terça-feira, 25 de maio de 2021

À ferro e sangue, muito sangue! - Crítica - Anime: Castlevania - 4ª Temporada

 

Chegou a hora, mortais...

 
por Alexandre César


Animação da Netflix se conclui em grande estilo

 

 

 
Quase quatro anos depois de sua estreia, no já distante ano de 2017, Castlevania chega à sua conclusão. O final desta saga com sua premissa simples - a jornada de três protagonistas se unindo para enfrentar o Rei dos Vampiros: o último guerreiro de sua linhagem, Trevor Belmont (voz de Richard Armitage, da trilogia O Hobbit); a Maga Oradora Sypha Belnades (voz de Alejandra Reynoso, de Artificial) e Alucard (voz de James Callis, de Battlestar Galactica), o filho mestiço do poderoso Conde Drácula - deixa no fandon uma pontada no peito. 

Embora esteja fora deste mundo, os vampiros ainda tentam reviver Drácula

Drácula (Graham McTavish) e sua esposa Lisa Tepes (Emile Swallow) continuam no Inferno

 
Desde seu início, a série foi introduzindo mais personagens, com tramas complexas que se revelaram maiores que iam além de tentar acabar com um poderoso inimigo. A notícia de que a série chega ao fim é um momento delicado para o espectador, pois, apesar de muitos terem sido conquistados pela qualidade da animação e suas sanguinolentas cenas de ação (de uma violência gráfica ímpar), o seriado (baseado nos jogos da Konami) sempre teve muito mais a oferecer, consolidando a sua posição como uma das melhores animações já produzidas pela Netflix. E, se por um lado há tristeza em dizer adeus ao anime, com seus personagens marcantes e a seu universo especial, por outro é possível celebrar uma conclusão de algo que se encerra em alto nível, investindo em suas virtudes para contornar (e superar) suas falhas eventuais. Afinal, pior do que um final, é um mal final. O que aqui, não é o caso.
 
 
Separados: Trevor Belmont e Sypha Belnades prosseguem em sua jornada lutando um dia de cada vez...

...enquanto Alucard está solitário e desiludido, à um passo do fundo do poço

 
A última temporada da série, criada e escrita por Warren Ellis (Red; Aposentados e Perigosos) e dirigida por Sam Deats (A King´s Tale: Final Fantasy XV) e Amanda Sitareh B. (Obtuary: A Grave Begning), recomeça seis semanas após o apoteótico final da terceira temporada, mostrando um clima de tensão, com a Wallachia entrando em colapso e mergulhada no caos pelo embate de várias facções. Algumas buscam tomar o controle e outras almejam trazer Drácula (voz Graham McTavish, de de Preacher) de volta do mundo dos mortos. Ali ninguém é quem parece ser ou pode ser confiável. 
 
Na Styria, Carmilla (Jaime Murray, de vermelho) traça planos, que Morana (Yasmine Al Massri, de amarelo), Lenore (Jessica Brown Finlay, de branco) e a gigante Striga (Ivana Milicevic) deverão executar
Lenore e o escravizado Hector (Theo James) até amadurecem o seu relacionamento
 
 
Trevor e Sypha (mais do que assumidos como casal) seguem de cidade em cidade caçando criaturas da noite e lidando com o fato de que muitas vezes os piores monstros são humanos. Eles continuam a enfrentar as repercussões de tudo que viveram e seguem em frente, embora seu relacionamento não fica imune, pois nesta jornada (que dura toda a temporada), além de ter de lidar com tudo o que encontram pela frente, precisam impedir o retorno de Drácula e sua esposa Lisa Tepes (voz de Emile Swallow, de O Mandaloriano), que continuam presos no inferno, como também encontrar um direcionamento para seu futuro. Alucard, por conta da desilusão que teve no final da temporada anterior (quando se abriu para Taka e Sumi, e foi traído) está caindo na melancolia. 
 
