sábado, 6 de março de 2021

O Poderoso Joe Genérico - Crítica: Rampage - Destruição Total (2018)

 

 

Sem deixar pedra sobre pedra

 
por Alexandre César
(Originalmente publicado em 11/ 04/ 2018)


 E Dayne Johnson encontra um rival à altura...


 

Davis Okoye (Dwayne Johnson) e George (captura de performance de Jason Liles), o gorila albino mutante: Dupla do barulho


A indústria de games atualmente arrecada mundialmente um volume de receita bruta e líquida muitíssimo maior do que Hollywood. Daí a perseguição obsessiva desta em trazer estes universos narrativos para as telas, na esperança de ter um produto com público cativo e o retorno garantido do capital investido com uma boa margem de lucro. Bom raciocínio, o problema é que, como são veículos narrativos distintos, para funcionar como um filme a narrativa acaba ficando diferente do game. E quando não segue essa ideia, o filme não funciona dramaticamente. Na maioria das vezes a melhor adaptação é focar em uma narrativa genérica, pegando o conceito central, usando o visual da ambientação, reproduzindo passagens-chaves - vide Tomb Raider: A Origem (2018, de Roar Uthaug) , com um ou outro easter egg e referências ao longo do caminho para satisfazer o público gamer e adaptar os personagens do produto original nesta linha, de maneira a que o público não familiarizado com o jogo possa embarcar na narrativa e ter um entendimento da trama. Muita gente chiará, mas normalmente este meio termo é o que tem funcionado na maioria das vezes, independente do filme ser bom ou ruim. 

 

"George", "Lizzie" e "Ralph" no game original. "Quase" igual ao que se vê na tela...

 

O filme é baseado num videogame de 1986, com aqueles graficozinhos típicos de outros jogos mais famosos da época - Donkey Kong, Super Mario Bros, Sonic etc. A premissa original era sobre três personagens que sofriam mutações, tornando-se monstros que destruíam cidades, uma após outra. George era um homem de meia-idade que virava um gorila gigante no melhor estilo King Kong; Lizzie era uma jovem que se transformava em um lagartão tipo Godzilla; e Ralph, um senhor idoso que se tornava um lobisomem gigante. O jogador escolhia um dos personagens e ia enfrentando as forças armadas, colocando uma cidade inteira no chão na conclusão de nível e, eventualmente, enfrentando algum dos outros dois monstros.

Claire Wyden (Malin Akermann): a bela e cruel vilã com planos dignos de desenho da Warner Bros.

 

Apoiando-se no carisma incontestável de Dwayne “The Rock” Johnson, Rampage - Destruição Total (2018) é dirigido por Brad Peyton, que foi o responsável por outros dois filmes protagonizados pelo ator: Terremoto - A Falha de San Andreas (2016) e Viagem 2 - A Ilha Misteriosa (2014). Aqui ele apresenta Johnson e sua presença heroica como Davis Okoye, um primatologista solitário que tem grande amizade por George, um gorila albino, inteligente e gentil criado por ele desde o seu nascimento. Mas, para o filme começar mesmo, o primata é exposto a um experimento genético não autorizado, fruto das maquinações da bela e perigosa Claire Wyden (Malin Akerman,de Watchmen linda e bidimensional) e do seu irmão patético Bret (Jake Lacy de The Office) transformando-o em uma besta feroz e colossal. 

 

"Ralph" o lobo mutante é um exemplo de "simpatia"...

Okoye, tentando salvar o seu amigo, se une a Drª Kate Caldwell (Naomie Harris de 007 Contra Spectre), uma geneticista desacreditada pelas Indústrias Wyden na esperança de encontrar um antídoto para pelo menos reduzir os acessos de fúria de George. Ao longo do filme, se revelam outras criaturas também afetadas por estes experimentos e, nesta corrida contra o tempo e o inevitável confronto dos monstros, surge o agente Russel (Jefrey Dean Morgan, de The Walking Dead divertidamente caricato) que tem o seu próprio modo de lidar com a crise.


