sexta-feira, 1 de abril de 2022

Chupa-sangue fashion - Crítica - Filmes: Morbius (2022)

 


Sede de sangue...

por Alexandre César 

O primeiro vampiro da Marvel estreia no "Sony Spiderverse" 
 
 
Origen: Amasing Spider-Man #101, quando Morbius era um vilão

 
 
Tendo surgido em Amazing Spider-Man #101, de 1971, (sua origem surgiria no número #102) Morbius, o Vampiro Vivo foi a primeira tentativa da Marvel de testar o afrouxamento do Comics Code Authority *1 que vinha tutelando a produção de quadrinhos desde a década de 50, pasteurizando e infantilizando as revistas com seus tabus. Desde o início do Universo Marvel, a editora vinha forçando os limites do código, e a partir do início da década de 1970, ela iria trazer o horror*2 de volta a seus títulos, com o afrouxamento do código, que só seria mesmo oficialmente abolido em 2011.
 
 
A transposição para as telas
 
 
Com a explosão do Universo Cinematográfico Marvel, emplacando um campeão de bilheteria atrás do outro, a Sony Pictures, (que detém os direitos de adaptação para o cinema do Homem-Aranha*3) vem sistematicamente tentando emplacar um “universo expandido” calcado nos antagonistas e personagens relacionados ao Cabeça-de-Teia, dos quais, apenas ela detém os direitos de filmagem, sem ter que pedir auxílio da Marvel Studios (como na recém-concluída trilogia do Homem-Aranha com Tom Holland), sendo Venon (2018) e sua continuação Venon 2: Tempo de Carnificina (2021) as pedras angulares dessa estratégia, que futuramente ainda deverão render Kraven, o Caçador (em produção), Madame Teia e agora, Morbius (2022), dirigido por Daniel Espinosa (Vida), cujo roteiro de Matt Sazama & Burk Sharpless (Perdidos no Espaço) baseado no personagem criado por Roy Thomas e Gil Kane procura transformar o desconhecido personagem do grande público num anti-herói trágico... coisa que na maioria das vezes não funciona (e muito!) como deveria, muito devido aos adiamentos e mudanças de ordem de lançamento, forçando mudanças que comprometeram sua lógica interna*4.
 
 
O brilhante e estiloso Dr. Michael Morbius (Jared Leto) arrisca tudo numa fórmula experimental
 
 
Na trama acompanhamos o brilhante e combalido Dr. Michael Morbius (Jared Leto de Casa Gucci numa boa composição de personagem apesar de tudo) em função de uma rara doença no sangue que vai minando suas forças. Criado com seu irmão de consideração Milo (Matt Smith de Doctor Who desperdiçado, mas tirando leite de pedra no papel) que padece do mesmo mal, ele testa em si mesmo um soro experimental à base do DNA de morcegos vampiros, salvando a sua vida, mas tornando-se um híbrido de humano com morcego, com necessidade de alimentar-se de sangue como um vampiro.
 
 
Casal: Morbius e Martine Bancroft (Adria Arjona) até há uma boa química entre os protagonistas, mas o roteiro não ajuda
 
 
 
Dos personagens restantes, temos um elenco esforçado, mas cujo texto não ajuda muito. O mentor de Morbius e Milo Emil Nikols (o ótimo Jared Harris de Fundação) apesar de sua presença marcante não acrescenta realmente nada substancial à trama, a amada de Morbius Martine Bancroft (Adria Arjona de Belas Maldições) faz o que o roteiro precisa, independente de coerência ou lógica, ou os investigadores Simon Stroud (Tyrese Gibson de Velozes & Furiosos 9)  e Rodriguez (Al Madrigal de Physical) que só falam frases feitas que já vimos inúmeras vezes em outros filmes policiais, e da mesma forma o Sr. Fox (Corey Johnson de O Mauritano) é o típico capanga marrento (cujo destino está selado por causa disso...), isto sem mencionar a ‘participação’ de Adrian Toomes, o Abutre (Michael Keaton de Homem-Aranha: De Volta ao Lar) nas duas sequências pós-créditos, que não tem realmente coerência narrativa alguma...
 
