A caminho da... glória?!?
por Alexandre César
Super-herói paspalho da Netfix dá mais um passo
Iniciando de onde terminou a temporada anterior, o atrapalhado Javier (Quim Gutiérrez de Vale) ou melhor “Titã” o único super-herói da Terra (estamos lascados!) vê embasbacado Lola (Clara Lago de O Passageiro) sua namorada (com quem ia levando o relacionamento na “meia-boca”) uma repórter de site frustrada que, após a sua primeira entrevista constatou que o “super-herói“ é um tolo sem-noção, e questionando a sua competência para o papel, ao tomar uma das pílulas de poder de Javier, demonstrou compatibilidade e inclusive, maior gama de poderes! Assim Javier, vê embasbacado sua posição ameaçada, enquanto José Ramon (Adrián Pino de Ikaro) o tímido ex-estudante vindo do interior para se preparar para um concurso público para ser Juiz (e que acabou virando seu sidecick) e a alucinada Julia (Catarina Sopelana de Matadero) a amiga “maluquinha” de Lola, que eufórica, vê uma chance de juntas fazerem a diferença como a “policia do karma” que até o momento tentava de forma patética corrigir as injustiças cotidianas (não que dali em diante conseguissem de fato fazer algo realmente significativo).
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Lola (Clara Lago) e "rodinhas": Ela decide que se, Javier pode ser um super-herói, por que não ela??? |
Assim,
neste clima de “Guerra dos Sexos” se inicia a segunda temporada de O
Vizinho, série espanhola da Netflix, criada por Miguel Esteban
(Locomundo), Raúl Navarro (El Intermedio) baseada nos quadrinhos de
Santiago Garcia e Pepo Pérez (El hombre Esponja) e dirigida por Raúl
Navarro, Mar Olid (O Sucessor), Ernesto Sevilla (Capítulo 0) e Victor
Garcia León (Vamos Juan), aliando a comédia no melhor estilo Almodóvar à
uma divertida crônica de costumes, e ampliando nesta temporada este
universo narrativo fugindo um pouco da realidade dos habitantes de um
prédio de padrão popular suburbano em Madri (coisa bem familiar ao
público brasileiro, dadas as similaridades com a nossa realidade
bairrista cotidiana) e investindo na jornada de amadurecimento de Javier,
quanto à seu lugar no mundo e junto à aqueles que lhe são importantes.
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A prefeita de Madri (Gracia Olayo)capitaliza dividendos políticos em cima de "Titâ" |
Personagens como Camello (Denis Gómez de Amor sacro) o junkie do prédio que cria a sua própria erva, Alícia (Paula Malia de Cites) noiva de José Ramon (agora um pouco menos reprimida quanto a sua sexualidade) fazem participações pontuais, mas têm um menor destaque do que na temporada anterior, havendo maior participação de Adolfo (Aníbal Gómez de Torrente 5) dono do bar que todos frequentam e onde se reúnem um grupo de “livres pensadores”, adeptos de teorias da conspiração estapafúrdias, que passa a ser frequentado por José Ramon e pelo misterioso “Tucker” (Javier Botet de O Que Ficou Para Trás), que junto com sua amada Greta (Cecilia de Molina de Longe de Você) logo revelam grande relação com as origens e os poderes de “Titã”. No episódio final inclusive, Adolfo faz o inspirado discurso de que “-Ver a realidade por um segundo justifica uma vida inteira no escuro.” Inspirado o cara, não?
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Julia (Catarina Sopelana) e Lola começam a combater as injustiças em dupla, com desdobramentos "curiosos" |
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O astro da TV "Fran" (Fran Perea) por uma série de equívocos, se torna "o rosto" do super-herói, atraindo a atenção da mídia |
Na disputa pelo posto de herói (e das pílulas que dão o seu poder), Javier e Lola vão competindo de forma patética, sendo ele aliciado pela maquiavélica prefeita de Madri (Gracia Olayo de O Noivo da Minha Amiga) que torna o super-herói oficialmente o “Filho Predileto” da cidade, e capitaliza o fato para conseguir que a cidade se candidate à sede das próximas Olimpíadas e, descobrindo a sua identidade secreta, manipula-o, inclusive abrindo-lhe um canal para vender as camisetas que fazia, e que ninguém da clientela do bar comprava (o seu “calcanhar de Aquiles”), e que o coloca em choque com a “policia do karma”, já que as atrapalhadas ações de Lola e Julia contra as “Sportere” (as casas de apostas) de “Andoni” (Andoni Ferreño de 5 Viudas Sueltas) que proliferam em cada esquina da cidade, e que, ele é o principal patrocinador da candidatura da cidade para sede das próximas Olimpíadas. Some-se a isso “Fran Perea” (Fran Perea de Balada do Amor e do Ódio) um ator de novelas e seriados (que no passado foi o colega de escola que Javier invejava porque “pegava todas as garotas”) que passa a encarnar a “face pública” de “Titã”, por ser mais bonito, bem apessoado e articulado (diferente do atrapalhado Javier...), terminando com consequências tragicômicas. Ao final, após um início “living la vida loca”, a dupla feminina não se revela mais eficiente do que a masculina, derrapando na falta de uma visão maior do que a do próprio quarteirão.
