segunda-feira, 8 de maio de 2023

Visionário cósmico - In Memorian: Jean "Moebius" Giraud

 


Passageiro do universo e além...

por Carlos Vinicius Marins
(Postado originalmente em 08/ 05/ 2018)

Uma unanimidade mundial na história das HQs


Moebius: quadrinista revolucionário



Uma unanimidade nos quadrinhos, sempre ao pensarmos tanto nas vastas paisagens do oeste americano, quanto em mundos oníricos e fantásticos, tendo estes dois mundo distintos em comum, a amplidão de seus horizontes. Amado por desenhistas, diretores de cinema e é claro, leitores, por seu traço elegante, ora limpo, ora carregado (dependendo do projeto) e pleno de inventividade. Marca de Jean Giraud, o Moebius (   08 de maio de 1938 - 10 de março de 2012) um dos mais revolucionários quadrinistas da França e do mundo, tendo grande atuação também no cinema.

Na sua vasta obra, ele também é conhecido pelos pseudônimos que usou: Gir e - principalmente - Moebius. É considerado o segundo quadrinista franco-belga mais influente de todos os tempos, perdendo apenas para Hergé, o criador de Tintim. No cinema ele contribuiu com design conceitual e storyboards para filmes, como Alien, Tron e O Quinto Elemento (este último, claramente inspirado em sua produção de HQs de ficção científica).

Ele começou sua carreira antes mesmo de completar 18 anos. Sua primeira HQ publicada foi Frank et Jeremie em 1956 para a revista em 1956 para a revista Far West. Não demorou para publicar seu trabalho em outras revistas da época, como Sitting Bull, Fripounet et Marisette, Âmes Vaillantes e Coeurs Vaillants. Mas interrompeu sua trajetória artística para prestar serviço militar. Quando deu baixa conseguiu vaga como aprendiz no estúdio de Joseph Gillain, o Jijé - um dos maiores autores do mercado franco-belga de quadrinhos e criador do Fantásio da dupla Spirou Et Fantasio

 

Tenente Blueberry, de Gir: faroeste da melhor qualidade


 

Na década seguinte, o roteirista de HQs Jean-Michael Charlier estava a procura de um ilustrador para uma nova série de western que pretendia desenvolver para a Pilote, revista da qual era um dos fundadores e que se tornara uma das maiores referências de quadrinhos na Europa. Jijé então lhe indica seu jovem assistente Jean Giraud, que tinha lhe auxiliado com HQs do cowboy Jerry Spring para a lendária revista para a lendária revista Spirou. Assim surgia as aventuras do Tenente Blueberry nos quadrinhos, intituladas inicialmente como Fort Navajo. Considerada uma das melhores HQs de faroeste de todos os tempos, a série começa a ser lançada em 1963, mas começa a se destacar de fato depois de 1968, quando começam a afrouxar as rígidas regras instituídas na França pela Lei de 1949 sobre publicações destinadas a jovens. A série acaba assumindo o nome de seu personagem principal, prossegue mesmo após o falecimento de seu roteirista original e se desdobra em outras séries que mostram a juventude e o envelhecimento de Mike S. Blueberry no Velho Oeste Norte-Americano - nem todas com a presença de Jean Giraud. 

 

Major Fatal, de Moebius: Divisor de águas na ficção científica


 

Nestas aventuras de Blueberry, Jean Giraud utiliza Gir como pseudônimo. Apesar de ter surgido ainda nos anos 60, a alcunha Moebius começa a ser realmente conhecida a partir de 1974, quando ele funda a editora Les Humanoïdes Associés com o escritor Jean-Pierre Dionnet, o quadrinista Phelippe Druillet e o empresário Bernard Farkas. Inicialmente o foco da editora era HQs de ficção científica e lança a revista Metal Hurlant, revolucionado o gênero nas HQs e inspirando autores e publicações em todo o mundo (a revista ganhou uma versão oficial norte-americana que se tornou ainda mais conhecida mundialmente que a original: a Heavy Metal). Como Moebius, Jean Giraud assinou a capa da primeira edição, que já contava com uma aventura de Arzarch e as primeira páginas de uma de suas maiores obras: A Garagem Hermética de Jerry Cornellius ou As Aventuras do Major Fatal. Enquanto Jean Giraud usava o pseudônimo Gir para suas aventuras de faroeste, Moebius - utilizado na nova revista - se tornou sinônimo de HQs transcendentais de ficção científica e fantasia. 

