Ação, Família e Suspensão de Descrença
por Alexandre César
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A Grande Família Toretto recebe as bençãos de Abuelita (Rita Moreno de pé) a matriarca do clã |
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Dominic Toretto (Vin Diesel) compartilha com sua avó Abuelita, as suas inseguranças |
Após os percalços das duas primeiras sequências*1, a franquia estabeleceu suas bases atuais protagonizadas por Toretto e O’Conner a partir de Velozes & Furiosos 4 (2009), dirigido por Justin Lin (Star Trek: Sem Fronteiras). Passando do conflito inicial a parceria, a dupla ainda esteve à frente das aventuras em Velozes & Furiosos 5: Operação Rio (2011) e Velozes & Furiosos 6 (2013), ambos também dirigidos por Lin. A cooperação ente eles só se encerrou em Velozes & Furiosos 7 (2015, de James Wan), devido ao falecimento de Walker num acidente de carro ainda durante as filmagens*2.
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"A vingança é minha": O cruel Dante Reyes (Jason Momoa,), se lança numa jornada de vingança contra os Toretto |
Durante este percurso, a adição ao elenco de Dwayne “The Rock” Johnson a partir do filme 5 levou a uma rota de colisão entre os dois astros parrudos, ficando a franquia pequena para seus egos. Então Johnson saiu para o spin-off Velozes & Furiosos: Hobbs & Shaw (2019, de David Leitch), levando consigo outro astro, Jason Statham (na franquia desde o filme 6). Apesar do sucesso, especulações do potencial para gerar suas próprias continuações independentes, o longa ainda não tem sequências previstas. Dwayne e Statham foram fazer o spin-off após Velozes & Furiosos 8 (2017, de F. Gary Gray). O filme Velozes & Furiosos 9 (2021), com Justin Lin retornando à direção e Diesel como protagonista soberano, traz Statham de volta, mas Dwayne permaneceu de fora e foi em busca de outros ares.
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Reyes, toma para si a infraestrutura da Ciberterorista Cypher (Charlize Theron) arqui-inimiga dos Toretto, levando à uma aliança improvável |
E chegamos ao mais recente produto da série, agora nos cinemas. Se você curte um filme de ação desenfreada e hiperbólica, totalmente despirocado, para assistir com o cérebro desligado (ou nocauteado...), Velozes & Furiosos 10 (2023), de Louis Leterrier (O Incrível Hulk), é feito para você!!!
Sendo um filme-síntese da franquia, por ele podemos dizer que a série é um amálgama de filmes da Marvel e da DC Comics. Só que, enquanto os filmes de super-heróis cada vez mais procuram apresentar maior seriedade e uma visão “pé-no-chão” (tal qual James Bond) para que seus personagens estabeleçam uma relação mais próxima com o público, Toretto & Cia. foram na direção oposta. Eles abraçam com braços e pernas o conceito de cada vez “mais e maior”, provando que, em sua defesa de tese brucutu, quando se têm galões de óxido nitroso se pode tudo e que verossimilhança, coerência e leis da física, são “coisas de maricas”... Perdoem o tom politicamente incorreto.
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A hacker Ramsey (Nathalie Emmanuel) e Tej Parker (Ludacris) vão para Roma... |
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...chefiados por Roman (Tyrese Gibson) , que pela primeira vez lidera uma missão |
Dominic Toretto e sua cada vez maior família enfrentam agora um resquício de suas aventuras no Brasil (filme 5). O cruel e alucinado Dante Reyes (Jason Momoa, de Aquaman), filho do finado narcotraficante brasileiro Hernan Reyes (Joaquim de Almeida, de Warrior Num), surge com fogo nos olhos e querendo vingança contra os Toretto, numa trama que vai de Roma ao Rio, passa por Portugal, Inglaterra e Antártida, em um tom divertidíssimo e assumidamente idiota. Não duvido que o roteiro de Dan Maseau (Fúria de Titãs 2) e Justin Lin, que assinam a história, tenha sido escrito usando o Chat GPT ou algum outro tipo de I.A...
