
Famílias disfuncionais, relacionamentos tóxicos e o adeus...
por Alexandre César
(Originalmente postado em 15/ 10/ 2019 )
E Daniel Rand se despede acertando o passo
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Davos (Sacha Dawan) e Danny Rand (Finn Jones): Irmãos de armas e rivais
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Desde que a Marvel /Netflix iniciou o seu ciclo de séries de “Heróis de Rua”, personagens que não gozavam do status
de um Homem de Ferro ou de um Capitão América mas tinham o seu nicho de
fãs e o potencial para histórias mais realistas, sem a necessidade do
suporte de uma superprodução, o seriado se mostrava um formato ideal
para este universo ficcional. Demolidor, foi o mais bem sucedido, seguido de Jessica Jones e de Luke Cage que tiveram méritos apesar de falhas ocasionais, seguidos em seguida de Punho de Ferro,
que se revelou o mais problemático, parecendo uma causa perdida para
muitos quando a série chegou no ano passado, sendo alvo de tantas
críticas e comentários negativos, que um segundo ano para muitos fãs
estava quase fora de cogitação.Mas, apesar dos pesares, a série
retornou, com um novo produtor (M.Raven Metzner que substitui Scott
Buck) e uma equipe técnica diferente e reduziu o número de episódios dos
13 iniciais para 10 no intuito de reduzir “adiposidades narrativas”... E
mostrou ser ainda merecedor de crédito apesar de tudo.
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Faceta 1: a Meiga "Mary" (Alice Eve) se encanta por Danny...
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A única motivação do Punho de Ferro até então havia sido a sua missão de derrotar o Tentáculo, algo que foi definitivamente eliminado na 1ªTemporada de Os Defensores , mas ao contrário de Jessica Jones, Luke Cage ou do Demolidor,
Danny Rand (Finn Jones, mais à vontade no personagem) não tinha
temáticas alternativas muito bem definidas para explorar em sua própria
série e, findo o Tentáculo,
as gangues de Chinatown preencheram o vácuo existente, disputando o
domínio do crime na cidade, ficando de um lado os Carrascos e de outro,
os Tigres Dourados, sendo o controle das docas o motivo dos primeiros
conflitos entre essas organizações criminosas.
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Faceta 2: ...mas dando lugar à fria e letal Walker (Alice Eve). Devemos em futuro próximo, ver mais "alguém"...
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Pela necessidade de dar uma razão de ser ao herói, nada melhor do que voltar aos elementos de K’un-Lun para
firmar a sua identidade de herói marcial. Embora tecnicamente superior,
a segunda temporada é muito vinculada à primeira, de onde vem o seu
grande vilão, Davos (Sacha Dhawan), bem como todos os elementos que
constroem a nova narrativa. São 10 episódios e dois arcos de histórias.
No primeiro, se constroem as alianças e suas motivações, culminando no
terceiro capítulo, onde são reveladas as intrigas, seguidos do arco
seguinte, mais interessante, onde as tramas se interligam.
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Davos para atingir seu intento se alia a Joy Meachum (Jessica Stroup à direita) e inclusive, rompe seus votos...
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Há alguns momentos para agradar os fãs dos quadrinhos, como por exemplo, a polícia categorizar como 616 as chamadas quando se trata de “possível suspeito com habilidades”. Esse é o número do universo principal da Marvel Comics, bem como nos flashbacks de Danny e Davos em K’un Lun, os vemos com uma versão do traje e da máscara icônica do personagem, elemento cuja ausência na 1ª Temporada e em Os Defensores fêz muita falta, pois um herói sem o seu uniforme, perde muito de sua identidade.
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Fanservice: Vemos finalmente a máscara icônica do personagem.
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Um
dado que persiste é a questão dos relacionamentos tóxicos e abusivos
marcando seus personagens, fornecendo explicações para muitas de suas
atitudes, como no caso a perseguição obsessiva de Davos (nos quadrinhos,
o Serpente de Aço) a conseguir (roubar) o poder do Punho de Ferro,
do qual ele não considera que Danny seja digno, levando-o a assumir
cada vez mais um comportamento cruel e impiedoso e, em contradição com a
filosofia de K’un-lun (como um capanga diz ironizando: “- ele é um vegetariano que mata gente!”), fruto da cobrança opressiva de sua mãe que impunha-lhe a obrigação de ou ser “O Imortal Punho de Ferro”,
ou ser um fracasso completo! Nesta linha, também ganham novos contornos
os irmãos Ward e Joy Meachum (Jessica Stroup e Tom Pelphrey), cujos
acontecimentos da primeira temporada ainda influenciam seus
comportamentos, passando um certo ar de dubiedade. Pelphrey, em
especial, oferece bons momentos, revelando a Joy o quanto a relação
abusiva com o seu pai Howard o marcou, levando ao vício e a um
comportamento auto-destrutivo e vampirizante quanto à irmã,
surpreendendo quando se relaciona com Danny, revelando um querer deixar
para trás sua persona babaca. Ela, ao aliar-se à Davos no primeiro arco
revela a revolta para com Danny e com o irmão por terem-na deixado à
parte quanto à verdadeira situação das famílias Rand e Meachum, bem como o
seu voltar atrás mostra a sua confusão sobre que atitude deveria ter
realmente tomado.