 
Os efeitos visuais dos poderes de Morbius como o da eco localização são bons


 
Narrativamente, a direção de Espinosa, junto com a edição de Pietro Scalia (Han Solo: Uma História Star Wars) faz uma mescla de horror com o tipo de narrativa genérica de filme de super-heróis do início dos anos 2000 (quando as adaptações eram genéricas, com pouca relação com o material-base) mas com uma preocupação extrema de não ultrapassar a violência ou o sangue, mantendo a classificação PG-13, o que num filme de horror (e de vampiros) real, soaria inconsistente. A música de Jon Ekstrand (Pesadelo nas Alturas) sublinha a ação, mas não é realmente marcante, apesar de alguns bons momentos... Caso se repita o ‘efeito Venon’ (que pelo menos abraçou a galhofa, garantindo bilheteria) e o público abrace o filme, o personagem ainda tem uma chance de ser melhor trabalhado em continuações. Caso não, será esquecido de vez ficando apenas como uma curiosidade*5.
 
 
Adrian Toomes, o Abutre (Michael Keaton). O filme tem duas cenas pós-créditos que são forçação de barra para uma conexão com outros filmes

 
 
Visualmente, o filme é até bem acabado, com o desenho de produção de Stefania Cella (Pequena Grande Vida) junto com a direção de arte de James Lewis (O Batman); Nigel Evans (Planeta dos Macacos: A Guerra); Aja Kai Rowley (Eternos); Remo Tozzi (Jogador N°1); Victor Capoccia (Venon: Tempo de Carnificina) e Jason Perrine (Gavião Arqueiro) e a decoração de sets de Tina Jones (Aladdin) e Madelaine Frezza (O Culpado) habilidosamente recriam a cidade de Nova York na zona norte de Manchester, no Reino Unido, onde todas as luzes, placas e sinais da cidade foram alteradas para corresponder às encontradas na cidade americana. Da mesma forma, os figurinos de Cindy Evans (Atômica) são até eficientes na definição dos personagens, como Michael Morbius com seu look estiloso, mas nada realmente marcante.
 
 
'Efeito Zack Snyder' em ação. O problema é ser utilizado em demasia

 
A caracterização de Morbius é muito boa, graças às próteses de maquiagem de Melanie Aksamit (Ratched) e à caracterização digital de Tansim Dorling Barbosa (Venon: Tempo de Carnificina) e a forma que seus poderes de eco localização são representados, funciona bem graças aos efeitos visuais de Digital Domain, Industrial Light & Magical (ILM), Lola Visual Effects, NVIZ, One Of Us e Proof supervisionados por Matthew E. Butler (Jogador N°1) e Joel Behrens (Homem-Formiga e a Vespa), colaborando com a fotografia de Oliver Wood (Jack Reacher: Sem Retorno) que em vários momentos usa aquela ‘Fórmula Zack Snyder’ de desacelerar uma cena, parando um quadro (emulando um quadrinho de revista) para depois acelerar de novo. Um recurso que até é legal, mas por ser tão usado hoje em dia, está se tornando repetitivo...
 
 
Milo (Matt Smith) o 'irmão de consideração' de Morbius: Um bom ator tirando leite de pedra

 
Ao final, apesar do esforço dos profissionais envolvidos, Morbius se revela uma grande oportunidade perdida, sendo um filme que até funcionaria melhor nos anos 1990, mas que agora soa datado, comprometendo a posição do personagem entre os outros deste universo narrativo, tanto nos filmes do MCU quanto no do “universo expandido” da Sony comprometida, dependendo do desempenho nas bilheterias para ser melhor ajustado nas continuações ou, para apenas virar cinzas à luz do sol, como um vampiro real...


