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quarta-feira, 30 de junho de 2021

Zoeira ao quadrado - Crítica - Filmes: Deadpool 2 (2018)

 

 

Fan Service em modo “Metralhadora Giratória”

por Alexandre César

(Originalmente postado em 17/ 05/ 2018)


Nova aventura do mutante zoado dá o que promete

 

Wade/ Deadpool (Ryan Reynolds) & Vanessa (Morena Baccarin): O amor é lindo...


Wade Wilson / Deadpool (Ryan Reynolds, surtado) está disposto a se tornar um homem sério (???), deixando de lado sua vida de mercenário psicopata, boquirroto e pá-virada para constituir família com a sua amada Vanessa (Morena Baccarin, maravilhosa) e tendo um filho. Lindo não?

 

"- Essa mansão continua vazia!!!"

 

Sim, só que aí o filme ia durar apenas 5 minutos e a plateia ficaria frustrada. Então...  

Russel (Julian Dennison): Pivô da (possível) futura tragédia


Dirigido por David Leitch (Atômica, de 2017), Deadpool 2 (2018) dá prosseguimento à saga do anti-herói mutante que procura a redenção para uma vida de violência ao tentar salvar o jovem Russell (Julian Dennison) do destino de, futuramente, tornar-se o mutante maligno Firefist. Isso o coloca em rota de colisão com o super-uber-soldado ciborgue/mutante Nathan Summers/Cable (Josh Brolin, caminhando para se tornar a Meryl Streep dos filmes Marvel - seja da própria Marvel Studios, seja através de algum outro estúdio que terceirize personagens da Casa de Ideias. Cable quer impedir a todo custo que, no futuro, Firefist mate milhares de inocentes devido a uma infância vítima de abusos que deturparão sua personalidade. 

 

Deadpool: X-Man... "estagiário"


Wade quer salvá-lo desse destino, impedindo o garoto de abraçar seu lado negro, enquanto Cable quer resolver tudo colocando uma bala na cabeça do moleque antes dele se tornar um monstro. Dramático, não?

 

Entre os heróis, o "normal man"...

 

Se fosse um outro filme Se fosse um outro filme Marvel qualquer teria um certo peso dramático; se fosse da “distinta concorrência” (DC) seria indubitavelmente trágico. Mas como é ) seria indubitavelmente trágico. Mas como é Deadpool, tudo é motivo de chacota, piadas de duplo sentido e com um humor gore de deixar Quentin Tarantino e Robert Rodriguez orgulhosos. 

 

Cable (Josh Brolin de novo...): Exército de um homem só

 

O filme é uma sucessão de referências à cultura pop, indo das aberturas estilosas dos filmes de James Bond ao universo dos quadrinhos e suas vertentes cinematográficas, fruto de um roteiro esperto (Rhett Reese, Paul Wernick e o próprio Ryan Reynolds) que não tem medo de literalmente jogar para a plateia. E faz isso de forma mais focada do que no filme anterior - que tinha um humor metalinguístico mais genérico, visando o grande público, fora do nicho dos quadrinhos e filmes. Aqui, apesar do apelo amplo, não há hesitação em se praticar o chamado fan service, compreensível a quem realmente conhece o personagem, o mercado de quadrinhos norte-americanos, o meio nerd e a cultura pop em geral. Talvez daí venham algumas das críticas negativas publicadas lá fora.

 

"X-Force": Tirando a Dominó (Zazie Beetz), um grupo descartável


No mais, além das novas faces - como a estilosa Dominó (Zazie Beetz, bem descolada) e a simpática Yukio (Shioli Kutsuna, fofa) - temos a equipe de sempre: Weasel (T.J. Miller), que continua a ser “o amigo que dá suporte”, mas, na realidade é frouxo como ele só; Dopinder (Karan Soni, hilário), o taxista indiano que cresce na sua esquisitice; Al, a cega (Leslie Uggams), que continua com a sua extraordinária capacidade de apontar a arma para as direções erradas. Do lado dos X-Men (que continuam misteriosamente sendo alguns gatos pingados habitando uma mansão vazia, apesar do orçamento maior), temos de volta Colossus (Stefan Kapicic), ainda com seu visual cartunesco, que agora caracteriza a sua bidimensionalidade; e Míssil Adolescente Megassônica (Brianna Hildebrandt), agora com um look mais transado, fruto da maior definição da personagem.