 

Incal: saga alucinante e desmedida


O destaque seguinte de sua trajetória artística ocorre após ser convidado pelo escritor, dramaturgo, músico, filósofo, ensaísta e cineasta chileno Alejandro Jodorowsky para participar de um dos mais ambiciosos projetos cinematográficos já concebidos: uma versão para tela grande dirigida por Jodorowsky do clássico romance de SciFi Duna, de Frank Herbert. O filme contaria também com gente do quilate de H.R. Giger, Dan O'Bannon, Pink Floyd, Orson Welles, Mick Jagger, Salvador Dalí e David Carradine. Sem conseguir financiamento dos grandes estúdios de Hollywood, que consideraram a obra megalomaníaca e hermética demais, Jodorowsky decidiu dar vasão as suas ideias e criatividade através dos quadrinhos, capitaneados por Jean Giraud. Assim surgiu a alucinante e desmedida saga do Incal, uma obra-prima da FC que, assim como ocorreu com Blueberry, se desdobra em novas sagas que ocorrem antes e depois da história inicial, além de um complexo universo ficcional que apresenta outras sagas estreladas por personagens coadjuvantes da saga original e que também se desdobram através do tempo em novas aventuras. O Incal foi o ponto alto da parceria Jodorowsky/Moebius, mas não foi a primeira grande obra que fizeram juntos. Criada antes pela dupla, existe a genial graphic novel Olhos de Gato. Também como ocorreu com Blueberry, Jean Giraud não se envolveu em todos os desdobramentos da série Incal. Na realidade ele se sentia esgotado com as demandas das duas sagas e chegou a cogitar parar de fazer quadrinhos. Para nossa sorte, isso não se concretizou. Ele acabou inclusive voltando a trabalhar mais tarde com ambas as séries. 

 

Surfista Prateado: Moebius made U.S.A.


 

A saga do Incal também foi publicada originalmente na Metal Hurlant, já nos anos 80. Nessa época seu trabalho já era bastante popular nos Estados Unidos devido a publicação dos trabalhos que assinava como Moebius na Heavy Metal. Ele se mudou para a Califórnia e tentou abrir uma nova frente de divulgação de sua obra se associando a Marvel Comics, que publicou uma boa parcela de sua obra através de seu selo autoral, o Epic. O artista então decidiu produzir uma mini-série em duas edições para a Marvel em colaboração com seu mais emblemático roteirista: Stan Lee. Ao saber que iria fazer uma HQ desenhada por Moebius, Lee não teve dúvidas: a história seria estrelada pelo Surfista Prateado, o personagem da Casa de Ideias criado por ele que melhor se enquadraria na arte do francês. Moebius gostou da experiência, tinha grande vontade de produzir através do chamado “Método Marvel”. A HQ ganhou o Prêmio Eisner em 1989 de melhor mini-série. 

 

O Mundo de Edena: a última grande saga de Moebius


 

Seu último ambicioso trabalho nos quadrinhos foi O Mundo de Edena. Criado inicialmente com o nome de The Star como uma encomenda da Citroën, que queria um brinde criativo de fim de ano para seus clientes, a história acompanha dois protagonistas sem gênero definido numa jornada pelo espaço em um Citroën até alcançarem um estranho mundo descrito como um “Jardim do Éden” em outra galáxia. A história acabou estimulando o autor, que se perguntou o que ocorreria a seguir com aqueles dois. A partir daí ele desenvolveu outro complexo universo, que inclusive colide com o que desenvolvera para A Garagem Hermética de Jerry Cornellius, contando inclusive com a presença disfarçada do próprio protagonista daquela obra, Major Grubert ou Major Fatal.

Idolatrado no mundo todo, com admiradores como Federico Felini e Hayao Miyasaki, sua obra continua influenciando artistas dos mais diversos gêneros no mundo. 

 

Arzach: uma das séries mais longevas de Moebius


 

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