segunda-feira, 5 de julho de 2021

A outra "Viúva Negra" - Crítica - Filmes: Anna – O Perigo Tem Nome (2019)

 

Nikita 2.0

por Alexandre César

(Originalmente postado em 01/ 09/ 2019)


Luc Besson recicla uma de suas maiores criações

 

Apesar das similaridades com outras produções, o filme 
tem uma personalidade própria


Na antiga União Soviética, Anna (Sasha Luss), uma russa que vende matrioskas (bonecas russas) numa feira de bairro, é vista por um agente de modelos que vê na bela o perfil ideal que procuram. Assim, ela embarca para o mundo da moda, mas por trás dos flashes, descobrimos que ser modelo não é a sua única profissão, pois Anna é na verdade uma espiã e assassina da KGB, tendo eliminado vários alvos em várias partes do mundo. Ciente de sua beleza e sensualidade, Anna é tão mortal com uma arma na mão quanto estrangulando um amante na cama durante o ato. Suas ações em busca de uma saída dessa vida a farão jogar os serviços de espionagem tanto soviéticos quanto americanos uns contra os outros num jogo de xadrez em que cada lance na verdade esconde uma estratégia anterior, mudando a toda a hora a noção de “quem-está-manipulando-quem” ...


Anna (Sasha Luss) a simples vendedora de uma barraca em Moscou é descoberta por um "olheiro" de agência de modelos. Só que não...


 
Dirigido por Luc Besson Anna – O Perigo Tem Nome (2019) é um thriller de espionagem, que mistura Nikita: Criada para Matar (1990), Atômica (2017), e apresenta muitas similaridades com Operação Red Sparrow (2017) e uma pitada de John Wick (2014), e mais do que um bom filme de ação, a película vai prender a sua atenção com as inúmeras reviravoltas, que agradarão aos fãs de plot twists que fazem o jogo mudar repentinamente, surpreendendo a cada mudança de tempo e espaço.


treinada por Olga (Helen Mirren, de óculos) e Alex Tchenkov (Luke Evans) a bela se torna a "Fera"


Besson, que em sua filmografia, sempre apostou em rostos belíssimos para protagonizar suas produções… foi assim, com Nikita: Criada para Matar e a atriz Anne Parillaud, passando por O Quinto Elemento (1997) e Joanna D´arc (1999) com Milla Jovovich,até chegar em Lucy (2014), com Scarlett Johansson, e até no grande escorregão de sua carreira Valerian e a Cidade dos Mil Planetas (2017) com Cara Delevingne, todos filmes cujas protagonistas são mulheres que parecem saídas de uma passarela, mas capazes de lutar contra um exército de mercenários com as próprias mãos e, vencê-los sem quebrar o salto, mas apesar das expectativas, não vá esperar um filme erótico de espionagem, pois apesar de um ou outro momento, as coisas seguem em um ritmo diferente, privilegiando o “jogo-de-gato-e-rato” da espionagem onde não haverá momentos de descanso para piscar.


Rapidamente Alex e Anna se tornam amantes, o que será uma constante na vida de Anna, que aprende a usar o sexo (ou a promessa dele...) para atingir seus objetivos

 
A estreante Sasha Luss é uma grata surpresa, como uma Anna inicialmente fragilizada, que ganha força e frieza ao entrar neste mundo de poder, violência e manipulação, e entendemos quem ela é, como era sua vida, e a razão que a fêz aceitar a proposta de se tornar uma agente infiltrada e assassina, pois vivia em 1987 uma vida simples, com um namorado criminoso, violento e manipulador, mas quando as circunstâncias lhe tiram tudo, não resta nada a não ser aceitar a proposta do espião da KGB Alex Tchenkov (Luke Evans),ela havia se inscrito na marinha e a KGB a encontrou e a livrou de tudo de ruim que ela passava (na verdade ela achava isso...) que lhe promete liberdade total e uma vida plena após cinco anos de trabalho com fidelidade (“- Mas eles me roubaram a liberdade!”  como ela repete isso o filme todo...).


Anna, a espiã, tal qual uma boa modelo, sabe se reinventar...

 
 
Com o tempo ambos se tornam amantes e a partir daqui, compreendemos amplamente a sua nova profissão, suas parcerias e as pessoas e os cenários utilizados para encobrir a sua verdadeira identidade. E assim, tal qual as matrioskas que vendia, a loira Anna, no decorrer do filme, vai se transformando de uma mulher em outra, mudando de cabelo varias vezes, entre outros disfarces, sendo o maior deles, o seu trabalho como modelo, se relacionando inclusive com uma colega, Maud (Lera Abova), para ser sua fachada, e assim a sua vida glamourosa chama a atenção de indivíduos poderosos, de comerciantes de armas a banqueiros ou diplomatas ou qualquer outro desafeto da espionagem soviética,matando um monte de pessoas em montagens especialmente boas, e ao mesmo tempo surreais.
 