 

Yukio (Shioli Kutsuna) e Megasônica (Brianna Hildebrandt): A fofa e a invocada


 

A trilha sonora, capitaneada por Tyler Bates, conta com uma ótima seleção de hits marcantes e é algo à parte, sublinhando a ironia da narrativa. A fotografia de Jonathan Sela trabalha afiada com a edição de Elísabet Ronaldsdóttir e Mary Vernieu, otimizando a metralhadora giratória de referências, easter eggs, gags e toda a sorte de parafernália narrativa - do surgimento da X-Force, demonstrando como existem personagens inúteis no universo mutante, até cameos inesperados de astros em aparições-relâmpago. 

 

Entre as ameaças, o Fanático, quebrando tudo em seu caminho

 

Simplificando: Vá, veja e divirta-se. E, por tudo que é mais sagrado, não perca as cenas pós -créditos, quando nosso herói corrige algumas linhas temporais...


"Shh! Nada de spoilers!!!"


domingo, 27 de junho de 2021

Perseguidas..... - Crítica - Filmes: Meu Ex É um Espião (2018)

 


Ação "mulherzinha" e da boa!

por Alexandre César

(Originalmente postado em 23/ 08/ 2018)


Filme se apóia na boa química de suas protagonistas
 

Audrey (Mila Kunis) este meio na fossa, pois na plena comemoração de seus 30 anos, está sozinha, pois o seu namorado Drew (Justin Theroux) sumiu do nada há semanas e não responde aos seus zaps, coisa que a deixa por baixo, apesar de Morgan Freeman (Kate McKinnon) sua melhor (e sem-noção) amiga tenta reverter. Paralelo a isso e a alguns flashbacks mostrando como haviam se conhecido e iniciado um relacionamento tão promissor, acompanhamos o sujeito na Lituânia executando uma missão (e alguns oponentes no caminho...) no melhor estilo Jason Bourne, revelando algo que Audrey Ignora: Ele é um espião, e dos mais letais!
 
 
Drew (Justin Theroux) e Audrey (Mila Kunis): Casal fofo, pelo menos na cabeça dela.

Após a descoberta da real atividade do seu namorado, as duas acabam envolvidas numa trama em são perseguidas pela Europa, tentando entregar “o pacote”, que supostamente era seu troféu de uma liga imaginária de futebol. Entre as belas locações de cartão postal em Paris, Aústria e Hungria, as suas vidas passam a ficar por um fio entre situações insólitas e hilárias.
 
 
Audrey e a sua melhor amiga Morgan Freeman (Kate McKinnon), louca mas fiel, e que aproveita ter o nome do grande ator para fazer reservas em restaurantes...

 
 Assim podemos resumir Assim podemos resumir Meu Ex é um Espião (2018) de Susanna Fogel, que apesar de dirigido por uma mulher, demonstra fôlego nas cenas de ação bem coreografadas e bastante competência ao alternar as situações típicas de aventura de espionagem e comédia de ação, temperada com um jeito “mulherzinha de ser”, que agrada tanto ao público feminino quanto ao masculino.
 
 
Caçadas como terroristas as duas tentam entregar o "pacote"...

O roteiro de Susanna Fogel e David Iserson mescla em certos momentos ao longo do filme cenas de ação e de espionagem dividindo o espaço de tela com cenas de comédia romântica nas 2 horas de filme, com sequências de ação não voltadas para o lado cômico (com tombos e tropeços apenas no andamento natural das coisas) e não abrindo espaço para piadas e trocadilhos forçados. Era um recurso narrativo muito usado naqueles filmes do Rock Hudson com a Doris Day como se fossem dois filmes em um só, tendo as cenas de ação uma distância boa da mesma, facilitando a sua visualização e os pedaços de comédia com um toque mais delicado, focando nos closes, mostrando as expressões faciais e a reação de cada uma das personagens em cena.
 