Ao longa desta segunda temporada a dinâmica das duplas Javier-José Ramon versus Lola-Julia permeia a estrutura narrativa, de comédia sitcon, temperada com a latinidade ibérica, que se reflete no ritmo ágil da narrativa, que talvez pelo modesto orçamento, é despretensiosa das típicas vocações grandiosas dos seriados norte-americanos, refletindo-se em seus personagens, cujo “mundo” é o seu bairro, e no máximo, a sua cidade ou província.
A produção teve um bom acréscimo na boa maquiagem dos alienígenas que aprecem na trama (inclusive um reptiliano, ou na verdade um belatrixiano, uma das raças mais agressivas deles) à cargo de Isabel Auernheimer (O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio) e em alguns takes mais espetaculosos graças aos efeitos visuais do estúdio El Ranchito. O desenho de produção e a direção de arte de María Sanchez Moreno (La señora Brackets, la niñera, el nieto bastardo y Ema Suárez) e a decoração de sets de Sonia Castro (As Telefonistas) contrasta a simplicidade do terraço do prédio e dos apartamentos dos protagonistas com a elegância fria do escritório da prefeita e do apartamento descolado de “Fran Perea” definindo a diferença destes com o mundo suburbano de cores vivas, mas nada excessivamente berrante, de seus “heróis” (ou do universo burocrático dos alienígenas).
A fotografia de Eva Díaz (Los Europeos), David Valldepérez (El árbol) e Enrique Silguero (La reina del pueblo) enfatiza as diferenças deste universo de pessoas simples e ordinárias em suas confusões cotidianas, sem perspectivas pessoais ou, trabalhistas (os chamados “ni ni” *1), cujo ritmo da edição de Mikel Garmilla (Os Favoritos de Midas) e Victoria Lammers (Pátria) ora é rápido, ligeiro, e às vezes mais contemplativo, sem artificialismos, embalado pela música de Pablo Parser (Brigada Costa del Sol) e Jamie Summer que intercala temas populares espanhóis como "Um año más" do Mecano, "Mi Fabrica de Baile" de Joe Crepusculo, "El enemigo ahora vive em todos nosotros" do Mucho, com outros hits como "Em el muelle de San Blás" do Maná e "Karma Police" do Radiohead ou "David Duchovny" do Zahara.
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E agora, um alienígena! Agora a trama começa a ficar mais... "cósmica" |
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E José Ramon descobre entre os aliados da prefeita, um reptiliano, da terrível raça dos belatrixianos (dos mais perigosos dentre eles) |
Os figurinos de Rosa Solano (La Casa de Papel) mantém o aspecto mezo “Power Ranger”, mezo “Chapolin Colorado”, de “Titã” (que ao final ganha a sua contraparte, tal qual o Homem-Formiga e a Vespa) mantendo as roupas largadas de Javier e o look conservador e sem estilo de José, o sidecick, de Javier, enquanto as criações de trajes da dupla Lola & Julia, são bizarras, realçando o ridículo do conceito de “traje de super-herói feito em casa” mantendo a tônica visual dos personagens centrais cujo look cotidiano de segunda mão contrasta com os modelitos bem cortados da prefeita e o aspecto estudadamente despojado e free style de “Fran Perea”, um ator estiloso...
Ao final O Vizinho em sua segunda temporada não poupa seu protagonista de rever a si mesmo como um cara de mais de trinta anos que não sabe lidar com as obrigações e os relacionamentos da vida adulta (“pero no mucho...”) que trabalha e “morcega” sempre que pode, e precisando dar uma guinada para crescer, e não perder o amor de sua vida, bem como seus amigos, provando de uma vez, que a escolha do alienígena moribundo (no melhor estilo Lanterna Verde) para herdar seus poderes e uniforme para proteger o universo não foi obra de um acaso idiota do destino; até pelo elemento que (até esta temporada,) enfatizava a sua inutilidade, justamente pela sua ausência: Um vilão, que nos é revelada nos dois últimos episódios, terminando num clifhanger que deverá, se não torná-lo alguém mais responsável, pelo menos em alguém não tão desarticulado. Eu não apostaria muito, mas...
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Ao final temos uma dupla, pois trabalho não irá faltar |
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"Eles Vivem:" Os herói ganham óculos para revelar reptilianos (belatrixianos), com resultados surpreendentes |
Nota:
*1: Os chamados “ni ni” (“nem nem”) são os jovens que, pela redução das oportunidades de trabalho e pela retração da economia desde antes da crise e 2008 “nem trabalham, nem estudam” vivendo subempregados e, em decorrência de tal panorama, costumam ter vidas profissionais, pessoais e afetivas pouco estruturadas com relacionamentos tênues.

"-Ficamos bonitos na foto não, gata???"

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