quarta-feira, 2 de março de 2022

A volta por cima - Crítica - Séries: Pacificador - 1ª Temporada

 


Arco de redenção bronco

por Alexandre César


James Gun e John Cena se superam em série espetacular

 


Durante um período em que esteve de quarentena num hotel em Vancouver, Canadá, durante a pós-produção de e O Esquadrão Suicida, James Gunn (Guardiões da Galáxia) teve a ideia de que o personagem Pacificador poderia render um seriado que lhe permitiria discutir muitas questões pertinentes, que não poderia desenvolver num filme. Aproveitando o tempo ocioso, Gunn pôs a ‘Mão na Massa’ e em poucos dias tinha os roteiros, que submeteu a HBO Max. Rapidamente o canal lhe deu OK, e mal finalizou a aventura dos super-criminosos em Corto Maltese, já estava engatilhando o novo projeto, que se mostrou um acerto do início ao fim.
 
 
Christopher Smith (John Cena) o Pacificador e Eagly, sua águia e melhor amigo


Dirigido por James Gunn, Brad Anderson (O Operário), Jod Hill (Minha Primeira Caçada) e Rosemary Rodriguez (Jessica Jones) a partir dos roteiros escritos por Gunn, Pacificador se mostra uma série sagaz, cujo humor negro, escatológico e muitas vezes bobo (sabendo a hora certa de ser bobo...) se revela uma grande surpresa, satirizando e criticando o gênero super-heróico e o status quo vinculado a ele, colocando o dedo na ferida do lado doente da sociedade americana e, ocidental.
 
 
Adrian Chase (Freddie Stroma) o Vigilante aqui é beem diferente das HQs

Clemson Murn (Chukwudi Iwuji) recruta o Pacificador para a sua equipe
 
 
Acompanhamos o bronco Christopher Smith (John Cena de O Esquadrão Suicida) recebendo alta do hospital, após sua missão em Corto Maltese, e sendo designado por Amanda Waller a integrar uma unidade chefiada por Clemson Murn (Chukwudi Iwuji de Olhos que Condenam) agente de poucas palavras, tendo o suporte de dois conhecidos da missão passada: A bela (e casca-grossa) Emilia Harcourt (Jennifer Holland de Beauty Juice), uma eficaz agente de campo; o geek neurótico John Economos (Steve Agee de Violet). Fechando a unidade, a insegura Leota Adebayo (Danielle Brooks de Orange is the New Black) que acabe se descobrindo mais capaz para o ofício do que imaginava. A missão do grupo é localizar e eliminar uma célula e infiltração das “borboletas”, alienígenas que usando hospedeiros humanos, estão se misturando à sociedade, no intuito de dominar o mundo, o que Smith descobre da forma dolorosa na sua primeira noite, gerando uma caçada humana, colocando os detetives Sophie Song (Annie Chang de Anatomia de Grey) e Larry Fitzpatrick (Lochlyn Munro de Riverdale) em seu encalço, numa verdadeira comédia de erros tal é a sucessão de roubadas em que o grupo se mete.
 
 
A equipe de Clemson Murn tem alguns rostos conhecidos de Smit...
 
 
Revelando a paixão de Gunn por usar personagens de terceiro e quarto escalão para fazer o que quer (pois assim ele pode modifica-los narrativamente ao seu bel-prazer...) temos ainda Adrian Chase (Freddie Stroma de Bridgerton) o Vigilante, aqui um completo débil mental e alívio cômico e autor de verdadeiras pérolas do non sense, e o Judo Master (Nhut Lee de A Casa da Raven) o menos desenvolvido, embora responsável por ótimos momentos de luta. Possivelmente deverá ter mais espaço na próxima e já confirmada temporada.
 
 
... como o geek neurótico John Economos (Steve Agee)...

... e Emilia Harcourt (Jennifer Hollan) que não dá confiançaà suas cantadas

 
Do elenco de apoio ainda temos personagens como Jamil, o faxineiro do hospital (Rizwan Manji de Mira, A Detetive do Reino); Keeya Adebayo (Elizabeth Faith Ludlow de Godzilla II: Rei dos Monstros) esposa de Leota; O hilário casal disfuncional Evan (Lenny Jacobson de For All Mankind) e Amber Calcaterra (Alison Araya de Maid); o sinistro operativo Caspar Locke (Christopher Heyerdahl de Van Helsing), o vizinho (Mel Tuck) do pai de Christopher que vive discutindo com ele sobre o que é ser um herói; e o venal Augie Smith (Robert Patrick de O Exterminador do Futuro II: O Julgamento Final) pai de Christopher e líder supremacista, que o criou desde criança para ser uma arma, legando-lhe traumas profundos...
 
 
Outra adição ao grupo é Leota Adebayo (Danielle Brooks), filha de Amanda Waller

 
Aqui Gunn demonstra maestria ao mostrar o quanto uma orientação doentia pode prejudicar uma mente em formação, pois Augie ao treinar e forçar Chris por volta dos seus 8, 10 anos, a lutar (e matar) tal qual um adulto, acaba por fazer com que ele cresça assombrado por seus atos, incluindo a morte acidental de seu irmão Keith (Liam Hughes de Star Trek: Discovery). John Cena cria um personagem complexo, que por trás de seu jeito brucutu sem-noção, esconde camadas de crise existencial por se reconhecer um indivíduo vazio, encapsulado nos anos 80 e na ilusão da “América grande”, tal qual os trumpistas e supremacistas das manifestações de Charlotsville e da invasão do Capitólio.
 