 
Duffer (Hasan Minhaj) e Sebastian Henshaw (Sam Heughan): Dupla de agentes meio disfuncionais entre si.

No mais, o humor impera, fugindo à regra de que fusões de filme de espião com comédia acabam em filmes meio escrachados e bobos, seja na boa interação do elenco, com Kunis bela, sonhadora apesar de tudo, fazendo de Audrey uma fofa, seja pelo completo contraste com McKinnon que faz um ótimo contraponto/alívio cômico da sua surtada Morgan, cuja insistência no usar frases feministas consegue dar toques de empoderamento (não necessariamente da forma correta) criando graça justamente pela repetição e insistência da personagem em querer ser uma agente, ou quando conta se gabando sobre o seu suposto relacionamento com Edward Snowden. É uma descompensada, mas as duas formam uma dupla e tanto.
 
 
Wendy (a eterna Dana Scully de "Arquivo X" Gillian Anderson): Até as líderes de serviços secretos ficam stressadas.

No elenco, destaque para o elenco de apoio que sabe dar o seu recado aproveitando o tempo que lhe é dado, como dupla Sebastian Henshaw (Sam Heughan) o espião galã e Duffer (Hasan Minhaj) o espião indiano formando de Harvard, e a sua chefe Wendy (Gillian Anderson) com suas tiradas irônicas sobre a competência de seus operativos e ao avaliar a performance das duas malucas fazer aquela cara de “O que é que eu estou fazendo aqui?”, ou o motorista e DJ Lukas (Kev Adams) do ÜBER, ou a dupla Carol (Jane Curtin) e Arnie Freeman (Paul Raiser) pais de Morgan que nos mostram o porquê dela ser do jeito que é. Outros destaques são Lolly Adefope como Tess, amiga lesada das duas que faz declarações aos jornais quando as duas estão sendo caçadas como terroristas (veja as suas cenas ao longo dos créditos finais...) e a belíssima e exótica Ivanna Sakhno com Nadedja, a super-espiã-assassina cujos grandes olhos e caras e bocas de top model dão –lhe um “quê” meio alienígena . Cabe dizer que a cena em que ela de tocaia com fuzil e mira pergunta quem ela deve matar e o chefe fala: “-duas americanas idiotas!” e ele fica perdida porquê cada turista americana que ela mira no local é mais idiota que a outra, deixando-a agoniada sem saber o que fazer, vale o ingresso...
 
 
Nadedja (Ivanna Sakhno): Super-über espiã, assassina, torturadora, ginasta e top model. Pacote completo e perigo real e imediato..

 A música de Tyler Bates embala a aventura na medida certa, apesar de ficar no estritamente necessário, acompanhando a montagem de Jonathan Schawartz que encadeia bem as passagens sejam românticas, ou da mais alucinada ação ou do humor mais escrachado. A fotografia de Barry Peterson e o desenho de produção de Marc Homes, junto com a direção de arte, emolduram o ambiente onde a trama e seus desdobramentos se acumulam sem chamar muito a atenção para si, bem como os figurinos de Alex Bovaird definem bem as personagens, no início , com um tom casual e despojado, para ao final repaginar as nossas heroínas no melhor estilo Girl Power! E falar mais do que isso é desperdício. Vá e curta.
 
 
"-Estamos prontas para a próxima fase do game m0th3r f#ck3r!!!..."

 

sábado, 26 de junho de 2021

Acima de tudo vigarista! - Crítica - Filmes: A Grande Mentira (2019)

 

 

171, entre outros números...

 

por Alexandre César 

(Originalmente postado em 21/ 11/ 2019)


     Hellen Mirren e Ian McKellen em trama instigante

 


Abra bem os seus olhos...