Agente Russel (Jefrey Dean Morgan): "Diplomacia Cowboy" temperada com atitude cartunesca...

O roteiro de Ryan Engle (O Passageiro), Carlton Cuse (Lost). Ryan J. Condal (Hércules) e Adam Sztykiel (Os Impegáveis), baseado na história de Engle, pega as situações básicas, apresentando um plano “qualquer coisa” elaborado pelos Wyden, que na realidade é um pretexto para termos as situações de destruição urbana que remetem ao videogame. O plano seria brilhante não fosse um único e fundamental detalhe: É estúpido. É um dos planos mais estúpidos já vistos em blockbusters, mas, por incrível que pareça, passa batido pelo espectador, porque neste tipo de filme a gente quer ver os monstros em ação! 

 

Os irmãos Wyden: Claire  e Bret (Jake Lacy) têm um plano digno de "Pinky & Cérebro"...

Os monstros têm lá o seu charme, apesar da pouca definição de personalidade deles - excetuando George, que, sem sombra de dúvida é o melhor personagem do filme. Os efeitos visuais, supervisionados por Colin Strause (Tempestade: Planeta em Fúria), tem o seu grande trunfo na expertise da Weta Digital, que, num prodígio de CGI e captura de performance - em ótima atuação de Jason Liles -, criam um personagem que ganha a platéia em poucos minutos de tela. George é sacana, meigo, tem um leque de expressões que compensam boa parte do elenco. E a sua interação com Johnson é perfeita, formando com ele uma ótima dupla em cena, como esta se fosse uma versão alternativa de O Poderoso Joe (1998, de Ron Underwood), tirando a Charlize Theron e colocando Dwayne Johnson no seu lugar. A parceria rende com a canastrice assumida do ator ao compor seu personagem - um primatologista, ex- interceptador de caçadores ilegais, ex-forças especiais (afinal, tinha que se criar uma desculpa para o físico do protagonista...) e com dificuldades de se relacionar com seus semelhantes. O interessante é que, apesar de atuar boa parte do filme com Harris, não existe no roteiro a necessidade de forçar um relacionamento entre os dois, deixando a coisa mais leve e fluida.

 

Drª Kate Caldwell (Naomie Harris) e Davis Okoye, com George entre eles: parceria sem a obrigação de romance


Os figurinos de Melissa Bruning (Planeta dos Macacos: A Guerra) definem os personagens em suas personalidades, funções e classes sociais, e a fotografia de Jaron Presant (Contagem Regressiva), a edição de Jim May (Sem Escalas) e Bob Ducsay (Godzilla), o desenho de produção de Barry Chusid (Independence Day: O Ressurgimento) fazem o necessário para traduzir as imagens de destruição em massa com bastante realismo, com uma discreta manipulação de imagem, lembrando de forma sutil os gráficos de alta definição de um game de hoje em dia. O 3D aqui curiosamente não influi muito no aspecto geral da exibição, podendo-se assistir numa exibição convencional sem perdas significativas. A música de Andrew Lockington (O Espaço Entre Nós) funciona, com um ou outro acorde remetendo levemente a algumas passagens do game.

 

A versão de "Lizzie" é digna de "Jurassic World"

No frigir dos ovos, o conjunto - seja da parte dos monstros, seja no filme como um todo - parece uma versão genérica, mas ao mesmo tempo divertida de Kong - A Ilha da Caveira (2017, de Jordan Vogt-Roberts) ou o conceito do qual este último filme faz parte: o Monsterverse elaborado pela elaborado pela Legendary Pictures, que, além de King Kong, incluem Godzilla, Mothra, Gidrah e outros colossos. Não muito mais do que isso.

Game Over.


P.S. Por incrível que pareça, não há cena pós-créditos.



Dwayne Johnson. O "Belo" entre as Feras...



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