O nível do CGI varia do muito bom ao  "passável", gerando momentos curiosos




Notas:
 
 

 
*1: A CMAA - Comics Magazine Association of America ou Associação Americana de Revistas em Quadrinhos, organização a qual foi atribuída a autoridade pela observância da aplicação do "Código dos Quadrinhos" (Comic Code Authority) foi criada na década de 1950 pelas editoras como uma forma de autocensura no conteúdo dos quadrinhos americanos, em resposta a uma recomendação do Congresso e ao clamor moralista insuflado pelo psiquiatra Fredric Wertham, autor do livro Seduction of the Innocent. Essa autorregulamentação modificou o conteúdo das revistas, a escolha de cores, temas e palavras. Todas que ostentavam o selo na capa estavam nesse padrão. O Comics Code surgido em 1954 era uma adaptação dos códigos existentes tanto na DC Comics, quanto na Archie Comics (editora que comandava a associação). A grande prejudicada com o Comics Code foi a editora EC Comics que publicava títulos de horror. Várias publicações da EC foram citadas por Wertham como de mau gosto. Como forma de evitar censuras na Revista Mad, a EC adotou um formato diferente das revistas em quadrinhos e passou para o "magazine", 21,5 x 28 cm, formato conhecido no Brasil por ser usado na Revista Veja
 
Fonte Wikipedia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Comics_Code_Authority
 
 

*2: Seguiriam-se ao surgimento de Morbius, a publicação dos títulos The Tomb of Dracula, Werewolf by Night, Frankenstein, entre outra spublicações com personagens de pegada mais sobrenatural, muitos deles participando regularmente da continuidade do Universo Marvel como o Motoqueiro Fantasma; o Homem-Coisa; Daimon Hellstrom, o filho de Satan; o Irmão Vudu, etc... 
 
 


*3: Os direitos foram conseguidos durante o período do final da década de 1990 quando a Marvel Comics, à beira da falência vendeu os direitos de filmagem de suas propriedades intelectuais à vários estúdios à preços considerados baixos, ficando a Sony com o Homem-Aranha, o Motoqueiro Fantasma, a Universal com o Hulk, a New Line com Blade, O Caçador de Vampiros (ironicamente a primeira adaptação bem-sucedida para a tela grande de um personagem da editora, sendo considerado o momento de virada da Marvel nos cinemas ) e a 20TH Century Fox com Demolidor, Quarteto Fantástico e X-Men, tendo estes últimos voltado agora para a Marvel Studios graças à compra de ambos os estúdios pela Walt Disney Company, ficando agora apenas o Homem-Aranha e seus personagens de fora do mesmo guarda-chuva corporativo.
 
 


*4: O filme estava programado para ser lançado em 31 de julho de 2020 nos Estados Unidos. Mas quando a pandemia de coronavírus começou a afetar a indústria cinematográfica, incluindo a participação nos cinemas, o lançamento do filme foi transferido para 19 de março de 2021, 11 de janeiro de 2021 e, finalmente, 28 de janeiro de 2022. A Sony Pictures posteriormente começou a mudar suas datas de lançamento para filmes de 2020 para 2021, incluindo Venon: Tempo de Carnificina, que teve sua data de lançamento mudada de 2 de outubro de 2020 a 25 de junho de 2021. Homem-Aranha: Sem Volta para Casa, outro filme associado ao Universo Cinematográfico Marvel foi reescalado para lançamento nos Estados Unidos de 16 de julho de 2021 a 5 de novembro de 2021 e novamente, em 17 de dezembro de 2021. Neste interegno muitas cena presentes nos trailers que davam um sentido narrativo coerente com a ordem de lançamento original dos filmes (como a da passagem de Morbius por um mural com o Homem-Aranha com a pixação “assassino”, entre outras...) acabaram ficando de fora da cópia final, comprometendo sua coerência interna narrativa.
 
 
 

 
*5: O personagem pode ser vislumbrado nos bônus do DVD de Blade: O Caçador de Vampiros (1998), em um final deletado, além de ter gerado o curta metragem Morbius: The Living Vampire (2014) de Adam Michaels.


 
"-Vampiro brasileiro... -Vou lhe lançar uma maldição!!!"

 
 
 

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