2009. A bela viúva Betty McLeish (Helen Mirren, Oscar por A Rainha e de A Maldição da Casa Winchester e Velozes e Furiosos: Hobbs & Shaw) procura conhecer alguém num site de relacionamentos, e depara com o encantador Roy Courtnay (Ian McKellen das trilogias O Senhor dos Anéis e O Hobbit) que rapidamente ocupa espaço em sua vida, e apesar das reservas de seu neto Stephen (Russell Tovey de Quantico) ela investe nesse relacionamento, e como poderia ser diferente? Roy é charmoso, elegante, bem falante e divertido, e demonstra bastante apreço pela doce viúva, não fosse um pequeno detalhe: Roy é um golpista safado, que vive de ludibriar os outros, e que se fosse pego nos países islâmicos, não teria uma, mas as duas mãos cortadas. Embora planeje convencer a viúva a entrar num negócio fajuto, visando limpar seus substanciais fundos até deixá-la sem nada Roy começa a lutar com a ideia de estar realmente se afeiçoando a Betty, colocando-o num impasse.
 


Roy Courtnay (Ian McKellen) e Betty McLeish (Helen Mirren): Relacionamento em tempos de internet


Dirigido por Bill Condon (Oscar pelo roteiro de Deuses e Monstros que dirigiu com McKellen indicado como melhor ator) A Grande Mentira (2019) equilibra bem humor, drama e tensão numa história de golpes, expectativas e surpresas. McKellen, com a competência de sempre, nos mostra a forma como Roy, junto com seu parceiro de golpes Vincent (Jim Carter de Downton Abbey) cativa as suas vítimas, homens de negócios em busca de investimentos de lucro rápido (não importando se lícitos ou não...) na melhor tradição de “ladrão-que-rouba-ladrão”,e embora seja um personagem cativante rapidamente nos mostra que ele não exita no uso da violência para assegurar os seus ganhos ou para manter os seus disfarces, de forma rápida, contundente, e até letal, pois só porque é um velhinho simpático, não podemos esquecer que criminosos também envelhecem (e se estiverem na política, envelhecem e se aposentam muuito bem).


O neto de Betty Stephen (Russell Tovey) sente que Roy não é esse "Príncipe" que sua avó diz...

O roteiro de Jeffrey Hatcher (Sr. Sherlock Holmes) a partir do aclamado livro de Nicholas Searle (não publicado no Brasil) trabalha as circunstâncias do encontro entre esses dois idosos, com situações até previsíveis, dada a premissa simples da história, mas surpreendendo nas reviravoltas e nas motivações de seus personagens, bem como nas suas origens, mostrando o quanto um fugitivo pode se viciar na adrenalina de estar sempre fingindo ser quem não é, ou como adolescentes despeitados podem ser destrutivos em momentos históricos perigosos ou como pessoas esquecidas podem voltar do passado para ajustar contas. A vida sempre surpreende...


Roy tem como aliado Vincent (Jim Carter) em seus golpes na área financeira

 
A elegante fotografia de Tobias A. Schliessler (A Bela e a Fera) e a montagem de Virginia Katz (Sr. Sherlock Holmes) habituais colaboradores de Condon situam bem a trama e sua atmosfera, entre a casa de Betty num condomínio e os Nightclubs e apartamentos alugados que Roy usa para seus golpes, havendo uma mudança interessante na palheta de cores quando os protagonistas viajam para Berlim, e em alguns momentos ficando com um ritmo narrativo que remete à O Mistério de Berlim de Steven Soderbergh (2006) quando são revelados dados do passado de Roy.


Roy, escorregadio como só ele, faz de tudo para driblar Stephen


Reflexos: Roy esconde segredos sobre as suas origens...

O desenho de produção de John Stevenson (Burton e Taylor) capta o estilo cotidiano da casa rural e Betty, a falsa imponência dos escritórios de araque usados para golpes na área financeira e a passagem do tempo nos ambientes berlinenses da época e dos anos do antes e do pós-Segunda Grande Guerra de forma sutil, da mesma forma que os figurinos de Keith Madden (Patrick Melrose e Sr. Sherlock Holmes ) caracterizam as personalidades de seus personagens, seja na delicadeza dos vestidos de Betty seja na simplicidade dos trajes de Roy quando quer parecer “um bom velhinho” inofensivo que usa boina e guarda-chuva ou na imponência dos seus bem cortados ternos quando quer se passar por um poderoso banqueiro, como um camaleão, tudo com sutil elegância, se bem que, Mirren e McKellen são elegantes até mesmo como mendigos, não conseguem evitar...