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Os flashbacks em K’un-Lun enriquecem a narrativa sobre a relação dos antagonistas
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Abuso
traumático também está vinculado à grande surpresa da temporada, uma
personagem que aproveitou ao máximo sua presença: Mary Walker (Alice
Eve, ótima, entregando a melhor performance na carreira) . Sua atuação,
similar a de James McAvoy em Fragmentado (2017), rouba a cena ao mostrar uma personagem com transtorno de personalidade múltipla, sendo uma Alice, meiga, romântica, fofa, e a outra Walker,
uma mercenária fria e calculista. Ao longo da temporada, do primeiro ao
último episódio, pois a sua caminhada é relacionada a uma situação de
aprisionamento em zona de guerra e o consequente abuso a que as mulheres
costumam ser submetidas neste contexto. É nesse ponto que a série se
conecta com Vingadores a Era de Ultron (2015) e Capitão América: Guerra Civil (2016) pois ela é uma combatente aprisionada em Sokovia. Criada por Ann Nocenti e John Romita Jr. Em 1988 nas páginas de Demolidor, A personagem Mary Alice Walker é a vilã Mary Typhoid que ainda deve dar as caras e gerar muita dor de cabeça pois se indica que “alguém” (que não era nem Alice e nem Walker) salvou a combatente dos guerrilheiros sokovianos, com requintes de crueldade. Esperemos se vai rolar...
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Girl Power: Misty Knight (Simone Missick) e Coleen Wing(Jessica Henwick). Boas na amizade...
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Nesta temporada sentimos a ausência da Enfermeira Noturna (Rosario Dawson) que até então costumava ser o elo de ligação entre todos os personagens do universo de séries Netflix/ Marvel, mas temos a presença de Misty Knight (Simone Missick) que menciona os eventos passados na última temporada de Luke Cage, inclusive questionando os rumos tomados por seu protagonista.
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... melhores ainda na pancadaria. Veremos algum dia "As Filhas do Dragão"???
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Uma
grande sacada também desta temporada foi dar um maior protagonismo a
Colleen Wing (Jessica Henwick), transformando a personagem em uma
co-protagonista, tornando Punho de Ferro numa
série sobre os dois, numa decisão muito acertada. Transformar Colleen
em uma descendente de Wu Ao-Shi (a Rainha Pirata de Pinghai, primeira a
invocar o poder supremo de K’un-Lun) não apenas inseriu sua
transformação no cânone, como abriu novas possibilidades. Caso possam
retomar esse universo ficcional, haverá a oportunidade de mergulhar de
vez nas águas da Wuxia, gênero de fantasia chinesa que mistura lutas ao fantástico – inclusive preparando terreno para uma versão das Filhas do Dragão, série da Marvel nos quadrinhos, com Colleen Wing e Misty Knight, que juntas são sócias da Knightwing Restorations uma
empresa de fachada da sua agência de investigações, e nesta temporada
demonstram ótima química entre as suas intérpretes suplantando em muito
até o protagonista principal.
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As meninas inclusive seguram melhor a onda do que os "manos" Luke Cage (Mike Coulter) e Danny Rand
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A Segunda Temporada se mostra mais eficiente nas coreografias de luta (graças a Clayton Barber de Pantera Negra ) e, sendo uma continuação bastante conectada à primeira, encerra as pontas de um passado problemático e até... “chato”,
que faz a inclusão de uma nova personagem mas com argumentos bons, não
verdadeiramente empolgantes. Porém, foi um avanço se comparada à
Primeira Temporada. Embora tenha todos os arcos fechados com coerência, o
final da série deixou (muito bem) portas para novos rumos a serem
trilhados, como a capacidade de seus protagonistas conseguirem inserir
seu chi em objetos, como a Katana empunhada por Colleen, ou as armas que
Danny aprende a utilizar (fazendo citação a Orson Randall, um dos Punhos de Ferro do passado). Uma vez que a Marvel/ Netlix anunciou o encerramento das séries do personagem, bem como de Demolidor , de Luke Cage , ainda não tendo se pronunciado sobre Jessica Jones , O Justiceiro ou Os Defensores ,
só podemos esperar se estas pontas em aberto ainda serão de alguma
forma fechadas nestas séries ou em longa-metragens solo ou se a Marvel migrará seus personagens para o serviço de Streaming da Disney, cujo foco até o presente seria o de um público “mais família”, bem diferente do público-alvo dos seriados em parceria com a Netflix.
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Ferramentas energizadas: O "Shi" pode fluir de um punho para uma katana...
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Esperemos as rodadas de negociações corporativas para saber se Danny Rand irá ou não tornar-se definitivamente (mesmo!!!) O Imortal Punho de Ferro.
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...ou para pistolas!!! Que venha uma maior demonstração desse poder!
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