Motor batendo pino...
por Alexandre César
(Originalmente postado em 10/ 08 2019)
Filme é visualmente rico mas derrapa feio no roteiro
Algumas ideias são muito legais para serem ignoradas, como o conceito que seria o sonho tanto de aficionados por perseguições automobilísticas e distopias steampunk: grandes cidades caçando outras menores – sobre rodas! Mas, ainda assim não justificam ou sustentam um filme inteiro. O universo homônimo criado por Philip Reeve,nos apresenta um mundo bem diferente do nosso, onde os humanos vivem separados por colônias. Tudo mudou após a Guerra dos Sessenta Minutos, e com o tempo, o que eram os países, se tornaram construções sobre rodas, máquinas que servem para os humanos sobreviverem.
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Parece o "Castelo Animado" não? |
Estes gigantescos veículos, conhecidos como Cidades Tração, se alimentam de cidades menores para consumir seus recursos como combustível. Enquanto isso, o resto do mundo declara-se anti-tracionista – ou seja, recusa-se a transformar suas cidades em grandes máquinas motorizadas, a fim de preservar recursos. Por conta disso, Londres, a mais gananciosa das cidades sobre tração, forma uma agressiva frente de ataque ao mundo anti-tracionista para se reabastecer definitivamente. Promete não???
Dirigido por Christian Rivers (premiado técnico de efeitos visuais da trilogia O Senhor dos Anéis e de King Kong de 2005) Máquinas Mortais (2018) leva às telas este mundo pós-apocalíptico steampunk, a nova investida de Peter Jackson
como produtor se provou, em última instância, desinteressante e repleta
de clichês. Roteirizado por Fran Walsh, Phillipa Boyens e o próprio
Jackson, a trama poderia marcar o início de um novo universo
cinematográfico fantástico, tão adorado pelos fãs. No entanto, nem mesmo
o visual impecável é capaz de reverter a completa falta de carisma dos
personagens e da própria sociedade nele retratado, optando por criar uma
teia de personagens que, de alguma forma, estão todos relacionados,
complicando a progressão da aventura ao ponto de deixá-la entediante,
coisa que a longa duração também não ajuda...
A jornada da protagonista Hester Shaw (Hera Hilmar numa atuação morna) para se vingar do ambicioso Thaddeus Valentine (Hugo Weaving, dando substância a um vilão simplista,), assim como sua improvável parceria com o sonhador Tom Nathsworthy (Robert Sheehan, um coadjuvante com aura de protagonista, como um mix de Newt Scamander com Luke Skywalker)
parecem muito familiares, porque você já viu boa parte dos elementos
dessa história antes, em outro cenário. Se não em uma galáxia muito
distante, simplesmente em um romance adolescente qualquer.
Se Star Wars, O Senhor dos Anéis e Harry Potter são exemplos de narrativas em que a jornada do herói está dramaticamente mesclada com a premissa maior, que caminham para um grande desenlace final, onde os personagens mudam, em função de suas jornadas. Mas aqui, nada consegue ser imersivo o suficiente para que nos importemos com os personagens. Talvez o único que se salve seja Tom. Mas suas motivações e algumas cenas importantes, que definem o curso das decisões de Tom, beiram o patético.Quem de fato se sobressai além de Valentine é Anna Fang (Jihae), que quando aparece rouba a cena como a rebelde a única coadjuvante verdadeiramente interessante, conectada com a premissa-mor e baseada em conceitos que tornam-na uma personalidade pela qual minimamente nos importamos.
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Londres, a "Cidade-Estrela da Morte" com os seus habitantes Holigans... |
Se Star Wars, O Senhor dos Anéis e Harry Potter são exemplos de narrativas em que a jornada do herói está dramaticamente mesclada com a premissa maior, que caminham para um grande desenlace final, onde os personagens mudam, em função de suas jornadas. Mas aqui, nada consegue ser imersivo o suficiente para que nos importemos com os personagens. Talvez o único que se salve seja Tom. Mas suas motivações e algumas cenas importantes, que definem o curso das decisões de Tom, beiram o patético.Quem de fato se sobressai além de Valentine é Anna Fang (Jihae), que quando aparece rouba a cena como a rebelde a única coadjuvante verdadeiramente interessante, conectada com a premissa-mor e baseada em conceitos que tornam-na uma personalidade pela qual minimamente nos importamos.