Velho mas não indefeso: Roy mostra quando necssário ser perigoso e mortal

 
Condon, conduz a trama de forma eficiente, embalado pela trilha sutil de Carter Burwell (Três Anúncios para um Crime, Carol) que sublinha a ação seus intérpretes, sem chamar atenção para si, permitindo que “duelem” seja no gestual, ou num olhar, revelando certezas e dúvidas, mostrando que nem sempre o mais competente enganador é aquele que se orgulha de seus logros (“-Você não está nisso pelo dinheiro Roy!” lhe diz o seu amigo Vincent em certa altura “- É pela adrenalina do jogo!!!” ) e se julga verdadeiramente senhor de seus atos...
 


Ao final, Roy atinge o seu objetivo... ou não?


A Grande Mentira vale a ida ao cinema se você acha que vale ver o desenrolar de uma trama baseada apenas em boas interpretações, uma história bem amarrada e uma boa condução narrativa, no melhor estilo inglês, com um humor sutil, momentos de ação inesperados e doses dramáticas na medida que a história pede, de forma equilibrada, coisa rara nestes tempos de Tiro, Porrada & Bomba...
 


Betty: "- Você me ama?" 

Roy: "- Eu tenho uma grande afeição por você..."

 

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Ele nunca desiste!!! - Crítica - Filmes: Pantera Negra (2018)


Chegou a hora de mostrar o seu valor!

por Alexandre César

(Originalmente postado em 18 /02/ 2018)


O primeiro super-herói negro brilha em filme-solo 
 

 Quando surgiu na edição de n°52 da revista do Quarteto Fantástico, em julho de 1966, o Pantera Negra – mais um personagem dos criadores do Universo Marvel Stan Lee & Jack Kirby - já refletia sua época, quando a luta pelos direitos civis explodia nos EUA e tinha eco na cultura pop, como nos filmes blaxsploitation na década seguinte. Ele inovava por ser o primeiro super-herói negro em uma das grandes editoras norte-americanas e por criticar o colonialismo da civilização ocidental. Ele era o soberano da fictícia nação africana de Wakanda um país independente e rico que é tecnologicamente o mais avançado do mundo. O país, desde sua concepção, era a completa antítese da cruel realidade do continente africano, onde fronteiras artificiais traçadas por interesses comerciais de estrangeiros estimulam disputas tribais e conflitos étnicos, submetendo os seus povos a uma longa tradição de miséria, fome, opressão, pilhagem e morte. Um herói que surgisse desse contexto nos cinemas seria, no mínimo, uma contradição, e no máximo, uma aspiração a todo e qualquer anseio universal de liberdade e autodeterminação dos povos - sejam eles negros, índios ou de qualquer etnia. Um duro desafio para um blockbuster


A estréia do herói africano em grande estilo.


Dirigido por Ryan Coogler (Creed: Nascido para Lutar, de 2015 e Fruivale Station: A Última Parada, de 2013), que assina o roteiro com Joe Robert Cole,  Pantera Negra (2018) se propõe a ser o mais político, sério, épico e inclusivo filme da Marvel Studios, justamente por ousar sair da consagrada fórmula do estúdio, deixando de lado as piadinhas e o humor sarcástico, além de vilões rasos e sem motivações convincentes. O filme se vale do conceito do herói mitológico para contar um épico que mescla drama familiar - com um forte tom de tragédia grega –, elementos de crítica social e reviravoltas. Ele consegue mixar a saga de rebelião do escocês Willian Wallace, narrada no filme  Coração Valente (1995, de Mel Gibson); a ação e a política internacional dos filmes da franquia do James Bond; o lado lendário das aventuras das antigas HQs do Fantasma – eliminando seu caráter colonialista e racista no processo -; e até algumas pitadas das regras contidas no livro  A Arte da Guerra , de Sun Tsu.




