta por Kilmonger, poderia tê-lo salvado, sendo a princesa Shuri (Letitia Wright de Morte no Nilo) a mais afetada pois apesar de toda a sua ciência, ela não pode salvar seu irmão e diferente de sua mãe, a Rainha Ramonda (a maravilhosa Angela Bassett de Pantera Negra no auge de sua presença) ela não compartilha da crença de um mundo espiritual, tendo grande dificuldade em lidar com o luto, contando com a sororidade e o suporte de Okoye (Danai Gurira de Vingadores: Ultimato), Ayo (Florence Kasumba de Falcão e o Soldado Invernal), Aneka (Michaela Coel de I May Destroy You), suas amigas Dora Milaje (a guarda de elite wakandana) e de M´Baku (Winston Duke de Família Moderna) que prometera ao monarca estar sempre ao lado dela. 

 

Mercenários, patrocinados pelas potências hegemônicas tentam (sem sucesso) roubar o vibranium de Wakanda

A Rainha-Mãe Ramonda (Angela Bassett) lida com a perda em sua família e o assédio internacional


Agora, enquanto os wakandanos lidam com sua perda, as potências ocidentais procuram encontrar fontes externas de vibranium, mas ao descobrir um novo ponto de exploração, no subsolo do Oceano Atlântico, o navio de uma equipe mineradora, e sua exploradora-chefe (Lake Bell de Horas de Desespero) são violentamente rechaçados por uma força misteriosa, provocando acusações contra o reino afrofuturista, que logo é confrontado por Namor (Tenoch Huerta de Narcos: México em ótima performance, fugindo de ser um antagonista monotemático) regente do reino submarino de Talocan, que até aquele momento se mantivera escondido do resto do mundo. Namor lhes propõe uma aliança contra o resto do mundo, e que lhe seja entregue Riri Williams (Dominique Thorne de Judas e o Messias Negro) jovem americana responsável por desenvolver um detector de vibranium, para preservar a hierarquia de poder, ou caso contrário será a guerra, com todas as suas graves consequências.


Namor (Tenoch Huerta) intima Ramonda a unir-se à ele, ou entrar em guerra com seu reino

 

Dirigido por Ryan Coogler (Creed) Pantera Negra: Wakanda Para Sempre (2022) revela-se com pouca margem de dúvida, um dos melhores filmes da Fase IV da Universo Cinematográfico Marvel (MCU), reafirmando o conceito do Pantera Negra, uma de suas maiores contribuições ao cinema e a cultura pop em geral e prestando tributo ao seu maior ícone, o inesquecível Chadwick Boseman, num grande filme-réquiem ao ator que mesmo ausente, permeia a maior parte de suas duas horas e quarenta e um minutos de duração, mantendo suas emoções à flor da pele, graças a seu elenco excepcional. 

 

A Rainha convoca Okoye (Danai Gurira) das Dora Milaje para uma missão nos EUA
Okoye, e a princesa Shuri (Letitia Wright) têm o seu momento "gangsta" durante a missão


Letitia Wright convence como uma personagem materialista, que só crê na ciência (contrastando inclusive com a postura anti-vax da atriz fora de cena), não tendo uma crença religiosa que lhe dê suporte ao lidar com a perda, enquanto a Rainha-Mãe Ramonda de Angela Bassett carrega uma verdade palpável em sua dor; a Okoye de Danai Gurira é o ‘braço forte e mão amiga’ do grupo e M´Baku cresce e amadurece como personagem, tendo seus sutis momentos de alívio cômico, mas provando que seria um bom rei para Wakanda.


O pivô da intriga entre as duas potências é a jovem Riri Williams (Dominique Thorne), a Coração de Ferro é introduzida no MCU, com boa presença



Retornam rostos familiares como Nakia (Lupita Nyong´o de Star Wars: A Ascensão Skywalker), a espiã e antigo amor de T´Challa, que apresenta um novo e crucial detalhe na cena pós-crédito (que poderá levar a franquia a novos patamares); o Agente Everett K. Ross (Martin Freeman de Breeders) que descobrimos ser o ex-marido de uma certa chefe de Agência de espionagem que ainda dará muito o que falar no MCU, além de, num momento de inclusão, Ayo e Aneka têm discreta indicação de seu relacionamento lésbico, e Riri Williams de Dominique Thorne, a Coração de Ferro, tem boa introdução, ainda que um tanto acelerada, já estabelecendo a personagem para a sua vindoura série, fazendo seu papel de “Fórmula Marvel” do personagem feliz de estar naquele universo. 