 
Striga e Morana questionam seus papéis neste novo mundo arquitetado por Carmilla

Impacto: Carmilla mostra num momento-chave que é bem mais do que apenas uma sedutora

 
Enquanto o trio está separado, na corte de Styria, Carmilla (Jaime Murray, de Defiance), embora supere a sua vocação de vilã megalomaníaca à lá Game of Thrones, segue com seus preparativos para o ousado plano de conquista da Europa. Ela delega as funções de campo para a gigante guerreira Striga (voz de Ivana Milicevic, de Banshee) e a cerebral Morana (voz de Yasmine Al Massri, de Quantico). Embora tenham surgido como figuras menores na corte de Carmilla, essas duas trouxeram complexidade ao núcleo, questionando o seu papel nos acontecimentos e tiveram um bom final de arco, ainda que aquém do que prometia. 
 
 

O forjador de criaturas da noite Isaac (Adetokumboh M´Cormack) retorna triunfal


Isaac fecha seu arco narrativo, reinventando-se e chegando a um entendimento com Hector

 
Temos até um amadurecimento (um tanto rápido é verdade) do relacionamento de Hector (voz de Theo James, da trilogia Divergente), que deixa de ser apenas um traidor arrependido, com Lenore (voz de Jessica Brown Finlay,  de Admirável Mundo Novo), que se revela mais do que apenas uma manipuladora gentil. É poética a cena final entre os dois, que parece um mix do final de 30 Dias de Noite (2007, de David Slade0 com Blade II: O Caçador de Vampiros (2002, de Guillermo del Toro). Em momentos como esse a bela música de Trevor Morris (Vikings) sabe cativar e embalar os fãs, reforçando o lugar de Castlevania em nossa memória afetiva. 
 
 
A direção de arte do anime continua um dos seus grandes trunfos, criando ambientações elegantes, grandiosas e funcionais...

... mas sem chamar demasiadamente atenção para si, se integrando organicamente na narrativa

Correndo por fora, Isaac (voz de Adetokumboh M´Cormack, de Diamante de Sangue) organiza suas forças e, por conta de suas experiências anteriores, pausa sua marcha por vingança. Ao permanecer na vila que invadiu na última temporada, ele encontra mais propósito em reconstruir do que em destruir, coroando de maneira bem feita a sua jornada. Essa mudança tem grande importância no seu destino e no de Hector, apontando para um novo rumo para as vidas dos dois forjadores.  

 

Alucard, inicialmente isolado no castelo de seu pai...

...se une à Greta (Marsha Thomason), líder dos Danesti, para defender sua aldeia contra as criaturas da noite


Temos personagens novos introduzidos à trama, sendo a maioria com pouco impacto ou carisma. Um dos destaques é Greta (voz de Marsha Thomason, de NCIS: Los Angeles), a líder dos Danesti, que luta pelo povo de sua vila contra os ataques das criaturas noturnas, fazendo par com Alucard. O vampiro Varney (voz de Malcolm McDowell, de Laranja Mecânica) possui bons momentos, embora sua trajetória pareça meio corrida, pois inicialmente é um personagem deixado meio de lado para só depois engrenar. Ratko (voz de Titus Welliver, de O Mandaloriano) e Dragan (voz de Matthew Waterson, de Halo: The Fall of Reach), outros vampiros novos, não são realmente trabalhados ao longo da temporada, fazendo apenas o que o roteiro precisa, não se tornando personagens de fato. E por fim, temos Zamfir (voz de Toks Olagundoye, de Castle), protetora de Targoviste que a todo custo procura salvar a corte subterrânea da cidade, revelando uma triste história de negação em face às adversidades. Sua caracterização, porém, não é suficiente para torná-la verdadeiramente relevante para a trama.

Quem retorna é Saint Germain ( Bill Nighy) e descobrimos mais sobre o seu passado e seu grande amor, relacionado...

... ao Corredor Infinito, passagem para diversas realidades no tempo, espaço e além que lhe cobrará um ato preço

Em determinado momento, Saint Germain (voz de Bill Nighy, das cineséries Piratas do Caribe e Anjos da Noite) reaparece, e descobrimos mais sobre seu passado e o que ele fez após suas aventuras com Trevor e Sypha. Focado em seu grande objetivo - o Corredor Infinito e a tentativa de usá-lo para reencontrar sua amada - irá pagar um alto preço. O seu dilema moral é o que realmente valoriza a sua participação na temporada. 