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Ramsey e Han (Sung Kang) seguem com a missão, apesar de seus pressentimentos |
A interpretação de Momoa é histriônica e exuberante, com suas unhas pintadas, passos de balé e um senso de cafonice digna do Coringa, e para mostrar que é "mau como um pica-pau", ele de cara invade a sede de Cypher (Charlize Theron, de O Escândalo),
a ciber-terrorista e arqui-inimiga dos Toretto, e rouba boa parte de
sua equipe e mainframe, levando-a a propor uma aliança a Dominic, que
tem grandes contas a ajustar com ela (matou Helena, a mãe do filho dele....). É evidente no filme o contraste da performance mais contida de Diesel, se levando a sério, assumindo ares de coach motivacional com a descontração de Momoa, que revela ter se divertido a baldes com seu personagem, pois enquanto ele "toca o terror", Toretto se mostra o pai dedicado do pequeno Brian (Leo Abelo Perry, de Doze é Demais),
seu filho surgido no filme anterior e que agora tem uns 12 anos.
Toretto está ensinando-o a dirigir, fazer “cavalos-de-pau”, e “sentir o
carro”. Provavelmente mais dois filmes e ele estará como um operativo
ativo da equipe...
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O atentado em Roma é digno de um videogame daqueles bem fora da casinha |
Após um típico churrasco de domingo dos Toretto, abençoado com a presença de Abuelita (Rita Moreno, de Amor, Sublime Amor), a matriarca da família, reencontramos Dominic e Letty (Michelle Rodriguez, de Dungeons & Dragons: Honra Entre Rebeldes) curtindo seu casamento. Ainda reencontramos nesta festa, a caçula Mia Toretto (Jordana Brewster, de Simulant), a esposa do agora ausente Brian O’Conner. Junto com eles, revemos a equipe: o “ex-falecido” Han (Sung Kang, de Power), a dupla Roman (Tyrese Gibson, de Corrida Mortal) e Tej Parker (Ludacris, de Crash: No Limite) e a hacker Ramsey (Nathalie Emmanuel, de Game of Thrones). Após a reunião, o grupo sai para uma missão que se revela uma armadilha, arrastando Dominic e os outros em um processo onde acabam sendo tachados de terroristas. Dominic Toretto retorna ao Brasil, esta terra sem-lei, e num “pega” (com direito à cantora Ludmila como “race girl”) ocorre o primeiro confronto entre os novos adversários e Dante deixa claro, de forma dramática, que Dom não pode salvar a todos.
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Queenie (Helen Mirren) alertaa Dominic Toretto sobre as estratégias de Dante Reyes |
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O jovem Brian Toretto (Leo Abelo Perry) é protegido pelo "tiozão" Jakob (John Cena) |
Marcando o que parece ser o início da reta final da franquia, o filme tem pequenas participações de velhos conhecidos dos fãs: Queenie (Helen Mirren, de Shazam: Fúria dos Deuses), seu filho casca-grossa Deckard Shaw (Jason Stathan, de Megatubarão), o tiozão Jakob Toretto (John Cena, de Pacificador) - que está de guarda-costas de Brian - e o “Pequeno Sr. Ninguém” (Scott Eastwood). Entre as adições de destaque, temos do lado da agência governamental o linha-dura Aimes (Alan Ritchson, de Titãs) e Tess (Brie Larson, de Capitã Marvel), filha do finado (até agora) “Sr. Ninguém”, e que, contra todas as evidências, aposta na inocência da equipe.
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No Brasil, Dominic conhece Isabel (Daniela Melchior) a irmã de Helena, mãe de seu filho |
A música de Brian Tyler (Super Mario Bros – O Filme), tal qual um carro, acompanha a mudança de marcha narrativa, ora com temas vibrantes (mas não memoráveis), ora adicionando trechos de músicas clássicas - como “O Lago dos Cisnes”, de Tchaikovski -, acompanhando a zoação de Dante.