 

Num momento de negociação, Namor apresenta a Shuri, o reino submarino de Talocan

No Haiti, a espiã Nakia (Lupita Nyong´o), antigo amor de T´Challa tem papel crucial na manutenção da dinastia



O roteiro de Coogler, Joe Robert Cole (Dias sem Fim) a partir do argumento de Coogler, baseado nos personagens criados por Stan Lee e Bill Everett lida com questões como o luto, legado, a ancestralidade e a necessidade do saber desapegar-se para não se deixar consumir pela perda e poder seguir adiante mas peca por desenvolver pouco o contexto de geopolítica global, inicialmente dando toques pontuais quanto à política de interferência das nações hegemônicas (aqui EUA e França) como quando Ramonda confronta numa reunião da ONU os representantes das principais nações, dentre eles, o dos EUA (Richard Schiff de Tempestade: Planeta em Fúria), ou quando Namor ataca a expedição mineradora, mas não aprofundando estas questões, procurando se focar mais no conflito das duas nações fictícias e de seus personagens, que a edição de Kelley Dixon (Obi-Wan Kenobi), Jennifer Lame (Hereditário) e Michael P. Shawver (Agente das Sombras) vai alternando momentos de ritmo lento a outros mais dinâmicos com uma progressão gradual e crescente. 

 

M´Baku (Winston Duke) se revela amadurecido enquanto líder, sendo um precioso apoio


O grande desafio, além de lidar com a perda e Chadwick Boseman, foi como lidar com Namor, personagem mais antigo da Marvel, sendo anterior ao Aquaman da rival DC Comics (talvez tenha sido o único personagem em que a DC tenha se inspirado na Marvel e, não o contrário) mas como o personagem estava preso à contratos com estúdios rivais*1, James Wan conseguiu levar primeiro para o cinema a versão da ”distinta concorrência” do soberano de Atlântida em Aquaman*1(2018), repaginando para o grande público seu personagem e o conceito do mito de origem grega, portanto se a “Casa das Idéias” tentasse emplacar outra versão de um ‘soberano de Atlântida’ acabaria sendo pichado de mera cópia. A solução foi seguir outro caminho, e numa mostra de que dificuldade pode se converter em oportunidade, decidiu-se voltar o foco para as culturas mesoamericanas, encontrando-se no caldeirão cultural dos Astecas, Incas e Maias a lenda de Kukulcan*3, o deus-serpente emplumado e do reino aquático de Tlalocan*4, que caía como uma luva e de quebra permitia aumentar o escopo de diversidade e inclusão, tão almejada pelas empresas como a Marvel e a Disney, ávidas por maiores fatias de um mercado cada vez mais diferenciado. 

 

Os figurinos e a direção de arte traduzem o espelhamento das culturas dos dois reinos...


...no quesito de suas raízes e ancestralidade, pleno de detalhes e funcionalidade

E não é que foi um tiro certeiro?! Ao narrar em flashback a origem do povo e de seu monarca, apontando suas raízes centro-americanas e a cruel devastação de seus povos pelos espanhóis, acompanhamos trajetória da Princesa Fen (María Mercedes Coroy de A Chorona) mãe de Namor e de seu povo, que ao ingerir um preparado à base de uma raiz cujo solo tinha vibranium, adaptaram-se a viver sob os mares, e posteriormente dando à luz ao personagem, um mutante híbrido capaz de viver nos dois ambientes, e sendo um personagem único, que age da forma condizente com a de um líder pragmático, não sendo herói, nem vilão ou anti-herói, ou todos, na medida de suas necessidades, enquanto regente de Talocan, adorado por seu povo como avatar de K'uk'ulkan, O Deus Serpente com Penas, tal qual o Pantera Negra era visto como avatar do Deus Bast. infelizmente, apesar de sua boa presença, são pouco explorados, Namora (Mitzel Mabel Cadena de Monarca) e Attuma (Alex Livinalli de Ozark), prima e seu comandante de campo, que deverão ser mais desenvolvidos numa futura película do herói submarino. 


