Super-Ultra Mercury
por Alexandre César
(Originalmente postado em 01/ 11/ 2018)
E Bryan Singer realiza seu maior filme de "super-heróis"
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Farrokh Bulsara ou Freddie Mercury (Remi Marek): Uma força da natureza. |
Abril de 1970. Nascido na mítica cidade de Zanzibar, no leste da África, Farrokh Bulsara (Rami Malek) nesta época é um jovem tímido cujos pais eram pársis (grupo étnico do subcontinente indiano) praticantes do zoroastrismo, religião persa monoteísta mais antiga que Cristianismo. Ele residia em Londres, mas se sentia à parte de todos ao seu redor. Ao juntar-se à banda Smile, de Brian May (Gwilym Lee) e Roger Taylor (Ben Hardy), Farrokh desenvolve rapidamente seus poderes ocultos, rebatizando a banda para Queen e recriando a si mesmo com seus poderes, tornando-se um dos maiores super-heróis pops de todos os tempos: Freddie Mercury, mudando para sempre o mundo da música. Não tardou para John Deacon (Joseph Mazello) entrar também no super grupo. Porém, ao usar de forma desordenada seus poderes, refletidos no seu estilo de vida extravagante, Freddie começa a sair do controle, dispersando o grupo de heróis. Estes tem de enfrentar o supremo e maior desafio de suas vidas: conciliar a fama e o sucesso com suas vidas pessoais cada vez mais complicadas.
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Mary Austin (esq.) e Lucy Boynton (dir.). A original e a representação do grande amor da vida do herói. Afinal, amor e sexo são coisas distintas
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Narrada desta forma, podemos achar que Bohemian Rhapsody (2018), dirigido por Bryan Singer (demitido ao final das filmagens e substituído na pós-produção por Dexter Fletcher), é um filme de super-heróis, com um protagonista maior do que a vida e uma equipe que lhe dá o suporte para fazer o bem. Bom, esta cinebiografia do controverso astro e de sua banda não só permite esta leitura como a abraça de forma sensacional nos permitindo dizer que Synger, além de relizar seu maior filme de super-heróis (ele é o responsável pela cinesérie dos X-Men), nos proporcionou a sua obra-prima. É claro que fica a dúvida sobre o quê de fato deve ser creditado à Synger e o que pertence à Fletcher, uma vez que as filmagens foram tumultuadas, com a escalação tardia de Malek para o papel que originariamente seria de Sacha Baron Cohen ( Borat - O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América , de 2006, e Brüno, de 2009, ambos dirigidos por Larry Charles). A tendência à comédia galhofeira de Cohen com certeza criaria uma caricatura de Mercury. Isto não acontece com a performance magnética de Malek, cuja entrega ao personagem é notável, recriando os tiques e maneirismos de Mercury de forma precisa e fluida numa naturalidade pouco vista.
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Quarteto Fantástico Cabeludo: O elenco (acima) e os originais (abaixo)... |
O filme narra de forma épica a trajetória do Queen, recriando momentos icônicos da sua história, como a criação em 1975 de Bohemian Rhapsody - o single que os colocaria em primeiro plano da cena musical internacional -, as brigas, a separação e a sua volta até o lendário show Live Aid, em
1985, no Estádio Wembley, cujos benefícios foram destinados à luta
contra a fome da África e reuniu algumas das maiores estrelas musicais
da época.
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A entrega de Rami Malek como o protagonista é total,recriando com sutileza as expressões e o gestual de Mercury
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O elenco todo é notável. A caracterizações de todos os membros da banda é fantástica - ao compararmos às cenas dos créditos finais com cenas dos concertos reais fica praticamente impossível diferenciar uns dos outros. Os outros personagens não ficam atrás, destacando Lucy Boynton como Mary Austin - a primeira companheira de Freddie -, e Aaron Mac Cusker como Jim Hutton, seu parceiro ao fim da vida. Também precisamos citar Aidan Gillen (o “Mindinho” de Game of Thrones) como John Reid - o primeiro empresário da banda -, Allen Leech, como Paul Prenter (de Dowton Abbey), o gerente pessoal de Mercury que teria sido a “má companhia” em seu período desvairado, e Tom Hollander como Jim Beach, o segundo (e mais fiel) empresário da banda. Para finalizar não podemos deixar de falar do irreconhecível Mike Myers como Ray Foster, o czar do mercado fonográfico que teria perdido o Queen por não acreditar no potencial da canção Bohemian Rhapsody (que, na época, teve mesmo críticas negativas, apesar do sucesso).
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Fase mais doida de Mercury: A "Rainha" da Gandaia
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Porém, nem tudo é perfeito, com alguns momentos incluídos fora da cronologia dos fatos reais ou de forma vaga, como a majestosa apresentação da banda no Rio de Janeiro, que ocorreu na primeira edição do Rock In Rio (1985) mas é editada no filme de forma a se encaixar em sua trama de “jornada do herói”, mostrando em sequência surgimento, ascensão, queda, redenção e apoteose. Mercury é o Wolverine gay e o Queen os seus X-Men, a sua âncora com o mundo real que, juntos, se tornam maiores do que a soma das partes.
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O momento que May explica a Mercury o conceito de "We Will Rock You": A didática da construção de obras icônicas é cativante
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E que soma! Há muito tempo não se via um filme que transmitisse o efeito de querer que nunca acabe, que continue e continue mostrando os seus heróis rockeiros disfuncionais, enfrentando e vencendo os obstáculos da existência e do embate de seus egos, como numa família. Como cantar hits tão caros ao coração de gerações como We Are The Champions, Don´t Stop Me Now e Love of My Life sem se permitir a queda de uma lágrima ou várias por tantas emoções que elas evocam ao longo de nossas vidas?
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O novo visual da equipe. E que venha Magneto!!!
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O saldo é mais do que satisfatório neste que é um dos grandes filmes do ano. A música do Queen, e o que elas evocam, é o maior superpoder a que podemos almejar num momento em que o mundo no geral, e o país no particular, se fecha, com jovens se tornando velhos por escolher abraçar valores velhos. Este é um momento em que precisamos de heróis multicoloridos e exuberantes, com a pulsante energia da vida de Freddie Mercury, o nosso rei... ou rainha.
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O "Live Aid" de 1985. Momento em que nossos heróis estão na plenitude de seus poderes |
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