Neste jogo de gato-e-rato, a edição de Dylan Highsmith (Star Trek: Sem Fronteiras) e Kelly Matsumoto (Velozes & Furiosos 9) deve ter penado para conseguir com tantos personagens (as filmagens foram difíceis) dar algum sentido a narrativa. Ela vai ora picotando a ação, ora criando planos mais longos, aproveitando a plasticidade das cenas. A fotografia de Stephen F. Windon (Agente Oculto), de tons quentes, valoriza bem as paisagens “brasileiras” (uma mescla de calçadão de Copacabana com a Avenida Lúcio Costa da Barra da Tijuca e favelas de estúdio) e as várias ruas de Roma. O desenho de produção de Jan Roelfs (Periféricos) e das equipes de direção de arte aproveitam bem suas locações e criam versões genéricas dos países retratados. A decoração de sets caracteriza, principalmente nos cenários “brasileiros”, imagens de estereótipos, como a casa de favela de Isabel (Daniela Melchior, de O Esquadrão Suicida), que tem antigos retratos ovais dos velhos familiares e uma TV de tubo! A própria favela, numa mescla de locações e cenários em estúdio, com CGI arrematando, tem ares de uma versão com recursos e realismo (mas não realidade...) da vila do Chaves.
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Letty (Michelle Rodriguez) passa por maus bocados, tendo de fazer alianças indigestas |
Os figurinos de Sanja Milkovic Hays (Capitã Marvel) lidam com a caracterização dos personagens dentro dos seus estereótipos, destacando-se os modelitos de Dante, como sua jaqueta e botas de couro de Cobra. Eles refletem toda a sua breguice de novo-rico, mostrando que Momoa, de fato, entendeu o que o filme pedia para funcionar.
Os efeitos visuais de Double Negative (DNEG), Freefolk, Industrial Light & Magic (ILM), Lidar Lounge e Outpost VFX são competentes, mas com aquele ar de videogame. Um exemplo está na sequência do atentado em Roma, onde temos uma versão maior e ampliada (e muito!!!) daquela bola de Caçadores da Arca Perdida (1981), que parece uma versão em miniatura (e em chamas) da Estrela da Morte.
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Tess (Brie Larson) a filha do "Sr. Ninguém" aposta na inocência de Toretto & Cia. e os ajuda |
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A direção de arte do "Brasil" aposta naquele estereótipo a que estamos acostumados |
Com seu final dramático e inconcluso na melhor tradição de O Império Contra-Ataca (fora a cena pós-créditos que promete uma conclusão apoteótica para a saga), Velozes & Furiosos 10 aposta na eventual passada de bastão para uma nova geração, que deverá gradativamente ser incorporada à Grande Família Toretto, seguindo a tradição de jogar às favas frescuras como as já citadas coerência, leis da física e verossimilhança, mostrando que os desenhos da Warner são coisa do passado. Deverá ser um exemplo daquelas obras que quem gosta verá e quem não gosta verá também, só que para poder falar mal...
As apostas estão feitas! Que seja dada a largada.
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Bola 7 na caçapa do meio: No atentado em Roma, a mina rolante tem mais tempo de tela do que muitos nomes do elenco |
Notas:
*1: A primeira continuação, +Velozes + Furiosos (2003, de John Singleton), contou apenas com Walker no elenco, pois Diesel estava comprometido com outro filme: A Batalha de Ridick (2004), pertencente a outra franquia que o ator gostava mais. Toretto só retorna na cena final do filme seguinte, Velozes & Furiosos: Desafio em Tóquio (2006, de Justin Lin), pois a escolha de Diesel não tinha dado certo financeiramente e ele precisava de maior visibilidade.
*2: Para a conclusão das filmagens e dar um fechamento a trajetória de O’Conner, a produção usou os irmãos de Walker (com CGI mudando suas feições) e cenas não usadas do ator em filmes anteriores da franquia. O personagem, porém, não morreu. Ele se retira do grupo para cuidar dos filhos, deixando em aberto seu possível retorno de alguma forma.
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"AOO IINFINIITOOO EE ALÉÉÉMMM!!!" |
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