O vôo de Namor, remete aos antigos desenhos da Marvel dos anos 1960


Além das críticas moderadas ao imperialismo e a segmentos sociais como à indústria de maquiagem, que demorou a se voltar aos tons de pele negra, chegando a um easter-egg histórico com um personagem chamado Toussaint*5 que acrescenta camadas ao contexto maior. 

 

Os efeitos fisuais mantêm o padrão de qualidade Marvel na apresentação de novos personagens como a Coração de Ferro...
...e na construção de mundo, bem como na destruição, quando chega a guerra, mostrando as diferenças tecnológicas e os modos de guerrear dos povos beligerantes


A fotografia de Autumn Durald Arkapaw (Loki) contrasta a palheta de cores quentes e claras de Wakanda com as escuras ambientações submarinas de Talocan, que vão revelando seus detalhes em camadas (afinal é um reino submarino, beem profundo, e a água é naturalmente um meio mais denso).

 

Attuma (Alex Livinalli), comandante de Namor e sua prima Namora (Mitzel Mabel) no pouco que aparecem têm bom domínio de cena



Aqui temos categorias certas de indicação ao Oscar: O desenho de produção de Hannah Beachler (Nem Um Passo em Falso) e Jason T. Clark (99 Problems) supera a criação de mundo do filme anterior, com a direção de arte de Brad Ricker (Duna); Marlie Arnold (Loki); Cameron Beasley (Ms. Marvel); Laurel Bergman (Rampage: Destruição Total); Jesse Rosenthal (Vidro) e Mailara Santana (StartUp) expandindo mais Wakanda e revelando igual apuro na apresentação de Talocan, enriquecido pela decoração de sets de Lisa K. Sessions (O Esquadrão Suicida) que apresenta pequenos detalhes, como mostrar o uso de uma fibra, similar ao agave (cacto mexicano, cacto, que faz o mescal) para confeccionar adornos e peças de roupa, que se complementa com os figurinos de Ruth E. Carter (Pantera Negra) que se supera, dando peso, uso e palpabilidade nos variados trajes, plenos de detalhes integrados ao contexto cultural dos dois povos de Talocan e Wakanda, que têm paralelos quanto à ancestralidade. Ainda temos a colaboração da Weta Workshop nos trajes especiais da Pantera Negra, e da Legacy Effects, na armadura da Coração de Ferro


A fotografia trabalha com ambientes mais iluminados em Wakanda, um reino de tecnologia mais familiar para nós...

...e ambientes mais escuros e misteriosos em Talocan, cuja tecnologia submarina foge ao nosso entendimento

 

No espelhamento dos paralelos entre os dois povos, a música de Ludwig Goöransson (O Mandaloriano) mescla temas africanos e mexicanos, além de sons atmosféricos como o canto de baleias, enfatizando o peso ancestral de seus vínculos à natureza, além da seleção musical de David Jordan, que entre outros hits, figura o belo tema “Lift Me Up” na interpretação inspirada de Rihanna. 

 

Temos num recordatório, as origens de Namor e de seu povo, remontando ao período da conquista sangenta pelos espanhóis


Complementando a construção de mundo, temos os efeitos visuais de Industrial Light & Magic (ILM), Digital Domain, Cinesite, Mammal Studios, Perception, SSVFX, Rise Visual Effects Studios e Weta FX supervisionados por Geoffrey Baumann (Viúva Negra), Ed Bruce (Thor: Amor e Trovão), que cria belas e complexas panorâmicas da capital afrofuturista wakandana, superando em muito (neste quesito o filme original) e realçando o ar misterioso de Talocan e, inovando nos vôos de Namor, cuja movimentação diferenciada (afinal, ele tem asas nos tornozelos) remete às animações dos “desenhos desanimados” dos anos 1960. 