T'Challa (Chadwick Boseman) versus  Erik Killmonger (Michael B. Jordan): Dois lados da mesma moeda


Após os eventos de  Capitão América: Guerra Civil  (2016, de Joe e Anthony Russo), o príncipe T'Challa (Chadwick Boseman) retorna a Wakanda para assumir o posto de soberano da nação, substituindo seu pai T'Chaka (John Kani) - evento para o qual tinha sido preparado por toda a sua vida. A frase “Eu não hesito!” é mais do que apropriada para o Pantera Negra e, como é de esperar, funciona como uma faca de dois gumes. As obsessões do regente e de sua corte, além de desafios e traições desencadeadas pelo mercenário e traficante Ulysses Klaw (Andy Serkis, finalmente ganhando destaque sem estar oculto por maquiagem e efeitos especiais) e por seu misterioso parceiro Erik Killmonger (Michael B. Jordan, que protagonizou os dois filmes anteriores de Coogler), desencadeiam a trama. Kilmonger, aliás, é uma imagem espelhada do herói. Inteligente e violento, com motivações pertinentes para seus atos que fazem o público e T’Challa se questionar, Killmonger desenvolve com T’Challa um emaranhado de forças antagônicas e traz consigo uma pergunta chave: os segredos de Wakanda devem permanecer ocultos ou está chegando a hora do resto do mundo conhecer e partilhar de sua tecnologia de ponta e do vibranium, o raro e frutífero metal alienígena que só existe no país? A dualidade herói-vilão aqui está com seus limites borrados. A química entre os dois opositores dá gosto de ver.




Okoye (Danai Gurira) a frente da Dora Milaje: 
empoderamento feminino



Além de bons protagonistas e da trama envolvente e atual, temos no filme um riquíssimo núcleo na corte de Wakanda em que todos personagens tem uma razão de ser. Ramonda (Angela Bassett), a Rainha-Mãe da nação; Shuri (Letitia Wright), irmã mais nova do Pantera Negra e sua “Q”, inventando seus gadgets assombrosos e sendo o alívio cômico; Nakia (Lupita Nyong´o), a espiã; e Okoye (Danai Gurira), a imbatível líder das guerreiras da Dora Milaje, a guarda de elite de Wakanda. Elas mostram um grande empoderamento feminino, sem frescuras. Entre os coadjuvantes masculinos, temos os guerreiros M´Baku (Winston Duke) e W´Kabi (Daniel Kaluuya), sem esquecer do agente da C.I.A. Everett K. Ross (Martim Freeman), um dos poucos brancos do elenco.


Arte conceitual de Wakanda


Os valores de produção do filme são um caso à parte. Vemos claramente onde foi gasto cada centavo dos 200 milhões de dólares de seu orçamento. É mágico (no bom sentido) ver as similaridades, mesmo que involuntárias, do lado místico de Wakanda com o Ciclo da Vida de  O Rei Leão  (1994, de Rob Minkoff e Roger Allers) sem derrapar no pieguismo. Da mesma forma o colorido dos povos de Wakanda, refletido nos figurinos de Ruth E. Carter, também são destaque: tão África e, ao mesmo tempo, tão Jack Kirby. A música de Ludwig Göransson, com consultoria musical de Kendrick Lamar, faz uma boa ligação entre o rap urbano e os ritmos tribais africanos. A arquitetura e o urbanismo da capital de Wakanda também emulam a arte de Kirby, o criador visual do personagem nos quadrinhos, com uma estética que funde tradições africanas e modernidade – o estilo chamado de Afrofuturismo



Negócio de Família Real e disfuncional...

 
Ao término da exibição constatamos que a saída da “zona de conforto” da Marvel Studios resulta num filme enxuto, apesar de sua longa duração. Uma grata surpresa ao revelar ao mundo um herói desconhecido do grande público, com fôlego para ocupar com garra o seu lugar no imaginário popular. E que pensem melhor aqueles que acreditam que o Pantera Negra é um fenômeno passageiro e isolado, que em breve voltará a obscuridade. Até porque ele não está sozinho. Ficando apenas na seara dos super-heróis, na própria Marvel temos o seriado do Luke Cage, o Herói do Harlem, e da DC Comics, a série do Raio Negro, o protetor de Freeland. A boa receptividade de ambas demonstra que agora eles estão aí, pro que der e vier.




Os "manos" Luke Cage (Mike Colter) e Raio Negro (Cress Williams): Pantera Negra
 não está sózinho