Varney (Malcolm McDowell): inicialmente apenas um vampiro falastrão, que se revela bem mais perigoso ao final

Trevor Belmont amadurece como homem e como herói, assumindo o legado de sua família

Os arcos narrativos da maioria dos personagens evoluíram, pois se tornaram tão importantes quanto o trio principal. Equilibrar as tramas de todos esses personagens se mostrou complicado, mas acrescentou camadas e peso dramático ao conjunto, embora, pela falta de tempo, algumas histórias tenham ficado pelo meio do caminho. Tantas tramas paralelas em andamento acabou se mostrando o ponto forte e o calcanhar de Aquiles de Castlevania

 

Desenho de Produção: O design do castelo de Drácula, continua dando incríveis fundos...

....mesclando o estilo gótico, com surrealismo e uns toques de M.C.Escher

A ambientação, criada pelo desenho de produção de Sam Deats, ainda é inspirada e as cenas de batalha continuam cinéticas, auxiliadas pela edição de Adam Deats (Henry Danger Motion Comic) e Keith Wahrer, que mantém o ritmo narrativo em constante movimento, mas no ritmo certo. Nem acelerando demais e nem diminuindo em função do que a trama pede.

 

Redenção: Ao abrigar e proteger os Danesti, Alucard encontra o senso de pertencimento que tanto faltava em sua vida

Casal: Trevor Belmont  e Sypha Belnades galgam o maior passo em sua jornada

Castlevania começou com problemas para organizar seus vários núcleos narrativos (muitas vezes errando ao longo do caminho). Mas, no cômputo final, existem mais motivos para elogios do que críticas. Nesta última temporada a equipe de produçãoo está no seu melhor, com o character design de Katie Silva (O Sangue de Zeus), Sam Deats, Lina Ngo (O Sangue de Zeus), Suzanne Sharp, Stephanie McCrea Rainosek (Independent Lens), Evgeny Lubaev (Seis Mãos), Adam Deats e Cindy Crowell (Red vs. Blue) trabalhando bem os personagens em suas características, permitindo que nunca os percamos de vista no meio da ação. O design de fundos de Daniel Araya, Bo Li, Sean Randolph (O Sangue de Zeus), José Vega (Trail of Ashes) e Stephen Stark trabalha bem as palhetas de cores , a luz e a atmosfera dos ambientes, com a habilidade que as equipes de animação da Powerhouse Animation Studios e da Tiger Animation já demonstraram nas temporadas anteriores. 

Fascinante, e até otimista, esse final grandioso garante que a série será lembrada com carinho, apesar de seus deslizes ocasionais. Embora não seja possível ignorá-los, existe um grande mérito em finalizar tudo de maneira coerente, equilibrando a narrativa com grandes momentos de ação e lutas sangrentas e incríveis.

 
Juntos somos mais fortes: Trevor Belmont, Alucard e Sypha Belnades enfrentam o desafio final, concluindo suas jornadas, para que se iniciam outras....

... pois muitos segredos ainda se encerram nas paredes do castelo do Conde Drácula...
 

São vários os sentimentos causados pelo fim e, com inegável satisfação, vemos uma boa resolução para esta história. É mais do que adequada a escolha do castelo do Drácula, pai de Alucard - o dono do palácio e seus arredores -, para o início desse novo começo para todos os sobreviventes. Quem acompanhou a jornada até aqui não pode perder o último capítulo, que traz uma boa surpresa para os fãs da série (ou mesmo dos games, que já somam mais de 30 jogos*1) ou das origens literárias do icônico antagonista, deixando a possibilidade de um novo cenário para essa história*2.

 

"- Foi um estranha jornada não???"


Notas:
 
*1: Ao total são 30 títulos de vidogames da franquai lançados desde 1986. Alguns com descendentes dos Belmont e outros com protagonistas sem laço de parentesco com os personagens originais, que encontram artefatos dos Belmont e saem para combater vampiros e monstros.
 
 *2: Foi anunciado que haverá uma nova série que ocorre dentro do universo de Castlevania, também produzida pela Netflix.
 


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