 

A capital de Wakanda continua deslumbrante, mesmo que sendo devastada

Coração de Ferro entra no combate, e logo dará as caras numa série própria


Ao final, em que pesem seus poucos e ocasionais tropeços, Pantera Negra: Wakanda Para Sempre cresce aparece como um filme sólido que diverte na medida em que emociona, na medida em que suas partes se unem num todo coeso e bem planejado e executado, afirmando a mensagem de que mais do que chorar a perda de entes queridos, devemos abraçar alegria de ter compartilhado de sua presença neste mundo, preservando a sua memória e mantendo-a viva. 

 

Qundo o conflito eclode, temos o surgimento da nova Pantera Negra


 

Notas:

 


 

*1: Namor, o Príncipe Submarino (Namor the Sub-Mariner no original), também conhecido nos quadrinhos como Namor McKenzie, surgiu no início de 1939, tendo sido criado pelo escritor e desenhista Bill Everett, para a Funnies Inc., um dos primeiros estúdios a produzir quadrinhos por demanda. Inicialmente criado para a revista Motion Picture Funnies Weekly, o personagem foi publicado pela primeira vez na revista Marvel Comics # 1 (abril de 1939) - primeira revista em quadrinhos da Timely Comics, uma predecessora da Marvel Comics nas décadas de 30 e 40. Durante esse período, conhecido por historiadores e fãs como a Era de Ouro dos Quadrinhos.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Namor




*2: Arthur Curry, o Aquaman, foi criado por Paul Norris e Mort Weisinger para a revista More Fun Comics nº 73 de novembro de 1941 (mas na verdade a nº 73 de ”novembro” chegou às bancas dos EUA em 25 de setembro de 1941.) 

 



*3: Kukulcan (pron. Koo-kool-kan) é o nome de um deus serpente emplumado na mitologia e religião das culturas mesoamericanas, em particular, os yucatecas maias. Ele também é identificado como o deus serpente emplumado Quetzalcóatl pelos toltecas e astecas, como Gucumatz para o quiché maia da Guatemala, e Ehecatl, o deus do vento, para os huastecas da costa do Golfo. Kukulcan e suas outras manifestações são unificados pela crença de que cada um foi considerado um deus criador e um gerador de chuva e ventos. O deus está particularmente associado a Chichen Itza, onde um grande templo foi construído em sua homenagem. Kukulcan também é o nome de um herói cultural do século 10 dC na história iucateca maia, e ele tem uma contrapartida nas histórias tolteca e asteca, onde carrega o nome de Ce Acatl Topiltzin Quetzalcóatl. O deus da serpente emplumada permanece hoje um poderoso símbolo da herança cultural indígena mexicana.

Fonte: https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-11168/kukulcan/



*4: Tlalocan era um dos vários paraísos da mitologia asteca, era a morada das almas astecas mais nobres após a morte, especialmente das mulheres que morriam ao dar à luz.

Quanto a este fato, acreditava-se que a ação do parto era como um combate, assim como o combate do guerreiro, fato que tornava a morte dessas mulheres tão honrada quanto a dos guerreiros.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Tlalocan



*5: François-Dominique Toussaint L'Ouverture (batizado em 20 de maio de 1743 — 7 de abril de 1803, Forte de Joux, La Cluse-et-Mijoux, Doubs) foi o maior líder da Revolução Haitiana e, em seguida, governador de Saint Domingue, o nome do Haiti na época. L'Ouverture é o maior revolucionário negro das Américas, o qual é reconhecido por pesquisadores C. L. R. James como o maior comandante, depois de Napoleão Bonaparte no período de 1793 a 1814. Ele carregava consigo conhecimentos, estratégias, honrado com uma personalidade de guerrilheiro e capaz de em palavras simples aumentar cada vez mais um exército, sendo assim, organizou na ilha de Saint Domingue com cerca de meio milhão de escravizados, a chamada Revolução do Haiti, aonde mesmo depois de sua morte o seu legado continuou dando vigor para a construção de um novo território, dotado de liberdade e igualdade. O seu legado tem imperado até os dias atuais. Encontramos espalhados pelo mundo estátuas em sua homenagem, um hospital já levou o seu nome e filmes sobre ele.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Toussaint_Louverture



"Eu voltarei humanos, e quando tiver o meu filme próprio, vocês verão com quanta água se faz um Tsunami..."