 
As "Borboletas" usam hospedeiros humanos, mas precisam de alimento de seu planeta...

... tendo como guarda-costas o pequeno mas letal Judo Master (Nhut Lee)

 
Da mesma forma que seu protagonista, que gradativamente vai galgando uma escalada de redenção, não isenta de conclusões estúpidas (próprias de um neanderthal) todos os personagens também evoluem ao longo da série, uns mais e outros menos, demonstrando tal crescimento, ser fruto de uma boa carpintaria dramática.
 
O vizinho (Mel Tuck) do pai de Christopher toda hora o desafia a provar que ele é de fato um herói, comparando-o à medalhões do universo DC
 
 
Os valores de produção são de ótima qualidade, embora dentro de um orçamento de série de TV, com a fotografia de Michael Bonvillain (As Crônicas de Shannara), Sam McCurdy (Carnival Row) e Michael Wale (iZombie) adotando algumas vezes, de forma sutil, um tom semidocumental semelhante a séries como The Office, descrevendo a equipe disfuncional, auxiliada pela edição de Greg DÁuria (Velozes & Furiosos 9), Fred Raskin (Era Uma Vez Em... Hollywood!), Greg Featherman (Gatunas) e Todd Busch (El cártel) mantendo um ritmo dinâmico, mas não histérico, sabendo quando reduzir e acelerar o ritmo e evitando picotar os planos das cenas de ação, mantendo a localização geográfica dos elementos.
 
 
Ele até se apresenta numa escola no "Dia das Profissões" querendo provar ser um herói...

...mas a marca da criação de seu pai Augie Smith (Robert Patrick) o assombra

 
 
Visualmente, o desenho de produção de Lisa Soper (O Mundo Sombrio de Sabrina) caminha entre o realista (e o brega, como o carro de Chris, pintado como a bandeira americana), com inserções do fantástico, como o laboratório de Augie Smith, dentro de sua casa, mas é um “depósito de desdobramento quântico, que leva a um nódulo dimensional fora do espaço normal” ( simples, afinal é o universo DC!!!) de forma pontual, junto com a direção de arte de Catherine Ircha (Desventuras em Série), Shannon Grover (O Predador), David Hadaway (Salvation) e Sheila Milar (O Alvo Principal 2) e a decoração de sets de Rose Goronzy (O Natal dos Darlingtons), Keith Hammond e Alexandra Rojek (Batwoman) inserindo easter eggs, referenciando o passado deste rico universo narrativo.
 
Uma série de erros coloca os detetives Sophie Song (Annie Chang) e Larry Fitzpatrick (Lochlyn Munro) na caça ao Pacificador

 
De forma semelhante, os figurinos de Shay Cunliffe (Westworld) e Karin Nosella (Espíritos Obscuros) segue a mesma linha, definindo os arquétipos narrativos e sociais destes personagens, que vivem num contexto de baixa classe média, ou classe trabalhadora, com trajes comuns sem grandes sofisticações. O traje do Vigilante, do Judo Master e do Dragão Branco.
 
 
Augie Smith confecciona os capacetes de Chris, cada qual com uma capacidade...

...mas logo as circunstâncias colocam pai contra filho, levando Augie (um líder supremacista) a assumir sua persona de Dragão Branco

 
 
A música de Kevin Kiner (Jane the Virgin) e Clint Mansell (Cisne Negro) é eficiente, e como todo trabalho de James Gunn tem grande mérito na trilha musical, que a seleção de Evyen J Klean (Euphoria) e Ian Broucek (Em Terapia) inclui hits como “7 o´clock” de Quireboys. Fora o tema da abertura “Do ya wanna taste it” de Wig Wam, “11 Street kids” de Hanoi Rocks, “The Both of Us” de House of Lords, entre muitas outras, justificando o que Chris diz que “Toda hora é hora de rock!!!”
 
 
A equipe parte para o ataque, numa cena em câmera lenta


 
Os ótimos efeitos visuais das empresas Crafty Apes, NVIZ, Proof Inc., Weta Digital supervisionados por Betsy Paterson (Carnival Row), Guy Williams (O Esquadrão Suicida), Aleksandra Sienkiewicz (Pantera Negra), Jordan Nounnan (Moonfall: Ameaça Lunar) e Nathan Abbot (Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis) tiram leite de pedra, apresentando personagens marcantes como Eagly, a águia mascote de Chris, Charlie, o gorila de dorso prateado, e a “vaca”, fonte da alimentação das “borboletas”, além dos efeitos físicos por Alex Burdett (Sombra e Ossos) que providenciaram as necessárias explosões tiros e toda a sorte de efeito prático.
 
Logo a situação vai se tornando explosiva para todos
 
E ao final, a Liga da Justiça chega, mas atrasada
 
 
Ao final, Pacificador termina sua primeira temporada em grande estilo, firmando a volta por cima de James Gunn, que se reflete nos rumos que Christopher Smith deverá trilhar em sua rota de redenção bronca, bem como na relação deste com os integrantes de sua equipe (e das relações destes com Amanda Waller...) que por mais bem sucedidos que venham a ser, nunca estarão isentos de confusões, mal-entendidos e erros grosseiros.
 

"-Até a próxima amigos!!!"


 

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