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Tom Nathsworthy (Robert Sheehan) o herói (acreditem...),um figurante bonitinho e Hester Shaw. Casal!?? |
Talvez, se tivesse sido feito anos atrás, talvez os clichês não saltassem tanto da tela. Mas, agora, Máquinas Mortais
vale mesmo só pelo espetáculo visual. A história em si está longe de
encantar, pois introduzir o público a um universo cheio de nomes e
ideias não é fácil, e fazê-lo funcionar com naturalidade menos ainda.
Mesmo que a culpa não seja inteiramente de Boyens, Walsh e Jackson, que
partem de um cânone pré estabelecido ao longo de vários livros, a
adaptação do material para as telas é incapaz de construir conexões
convincentes entre seus personagens sem sacrificar o ritmo da jornada,
sendo um exemplo o caso de, se no passado, a Guerra dos Sessenta Minutos,
em que a tecnologia destruiu o mundo, ter sido uma consequência da
estupidez humana. Qual a razão para resgatar a mesma tecnologia
responsável pela morte de bilhões de pessoas? Mas se existe um material
original e que deve ser respeitado, ou seja, porque não busca-lo ao
invés dessa resposta negativa para tal questionamento?
O problema é tão sério que quando escolhem aprofundar elementos mais promissores da trama, miram no sci-fi imaginativo e acertam na comédia involuntária, como na história de fundo que liga Hester ao misterioso Shrike.
Por mais que esse trecho em especial ajude, de certa forma, a dar algum
tipo de tempero à insossa fantasia sci-fi que o precede – e, também,
incluir alguns efeitos práticos decentes na mistura -, acaba virando o
caso ideal para uma trajetória de acasos ordinários que urge alguma
coesão inexistente, contudo, se interessa, na verdade, unicamente pelo
relacionamento amoroso entre os personagens centrais. “Você o ama?”
é a pergunta mais estúpida feita em toda a projeção e que piora a
isenção de charme do coprotagonista, sendo algo que exemplifica quão
perdida a adaptação está em busca de elementos que a diferenciem de
outras produções do gênero – além das cidades com rodas, é claro. Isso
só piora assim que fica claro que Shrike está lá apenas para entregar um
MacGuffin
– ou seja, um objeto de importância à trama – para a protagonista. E
são muitos personagens à toa. O mal aproveitamento das ideias chega a
ser tanto que, após uma cena envolvendo Minions – sim, aqueles Minions
de Meu Malvado Favorito -, adorados neste futuro como “deidades americanas”, forçado merchandising,
mas que ainda sim poderia render divertidas piadas metalinguísticas
caso se investisse um pouco nessa interpretação errada de nossa era. Mas
param no merchandising jogado...
A
melhor das batalhas é aquela que abre o filme, com uma geografia bem
estabelecida e uma trilha incessante que remete diretamente a Mad Max: Estrada da Fúria
(2014) uma obra-prima de ação objetiva e ininterrupta - a escolha de
Junkie XL como compositor não chega a surpreender, e ele novamente
aposta em uma percussão pesada e ruídos excessivos para conferir mais
gravidade e impacto às perseguições e batalhas.
Caso
focasse mais no deslumbre visual possibilitado por seu universo e
apostasse em uma narrativa mais simples, o filme burlaria um roteiro bem
furado, com escolhas e saídas fáceis e muita incoerência. Há claramente
uma falha gigantesca na direção do filme, que contudo, nos momentos em
foca em sua carnificina metálica, entrega o que promete. As imagens
geradas por computação gráfica são refinadas e bastante expressivas, ao
ponto de despertar uma curiosidade por uma nova aventura neste universo
que, até o momento, mal se justificou nas telonas, o que fará o filme
cair no esquecimento e provavelmente por um bom tempo fará esta grande
oportunidade de transposição de um rico universo ficcional passar
despercebida.
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Acreditem, tem até uma cena de "atacar dentro da Estrela da Morte"... |
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O visual lembra as ilustrações de Rodney Mathews e de Chris Achileus... |
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