 
Na sua primeira missão, Anna é deixada sozinha e desarmada, tendo de "improvisar"

 
 
O roteiro escrito por Besson não se incomoda em inventar razões para os assassinatos ao longo do caminho, e usa curiosos artifícios ao contar a história da espiã russa que vira modelo, que dão ao filme um ar de suspense bastante interessante, embora cometa o erro de não detalhar mais o treinamento da protagonista, o que nos faz o duvidar, em certos momentos, de suas habilidades, apesar da ser treinada pela atenta e escorregadia Olga (Helen Mirren, ótima), que vive pregando peças nela (como por exemplo entregar numa missão, armas descarregadas pra ela “se virar”...). Olga tem ótimas cenas e diálogos, especialmente quando ela desconfia de algo.


... e reinventar, como uma camaleoa, ou uma fêmea
 de louva-deus, que elimina os machos...
 
 
As bem sucedidas operações de Anna a colocam no radar do ardiloso agente da CIA Lenny Miller (Cillian Murphy) cria seu próprio jogo para descobrir quem está por trás de todas as mortes de seus operativos e faz um cerco convence Anna a tornar-se uma agente dupla, para roubar informações da KGB, mas na verdade ele cai nos seus encantos, e os dois se tornam amantes. Tanto Evans quanto Murphy têm boas atuações mas são mais presenças físicas do que arcos narrativos próprios, uma vez que o foco está na construção de Anna, cuja principal motivação é ser livre, e sair desse jogo entre espiões, pois o seu maior desejo é ficar sozinha, no Havaí e relaxar, sem nenhuma agência a obrigar a “trabalhar”...


lenny Miller (Cillian Murphy) o ardiloso agente da CIA que 
segue o rastro de Anna, mas quem é o gato e quem é o rato??
 
 
Os valores de produção são competentes, na medida do necessário, sem chamar atenção em demasia para si mesmos, (sendo todos colaboradores de Besson de longa data) como A música de Eric Serra (A Imensidão Azul, O Profissional), a fotografia de Thierry Arbogast (Nikita, O Quinto Elemento) Edição de Julien Rey (Lucy, Valerian), o desenho de produção de Hugues Tissander (Valerian, Joana D´arc) ou os Figurinos de Olivier Bériot (Lucy, Valerian) e temos de destacar a equipe de dublês e de coreografia, que fez com que Luss dê um show à parte de se acompanhar nas cenas de ação,– como quando agentes da KGB, tentam derrotar Anna com cassetetes em vez de usar armas, ou quando Anna mata pessoas com pratos –onde talvez, por conta dos planos malucos, e as passadas de perna, só fiquem aceitáveis por conta do ritmo frenético que o longa apresenta nas cenas de ação, conciliando a complexidade da trama, as viradas na história com as traições mais mirabolantes, e o carisma de sua bela e fria protagonista.
 
 
Amor ou interesse: Anna engata romance com Maud (Lera Abova)
 colega de passarela, para manter a fachada, mas só ela sabe disso...

 
Ao final constatamos que Anna – O Perigo Tem Nome é ao mesmo tempo confuso, e bem decidido nas suas reviravoltas, entregando uma produção com nada de novo e apenas fica no lugar comum,, mas tenta fugir um pouco do básico, nos envolvendo por tudo na narrativa, seja por sua protagonista sedutora, ou pelas cenas de perseguição, ou suas boas coreografias de lutas, num divertido e impactante quebra-cabeça, onde nunca sabemos quando teremos uma nova reviravolta na trama, e qual personagem irá passar o outro para trás, nesse xadrez mortal.

"-Quando eu digo para morrer, É PARA MORRER SEU @*&#!!!"
 
 
Obs: Um dado curioso que tenho observado é que poucas pessoas perceberam que a grande falha do filme é o uso da tecnologia digital mostrada em cena, que no período cronológico mostrado não bate. Vemos Anna quando era uma pobre mulher de bandido, saindo das drogas preenchendo um formulário on-line de matrícula na Marinha Soviética usando um Notebook bem similar aos atuais, em 1985! Ora, nesta épocas, os primeiros portáteis custavam algo em torno de $ 3.500,00 dólares e pesavam uns 12 kgs, sendo inacessíveis a pessoas de baixa renda como ela, e o boom da internet só se iniciou a partir do início da década de 1990, de acesso discado, quando o colosso soviético já havia desmoronado e, num sistem rígido como era a U.R.S.S., os cidadãos comuns jamais teriam acesso a algo descentralizado como a World Wide Web. Mais adiante vemos o agente Alex usando um celular de antena mais parecido com um modelo dos anos 90 do que os iniciais, de altíssimo custo e pesando cerca de 1,2 Kgs. Tudo bem que os soviéticos tiveram certo pioneirismo na telefonia, e um agente da KGB teria acesso a tecnologia de ponta, mas não como o mostrado no filme. Mais adiante, já em 1990, Anna usa um pendrive para copiar dados dos computadores da KGB e negociar a sua liberdade. Devemos supor que o volume de informação era alto, mas nesta época os primeiros USB 1.0 foram introduzidos em 1994 e os seus sucessores a USB Flash Drives foram introduzidos em 1998. O pendrive como estamos acostumados, para entrada USB 3.0, com o objetivo de suceder o disquete de 3½ (que havia sucedido a “bolacha” de 8, 5¼ ) e o CD só começaram a surgir no mercado por volta de 2000.



"-Só quero uma praia tranquila onde eu possa me deitar e passar o meu bronzeador fator 8.0..."


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